terça-feira, 3 de maio de 2011

LEI PROTEGE COMPRADOR DA "QUEBRA" DA CONSTRUTORA

Leonardo Soares/ AE Compradores acompanham as finanças da obra em assembléias

SÃO PAULO
- O advogado e contador André Chaim, de 30 anos, foi surpreendido no início da semana passada, quando foi convocado para uma reunião com outros compradores de um empreendimento na zona sul da capital. No encontro, ele foi informado de que o seu imóvel, adquirido em outubro do ano passado, tem patrimônio de afetação,um mecanismo criado pela Lei 10.931 de 2004, e ainda pouco usado no mercado imobiliário. Por conta dessa norma, uma comissão de moradores vai agora poder acompanhar as contas da obra e seu andamento.

O objetivo da lei é ajudar o consumidor a evitar - ou ao menos ter ciência antecipadamente de - irregularidades administrativas ou financeiras que possam trazer prejuízos aos compradores de um imóvel na planta, incluindo o temido atraso na entrega.

E mais: no caso de falência da empresa, permite a contratação de outra construtora para terminar a obra sem a necessidade de um longo processo judicial. Isso acontece por meio da criação de um patrimônio próprio para cada empreendimento, o que garante que os recursos aportados para uma obra não sejam desviados para outra, tampouco se misturem ao capital da empresa.

"É uma forma de prevenir que eventuais problemas causem transtornos ainda maiores para os compradores", diz o advogado José Vicente Amaral Filho, especializado no mercado imobiliário. Quem audita essa conta é justamente a comissão de futuros moradores eleita em assembleia convocada pela construtora. Os membros desse grupo passam a receber trimestralmente um balanço financeiro do projeto, além de informações sobre cronograma e fluxo de caixa. Caso encontrem alguma irregularidade, podem cobrar providências da construtora imediatamente.

Chaim não hesitou em fazer parte da comissão em conjunto com outros três de seus futuros vizinhos. "Acredito que é um grande benefício, porque dá respaldo à empresa e ao consumidor", diz. Legislação. A adoção do patrimônio de afetação em um empreendimento, no entanto, é opcional.

Como benefício, as empresas optantes passam a participar do Regime Especial de Tributação (RET), no qual pagam um valor pré-fixado de 6% de impostos federais, em vez dos 6,73% de praxe. Apesar de a medida também favorecer a imagem de construtoras e incorporadoras, ainda são poucas as que aplicam a legislação.

Esse quadro está mudando aos poucos, principalmente Por causa do programa Minha Casa, Minha Vida, que exige a adoção da lei, e por solicitação de alguns bancos. Assim, criam estrutura para essa finalidade e se familiarizam cada vez mais com a lei.

As construtoras Tecnisa e Even são duas das que já trabalham dessa forma, mas segundo o diretor da imobiliária Itaplan, Fábio Rossi, a maioria dos lançamentos recentes na cidade conta com patrimônio de afetação. A Even passou a instituir essa lei em seus empreendimentos em 2007 e garante que desde o 2º semestre de 2010 adota a medida em todos os seus lançamentos, incluindo o prédio onde Chaim vai morar.

Para saber se um imóvel tem patrimônio de afetação antes de fechar negócio, é preciso consultar a matrícula do empreendimento, que pode ser obtida no cartório de imóveis.

Apesar das vantagens, os compradores de empreendimentos com patrimônio de afetação precisam tomar alguns cuidados. O primeiro deles é eleger para a comissão pessoas com capacidade técnica para avaliar os balanços e identificar irregularidades, como advogados, contadores e engenheiros.

Outro ponto é saber que a lei não evita possíveis dores de cabeça. Um exemplo é que no caso de falência da construtora, a comissão assume não só a obra, mas também as dívidas com fornecedores e os custos de unidades não vendidas. "A comissão pode escolher entre vender todos os ativos e liquidar os passivos ou tocar a obra", explica o advogado Oliver Lorena Vital e Júnior. E se faltar dinheiro para a obra, a diferença terá de ser rateada entre todos os compradores.

Caso Encol é marco negativo na história do setor imobiliário

Fundada em 1961, a Encol chegou a ser uma das maiores construtoras brasileiras, mas veio à falência em 1999, após a constatação de diversas irregularidades administrativas e financeiras. Na época, a construtora deixou mais de 700 edifícios inacabados, o que foi considerada a maior tragédia da história do setor imobiliário brasileiro.

Após a falência da empresa, os proprietários lesados se organizaram em comissões, que entraram na Justiça para requerer o direito à obra e, assim, firmar acordos com construtoras para concluir os empreendimentos.

A quebra da Encol estimulou a criação de mecanismos de defesa do consumidor mais rígidos e acelerou a criação da Lei de Patrimônio de Afetação.

Fonte: Ligia Aguilhar, especial para O Estado de S. Paulo

Nenhum comentário:

Postar um comentário