
Os avanços tecnológicos têm permitido que construções antigas consigam se adaptar a novas necessidades mesmo com restrições construtivas. "Pode-se, por exemplo, instalar piso radiante gelado em edifícios com pé-direito pequeno, como alternativa ao sistema de ar-condicionado pelo forro", diz Roberta. A inserção de brises, alteração nos tipos de vidros e esquadrias, mudanças nos revestimentos externos e internos, instalação de novos sistemas elétricos, hidráulicos e de ar-condicionado, adequação à acessibilidade, todas as melhorias que garantam melhores usos e aproveitamento do potencial construtivo são ações de retrofit.
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| Executado pela Método, o retrofit do Edifício Panorama tem a grife do arquiteto Isay Weinfeld. Em vez de escritórios, o edifício abriga agora luxuosos apartamentos |
Um edifício pode ser readequado para o mesmo uso ou adaptado para usos diferentes. Já o retrofit urbano transforma áreas obsoletas e até com problemas sociais em áreas economicamente e socialmente ativas, onde a degradação e violência dão lugar à renovação urbana e maiores consciência e cuidado com o meio. "Na Europa é muito comum a requalificação urbana onde até bairros inteiros são transformados, em oposição à expansão urbana", explica Roberta. De acordo com a pesquisadora, a expansão urbana é cara pois implica alterar a infra-estrutura básica e de transportes (greenfields), enquanto que o reaproveitamento de áreas degradadas ou subutilizadas (brownfields) tira partido de equipamentos existentes e reconecta o tecido urbano truncado de áreas subutilizadas da cidade.
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| Conhecido mundialmente, o projeto de requalificação de Puerto Madero, em Buenos Aires, transformou antigos galpões em lojas e restaurantes |
Projetar um edifício já pensando em seu possível reúso é um conceito estranho à grande maioria dos arquitetos brasileiros. A idéia implica definir sistemas construtivos que permitam desmontagem, e não demolição. "Na Europa, o termo reciclagem é o último empregado na cadeia da sustentabilidade", esclarece Roberta. "Antes de reciclar existe o conceito de reutilizar", conclui. A reutilização exige a definição de sistemas construtivos mais industrializados e secos como lajes moduladas, divisórias desmontáveis, sistemas elétricos e hidráulicos de fácil acesso e reparo, entre outros. Em muitos países europeus, principalmente na Holanda, as lojas de materiais de construção não comercializam produtos novos, mas usados, tirados de outras edificações.
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| Antes uma igreja agora um edifício de apartamentos, a Scotts Church é um exemplo de construção simbiótica |
Além de requalificar a estrutura e os sistemas dentro de um mesmo espaço, é possível revalorizar a construção inserindo novos espaços, caso dos edifícios chamados simbióticos, ou seja, construídos a partir do aproveitamento da estrutura de outros mais antigos, de maneira a complementar usos e agregar novos valores. De acordo com a arquiteta doutora e também pesquisadora do Labaut, Denise Helena Silva Duarte, essas construções eram chamadas de parasitas, "Parasite Buildings", mas como o nome remete a algo negativo e restritivo, os especialistas têm preferido chamar esses "anexos" como edifícios simbióticos, conceito que remete a uma interdependência positiva a ambos. "Já foram feitos todos os tipos de estruturas simbióticas, desde uma caixa pendurada do lado de fora de um prédio até a construção de andares inteiros novos sobre a cobertura de um edifício antigo", conta Denise. A construção nas coberturas garante um piso elevado que pode abrigar diferentes funções necessárias à cidade, que não têm espaços disponíveis no solo, além de constituir um espaço valorizado nas cidades adensadas. "Essas construções podem ainda testar novos conceitos, sempre respeitando o edifício existente e o entorno", explica Denise. No entanto, os edifícios simbióticos devem primordialmente possuir estruturas leves e de construção rápida, tendo em vista o sobrepeso estrutural do novo conjunto, além de preverem rotas de fugas facilitadas e atenderem a todas as normas de desempenho. "Adicionar uma nova 'camada' de uso pode trazer vida à construção e fazer a cidade contemporânea respirar, não só para habitação, como para outras funções", conclui.
Seja qual for a estratégia de projeto para reabilitação de edifícios ela deve considerar as exigências dos usuários quanto ao clima e o desempenho do edifício ao longo do ano, deve analisar novas demandas e possíveis conflitos (acústica x ventilação, proteção solar x iluminação natural) e diagnosticar condições atuais (visitas em diferentes horários, desenhos de observação, medições, simulações), de maneira a subsidiar a analise de alternativas e a escolha da melhor solução.

