sábado, 6 de outubro de 2012

O PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO NAS INCORPORAÇÕES IMOBILIÁRIAS

São inegáveis os avanços trazidos pela Lei nº 10.931/04 para o setor imobiliário. Uma dessas inovações é o chamado "patrimônio de afetação", incorporado à Lei de Incorporações Imobiliárias (nº 4.591/64).

Apesar da referida Lei, que data de 1964, ter estabelecido duas regras de proteção aos adquirentes de imóveis na planta ou em fase de construção (uma no caso de paralisação da obra por mais de 30 dias sem justa causa devidamente comprovada, e outra no caso de falência do incorporador, devido à situação financeira incerta de algumas construtoras e incorporadoras), o legislador sentiu a necessidade de criar novos dispositivos para proteger os direitos dos adquirentes nos casos de desequilíbrio econômico e financeiro do incorporador, ou mais além, no caso de eventual insolvência deste, hipótese em que o imóvel, destinado ao empreendimento, seria utilizado para o pagamento de credores diversos. 

Neste contexto, surgiu a Lei 10.931/04, que introduziu na Lei de Incorporações Imobiliárias o regime do patrimônio de afetação, por meio do qual o terreno e as acessões objetos da incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, são isolados do patrimônio do incorporador, passando tão somente à exclusiva disposição do empreendimento a ser erigido.

Em seu artigo denominado "Incorporador: rei morto. Rei posto!", publicado em 1998, o advogado Marcelo Terra já tecia comentários sobre a teoria do patrimônio separado que, em outras palavras, deveria ser analisado juridicamente dentro de seu singular universo, não havendo vasos comunicantes com outras obras, assemelhando-se cada uma dessas obras, para tal efeito, a uma Sociedade de Propósito Específico - SPE. 

Apesar de facultativo ao incorporador, o patrimônio de afetação, uma vez adotado, acaba por vincular os bens afetados a determinados fins, seja para investimento ou administração da própria incorporação, representando, desta forma, uma garantia aos credores de que a incorporação contratada se efetivará, e de que as unidades autônomas serão entregues aos seus respectivos adquirentes.

O advento da Lei 10.931/04 trouxe, também, disposições que repercutiram no âmbito dos investimentos imobiliários e no mercado da construção civil, uma vez que o principal escopo da aludida lei foi incentivar a construção civil, trazendo desenvolvimento e progresso, sem perder de vista, contudo, os consumidores que buscavam maior segurança e tranqüilidade na aquisição de imóveis ainda em fase de construção, o que acabou favorecendo também o financiador e os financiamentos imobiliários para o setor da construção civil.

Outro efeito relevante, decorrente do tema em questão, é o trazido pelas disposições do artigo 1º da Lei 10.931/2004, através do qual o incorporador pode optar pelo Regime Especial de Tributação - RET aplicável somente às incorporações imobiliárias submetidas ao Patrimônio de Afetação.

Se o incorporador optar pelo RET, o terreno, as acessões e os demais bens e direitos vinculados à incorporação não respondem por dívidas tributárias do incorporador relativas ao Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas - IRPJ, ao PIS/PASEP, à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL e à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social -COFINS.

Cumpre salientar, porém, que os referidos bens respondem pelas dívidas tributárias calculadas sobre as receitas auferidas no âmbito da respectiva incorporação, e que o patrimônio da incorporadora responde pelas dívidas tributárias da incorporação afetada.

A importância desta lei no aspecto falimentar, por sua vez, pode ser verificada pelo fato dos efeitos da decretação da falência, ou da insolvência civil do incorporador, não atingirem os patrimônios de afetação constituídos, sendo que o terreno, as acessões e demais bens, direitos creditórios, obrigações e encargos objeto da incorporação não integrarão a massa concursal, só respondendo por dívidas e obrigações vinculadas à respectiva incorporação, a qual poderá passar para a administração de outro incorporador, que dê prosseguimento à obra.

Pode-se dizer, então, que, pela teoria da afetação, os credores vinculados ao Patrimônio de Afetação têm preferência sobre os bens que a ele integram, excluídos outros bens do patrimônio do devedor, de tal forma que sobre os bens remanescentes, não segregados, este grupo poderá satisfazer-se somente subsidiariamente.

Enfatiza-se, assim, que a Lei do Patrimônio de Afetação nas incorporações imobiliárias trouxe uma solução ágil e célere que conseguiu coadunar e atender os interesses das empresas incorporadoras, fontes contínuas de geração de emprego e circulação de renda, dos agentes financeiros, que detém os recursos capazes de movimentar a engrenagem da atividade imobiliária, e, enfim, dos consumidores que, sentindo-se mais seguros para a aquisição de unidades autônomas em construção, acabam contribuindo de maneira ímpar para o funcionamento de todo este mecanismo. 

Autora: Lígia Caram Petrechen - Advogada da área imobiliária do Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra Advogados

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