SÃO PAULO (Reuters) - Após forte crescimento nos últimos anos, o setor imobiliário começa a dar indicações mais fortes de desaquecimento, pressionado, sobretudo, por preços altos, desaceleração da demanda e ritmo menor de lançamentos.
O sinal amarelo acendeu já no primeiro trimestre deste ano, quando construtoras e incorporadoras apresentaram dados de vendas e lançamentos bem abaixo dos vistos em 2010.
Mais recentemente, o Secovi-SP, sindicato que representa o setor em São Paulo, divulgou uma queda de 61,8 por cento nas vendas de imóveis residenciais novos na capital paulista em março contra um ano antes e recuo de 16,2 por cento sobre fevereiro.
"Redução do crédito, aumento das taxas de juros e migração de investimentos em poupança para outros com retorno maior têm contribuído para um arrefecimento da demanda", afirma o economista e professor de Finanças da BBS Business School, Ricardo Torres.
Mais otimista, o economista-chefe do Secovi-SP, Celso Petrucci, disse à Reuters na ocasião da divulgação dos dados de março que a queda foi pressionada por questões sazonais. "O primeiro trimestre sazonalmente é o que vende menos e esse ano foi agravado pelo Carnaval no início de março. A comparação anual também é muito dura. No primeiro trimestre de 2010 o país vivia uma euforia total."
Somado a isso, a segunda fase do "Minha Casa, Minha Vida", que ainda não saiu do papel, vem pesando sobre a demanda, principalmente a da população de baixa renda. De fato, há um ano, o programa habitacional do governo era citado pelo mercado como o principal motor de crescimento do setor.
"Isso (paralisação do programa) causa represamento. Quem depende do subsídio para comprar um imóvel vai aguardar", assinala o analista Wesley Bernabé, do BB Investimentos.
"As empresas colocaram o pé no freio em lançamentos em meio à discussão de aumento de preços (dentro do programa) e o setor já vem sofrendo pressão de custos. Hoje uma parcela representativa do mercado ficou em 'standby'", diz o analista Marcos Pereira, da Votorantim Corretora.
Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o nível de atividade da indústria da construção civil caiu para 48,3 pontos em abril, contra 49,5 no mês anterior. Valores acima de 50 indicam crescimento da atividade e expectativa positiva.
"O ritmo de crescimento das empresas (do setor imobiliário) deve ter uma nova realidade, mais alinhado com o Produto Interno Bruto", afirma Pereira.
PREÇOS E ESTOQUES PREOCUPAM
Tema recorrente em discussões sobre os rumos do setor, a forte valorização imobiliária vista nos últimos anos é outro fator que divide opiniões entre agentes de mercado.
Enquanto alguns defendem que houve uma correção natural de preços após anos de estagnação, outros apontam que a queda de preços é necessária para sobrevivência das construtoras.
"As incorporadoras não têm mais como comprar terrenos em grandes cidades e ainda têm estoque gigantesco para vender. Têm que oferecer descontos para atrair investidores", afirma Torres, da BBS.
O analista Pereira, da Votorantim, concorda que as distorções de preços exigirão certa correção para que os estoques de imóveis sejam desovados. "Há um estoque crescente, que tende a aumentar. Pode haver pressão de estoque até o final do ano, resultado do crescimento dos últimos anos."
Por outro lado, Bernabé, do BB Investimentos, não vê os estoques influenciando a curva de preços para baixo.
"Se os preços caírem muito, há desestimulo muito grande", afirma. "Se o estoque de unidades prontas atingir um nível maior que o atual, as empresas vão começar a revisar as metas de lançamentos. Não vejo relação com preços."
No mesmo sentido, Petrucci, do Secovi, é taxativo: "Preço de imóvel não cai, principalmente preço de imóvel novo".
NEM IMÓVEIS, NEM AÇÕES
A desaceleração do setor vem refletindo também nas ações de construtoras na bolsa.
"Não é hora de comprar imóvel nem ação das empresas. O momento é muito delicado", diz o economista e professor da BBS. "Os preços, tanto de imóveis quanto de ações, perderam o contato com a realidade. Não é um bom investimento hoje."
O analista da Votorantim cita a deterioração geral da bolsa como um aspecto bastante negativo para as empresas do setor imobiliário, muito dependente de capital estrangeiro.
O Imob, índice que mede o desempenho de 18 ações do setor imobiliário na Bovespa, acumula queda de 7,6 por cento no ano até 27 de maio, um pouco pior que o do Ibovespa --que reúne as ações mais líquidas da bolsa paulista e registra queda de 7,2 por cento no mesmo intervalo.
"Enquanto a bolsa continuar enfraquecida, o setor imobiliário não deve ser uma aposta", avalia Pereira.
Ele cita ainda a forte pressão de custos sofrida pelas grandes empresas do setor no quarto trimestre de 2010 como responsável por passar uma mensagem negativa aos investidores.
"Não acho que no curto prazo essa percepção negativa vá mudar, talvez no segundo semestre", diz.
Fonte: © Thomson Reuters 2011 All rights reserved.
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