A matéria era muito confusa no Código Civil de 1916, que tratava na mesma parte de associações e sociedades civis, e a doutrina refletia essa confusão. Alguns diziam que a sociedade era caracterizada pela finalidade de distribuição de lucros, enquanto que na associação eventuais receitas somente poderiam ser usadas nas suas próprias atividades, jamais convertendo-se em lucros a serem distribuídos aos associados. Outros diziam que associações e sociedades civis eram a mesma figura, posto que a lei não trazia diferenciação entre elas.
Talvez por isso que, na prática, verificava-se todo tipo de situação, tais como sociedades civis sem fins lucrativos, entidades com finalidades iguais ora identificadas como associações, ora como sociedades civis, e assim por diante. Já a lei tributária, ao invés de utilizar o conceito de associação em contraposição ao de sociedade, costumava esquivar-se da confusão apontando diretamente requisitos que deveriam ser cumpridos para que determinadas entidades estivessem livres de tributação, por exemplo a ausência de finalidade lucrativa.
Comparando com a situação anterior, o novo Código Civil representa um grande avanço no esclarecimento da matéria. A classificação das pessoas jurídicas de direito privado é bem mais eficiente, identificando-se de forma precisa as associações, fundações e sociedades. Na parte que nos interessa, a distinção entre sociedades e associações é muito mais clara, já que (i) sociedades sempre têm por objetivo o exercício de atividade econômica para partilha de resultados entre os sócios – art. 981 e (ii) associações são uniões de pessoas para fins não econômicos – art. 53.
A única dúvida que se coloca, portanto, refere-se ao significado da expressão "fins econômicos", mais precisamente se ela se confunde com "fins lucrativos". A resposta parece ser sim. Na sistemática do novo Código Civil, associações seriam organizadas por pessoas interessadas em perseguir finalidades que não tivessem por objetivo a partilha futura de lucros.
A questão parece ser simples, mas a aparência de simplicidade se desfaz quando se percebe que muitas associações poderiam realizar atividades econômicas e ainda assim não ter fins econômicos. Nesta hipótese estão incluídas, por exemplo, as entidades de ensino sem fins lucrativos. O fato dos resultados da atividade não serem distribuídos não significa que as entidades não podem cobrar mensalidades de seus alunos para custear salários de professores, manutenção de salas de aula e todas outras despesas inerentes à atividade.
A distinção entre atividade e finalidade é então fundamental. Em nenhum momento o novo Código Civil indica que a associação não pode ter "atividade" econômica. Menciona-se apenas "fins" econômicos. Por isso faz sentido o critério de que, mesmo havendo atividade econômica, a associação não perderá sua natureza se não tiver por objeto a partilha dos resultados.
É verdade que seria mais fácil se a lei utilizasse diretamente a expressão "sem fins lucrativos". Foi até apresentado projeto de lei que propôs tal alteração, mas de qualquer maneira não cabe outra interpretação. Caso contrário chegar-se-ia à absurda conclusão de que é impossível um grupo de pessoas se reunir para alcançar um fim comum, sem intuito de distribuir resultados, quando parte da atividade desenvolvida gerasse renda. Não se pode admitir que essas pessoas seriam obrigadas a constituir sociedade e distribuir lucro quando a intenção delas não era auferir lucro.
É importante que os Registros Civis das Pessoas Jurídicas, responsáveis pelo registro das associações, apliquem de forma coerente os princípios acima descritos. Tivemos notícia de algumas situações onde foram recusados registros sob a alegação de que, havendo atividade econômica, a entidade não poderia utilizar a forma de associação, sendo portanto obrigada a constituir-se como sociedade ou converter-se para adotar tal natureza. Como visto, o critério não pode ser o tipo de atividade desenvolvida, mas sim a finalidade ou não de distribuição dos resultados obtidos com a atividade.
Por fim, vale lembrar que o novo Código Civil não interfere nos critérios utilizados na definição de entidades imunes do ponto de vista tributário. Assim, as associações organizadas na área de educação ou de assistência social serão consideradas imunes quando atenderem os requisitos de imunidade previstos na Constituição Federal e legislação complementar, tais como prestação de serviços à população em geral e ausência de finalidade lucrativa.
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TOZZINI, Syllas; BERGER, Renato. A finalidade das associações no novo Código Civil . Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 66, jun. 2003. Disponível em:
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