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| Incluir forros, pisos elevados de serviços e atualizar as instalações são desafios para os arquitetos e limitações para os edifícios |
O retrofit pode dotar o edifício de atualidade tecnológica que se traduza em conforto, segurança, custos mais baixos de operação e funcionalidade para o usuário tendo em vistas a viabilidade econômica para o investidor. De acordo com a arquiteta Marília Sayuri Chino, que desenvolveu uma tese de graduação sobre retrofit, a possibilidade de obtenção de valores aceitáveis para o investimento requer um estudo de viabilidade econômica que não se encontra na mera análise por parâmetros convencionais. Uma simples análise de custos poderá negligenciar tanto valores mensuráveis, como a valorização do imóvel e melhoria da eficiência energética, quanto intangíveis, como a preservação da memória, melhoria dos padrões de segurança e conforto. Diferentemente, mensurar o retorno de investimentos em eficiência energética é mais fácil. Já existem hoje, mesmo no Brasil, as chamadas Energy Savings Companies, empresas responsáveis pelo processo de retrofit que visam à eficiência energética. Elas atuam com um contrato de performance em que são responsáveis pelos investimentos iniciais, mas passarão a receber uma porcentagem da economia gerada pelas intervenções por um determinado período de tempo. Após esse período a economia se reverte exclusivamente para o proprietário. Além de realizarem diagnósticos energéticos em um edifício, também negociam junto às concessionárias de energia as tarifas mais adequadas para a edificação, além de acompanharem a instalação do novo sistema.
Projeto premiado mostra viabilidade de retrofit de um edifício comercial

A arquiteta mestranda Viviane Caroline Abe desenvolveu em seu trabalho de dissertação o retrofit hipotético de um prédio de escritórios de 1971, no Centro de São Paulo. O trabalho ganhou menção honrosa no prêmio Paviflex e foi orientado pela professora doutora Denise Helena Silva Duarte, do Labaut. O edifício objeto da intervenção apresentava problemas de conforto, má eficiência energética e risco de incêndio por falta de rota de fuga. Além disso, a análise das fachadas mostrou um alto índice de absorção de calor. A caixilharia está desgastada e apresenta baixo desempenho quanto à vedação, aumentando a demanda de ar-condicionado. As instalações elétricas e eletromecânicas (elevadores), hidrossanitárias e de telefonia encontram-se defasadas em relação às tecnologias atuais. Não há sistema de condicionamento de ar central, sendo que os aparelhos de ar-condicionado individuais são instalados nas janelas. Também não há sistemas de cabeamento e automação predial. A avaliação técnico-funcional estudou os espaços propostos pelo projeto de arquitetura e mostrou que o pé-direito útil nos escritórios, de apenas 2,50 m, dificulta a implantação de um sistema de condicionamento de ar central, com difusores no teto. Além disso, o edifício não é adequado ao uso para deficientes físicos, inclusive os sanitários.

Solução
Um estudo apurado serviu de base para simulações computacionais de conforto térmico, luminoso e acústico, por meio de softwares específicos, além do levantamento do consumo energético de todos os equipamentos comuns. Também foram realizados estudos do clima e insolação em cada fachada. O resultado de todas as análises levou a arquiteta Viviane a propor a inserção de brises, lightshelves e chapas metálicas para impedir a radiação solar direta na superfície opaca da fachada. A estrutura compõe-se de perfis metálicos verticais e horizontais, além dos contraventamentos.
A carga térmica produzida pelos equipamentos também foi reduzida devido à alteração do sistema de iluminação artificial. A troca da caixilharia foi recomendada, junto com a escolha de outros vidros com melhor desempenho acústico, mantendo-se o mesmo modelo de dois panos projetantes. O vidro laminado proposto possui uma camada de vidro de 1/8", uma película de PVB de 0,030" e outra camada de vidro de 1/8". O nível de ruído resultante é de 40 dB(A), dentro dos limites estabelecidos pela Norma Brasileira (NBR 10152). Para otimizar a perda de calor do interior dos ambientes, Viviane recomendou a abertura dos panos superiores das janelas no período noturno.
O layout interno do escritório também sofreu alterações devido à necessidade de uma área para a casa de máquinas, que deveria estar localizada em um ponto central do escritório. Como o pé-direito reduzido impedia a instalação de difusores de ar sob o forro foi escolhido o sistema de insuflamento por meio de um piso elevado monolítico, com altura de 15,5 cm (acabado), que tira partido de uma menor vazão de insuflamento e da redução da dimensão dos equipamentos e casa de máquinas. O sistema também favorece o uso de ciclo economizador, resultando em menor consumo de energia.
Retrofit de fachadas

Além da valorização do imóvel, o retrofit das fachadas diminui gastos com a manutenção, aumenta a durabilidade da envoltória e os cuidados que cada condômino dispensa ao edifício. De acordo com o engenheiro Paulo Maccaferri, da Adapt Tecnologia e Engenharia, empresa responsável por projetos de requalificação de fachadas, a modernização das fachadas representa um ganho de 10% a 15% no valor total do imóvel. "É um ganho tecnológico e financeiro ao mesmo tempo", explica. Um dos projetos desenvolvidos pela Adapt é de um condomínio residencial que apresenta problemas como o desplacamento das pastilhas brancas que revestem as fachadas, caixilhos com vedação deficiente e contramarcos oxidados, de modo que a umidade externa entre facilmente dentro dos apartamentos. Além disso, apresentava problemas graves de oxidação nas armaduras dos pilares e vigas de concreto, ausência de juntas de dilatação e movimentação e argamassa de emboço esfarelada. Junta-se a isso a deterioração da tubulação externa de esgoto e gás. O projeto de melhoria propôs soluções para cada um dos problemas com o desenvolvimento de um projeto executivo de revestimento de fachada que define um posicionamento mais adequado das juntas. O serviço começa pela remoção completa do revestimento cerâmico, da argamassa de base e dos caixilhos, substituídos por novos caixilhos de alumínio com pintura eletrostática branca e pingadeiras. Tubulações de esgoto e gás novas passam a ser embutidas na argamassa.
Uma das grandes Energy Save Companies que trabalham principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro é a Ecoluz. A empresa desenvolveu diversos projetos de economia de energia como o da Sala São Paulo, o do Centro Cultural de São Paulo e o do aeroporto de Cumbica, ambos em São Paulo, e o Jockey Clube do Brasil, no Rio de Janeiro, entre outros.
Além de edifícios, equipamentos urbanos como o metrô também sofreram intervenção em seus pontos de iluminação. É o caso do metrô Praça da Árvore, em São Paulo. Depois de uma análise do gasto energético com as luminárias instaladas nas plataformas os especialistas propuseram a troca dos equipamentos por refletores especulares aluminizados brilhantes, com espessura de 0,4 mm, com soquetes em inox e acessórios de fixação, e, mais significativo, propuseram a redução de duas lâmpadas fluorescentes para uma de 110 W tipo HO. Além disso, os reatores duplos fluorescentes de 2 W x 110 W foram substituídos por reatores simples fluorescentes de 1 W x 110 W. Foram instaladas lâmpadas fluorescentes HO/110 W tipo "trifósforo" IRC = 85 , temperatura de cor 4.000 K. De acordo com a empresa, a implementação das ações de eficiência energética nas luminárias da Estação Praça da Árvore reduziu em cerca de 50% o consumo da energia elétrica destinada à iluminação das plataformas.
Além disso, as medições luximétricas realizadas em campo verificaram um aumento no nível de iluminamento da estação. As tabelas a seguir mostram condições pré e pós-implementação do novo sistema de iluminação:
Edifício Panorama: Retrofit com grife

Na região da Vila Nova Conceição, zona nobre de São Paulo, um edifício comercial foi transformado em residencial pelas mãos do arquiteto Isay Weinfeld.
Fonte: Simone Sayegh




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