Sumário: 1 Introdução. 2 Garagens pertencentes aos proprietários de
unidades autônomas. 3 Garagens pertencentes ao condomínio. 4 Garagens
pertencentes a terceiros não condôminos.
1 Introdução
Inúmeras questões têm surgido, na prática, concernentes aos lançamentos
de IPTU em relação às garagens situadas nos subsolos de edifícios de
alto luxo.
Sabemos que essas garagens ou vagas de estacionamento, como são
conhecidas, usualmente apresentam características rústicas com dutos
aparentes e instalações hidráulicas e elétricas à mostra, paredes sem
acabamento etc. contrastando com as características das unidades
autônomas do condomínio residencial ou comercial.
Para fins didáticos, analisaremos o lançamento correto do IPTU tendo em
vista três situações diversas: (a) garagens pertencentes aos
proprietários de unidades autônomas; (b) garagens pertencentes ao
condomínio; (c) garagens pertencentes a terceiros, não condôminos.
2 Garagens pertencentes aos proprietários de unidades autônomas
Nos termos do art. 11 da Lei n° 4.591, de 16-12-1964, que dispõe sobre o
condomínio em edificações, cada unidade será tratada como prédio
isolado:
“Para os efeitos tributários, cada unidade autônoma será tratada como prédio isolado, contribuindo o respectivo condômino, diretamente, com as importâncias relativas aos impostos e taxas federais, estaduais e municipais, na forma dos respectivos lançamentos.”
Para o lançamento do IPTU aplica-se a alíquota residencial ou comercial sobre a base de cálculo que é o valor venal.
No Município de São Paulo o valor venal de cada unidade autônoma é
calculado em função do enquadramento do imóvel (edifício) em um dos
tipos e padrões de construção previstos na Tabela V, referida no art.
15, da Lei n° 10.235, de 16-12-1986, que dispõe sobre apuração do valor
venal de imóveis.
Prédios de apartamentos de natureza residencial enquadram-se no tipo 2 da referida Tabela V. Prédios de natureza comercial verticalizados (imóveis comerciais, de serviços ou mistos) classificam-se no tipo 4. Cada um desses tipos contempla vários subtipos denominados “padrão” de conformidade com as características da construção.
Prédios de apartamentos de natureza residencial enquadram-se no tipo 2 da referida Tabela V. Prédios de natureza comercial verticalizados (imóveis comerciais, de serviços ou mistos) classificam-se no tipo 4. Cada um desses tipos contempla vários subtipos denominados “padrão” de conformidade com as características da construção.
Quanto ao padrão de construção, no tipo 2 (apartamentos residenciais),
se a unidade autônoma for superior a 350 m², apresentando uma
arquitetura requintada, será a unidade autônoma classificada no padrão
“E”. No tipo 4 (unidades comerciais, de serviços e mistos) se o prédio
for isolado com projeto arquitetônico arrojado e/ou suntuoso, com pé
direito acima de 5m no térreo, será classificado no padrão “E”.
Interessante notar que em prédio comercial (tipo 4) não se leva em
conta a área de cada unidade para efeito de classificação no padrão de
construção, como acontece em relação a prédio residencial (tipo 2).
Feita essa classificação no tipo de construção e no padrão de
construção bastará aplicar o respectivo valor unitário do m² à área da
unidade tributanda, abrangendo a área da garagem que é considerada como
acessório, para se ter o valor venal do imóvel, base de cálculo do IPTU
(art. 33 do CTN).
De fato, prescreve o art. 15 e §§ 1°, 2° e 3°, da Lei n° 10.235/86:
“Art. 15. O valor unitário de metro quadrado de construção será obtido pelo enquadramento da construção num dos dois tipos da Tabela V, em função da sua área predominante, e no padrão de construção cujas características mais se assemelhem às suas.
§ 1º Nos casos em que a área predominante não corresponder à destinação principal da edificação, ou conjunto de edificações, poderá ser adotado critério diverso, a juízo da Administração.
§ 2º Para fins de enquadramento de unidades autônomas de prédio em condomínio em um dos padrões de construção previstos na Tabela V, será considerada a área construída correspondente à área bruta da unidade autônoma acrescida da respectiva área da garagem, ainda que esta seja objeto de lançamento separado.
§ 3º A unidade autônoma poderá ser enquadrada em padrão diverso daquele atribuído ao conjunto a que pertença, desde que apresente benfeitorias que a distingam, de forma significativa, das demais unidades autônomas.”
Na interpretação do parágrafo 1° deve-se ater ao que dispõe a ordem
jurídica global, que não admite tamanha discricionariedade da
administração na prática do ato de lançamento tributário, que é um
procedimento administrativo vinculado. Logo, onde no texto legal figura
como uma faculdade da administração deve ser interpretado no sentido da
obrigatoriedade da administração. O mesmo comentário é pertinente em
relação ao parágrafo 3°. Constatada a diversidade de padrão de
construção não há como deixar de fazer a distinção devida.
Na hipótese de a garagem estar vinculada à unidade autônoma pertencente
ao condômino aplica-se a regra do parágrafo 2°, que determina que o
acessório segue o principal.
Essas normas evitam dúvidas e incertezas por ocasião da apuração do
valor venal das garagens condominiais, porque dependendo da
especificação condominial do prédio elas podem ter ou não matrículas
imobiliárias independentes.
A regra de que o acessório segue o principal pode não espelhar um
critério de justiça, porque sabemos que nenhuma garagem situada no
subsolo de um prédio contém o mesmo padrão da unidade autônoma a que se
acha vinculada. Mas, é um critério legal que elimina a
discricionaridade do agente fiscal e viabiliza, com segurança, o
lançamento tributário da área representada pela garagem, normalmente,
ínfima em relação à unidade principal.
3 Garagens pertencentes ao condomínio
Grande parte das construções de prédios, atualmente, reservam as vagas
de estacionamento para o condomínio, atribuindo aos proprietários de
unidades autônomas o direito de uso de determinadas quantidades de
vagas. É que as vagas não destinadas ao uso dos condôminos são
exploradas comercialmente pelo condomínio, diretamente ou por meio de
terceirização, hipótese mais frequente.
Nessas hipóteses, as garagens ou vagas de estacionamento são
registradas no registro imobiliário competente como sendo de propriedade
do condomínio.
Na apuração do valor venal dessas garagens utiliza-se o mesmo critério
empregado para apuração do valor venal das garagens pertencentes aos
titulares de unidades autônomas. Aplica-se a regra, segundo a qual, o
acessório segue o principal.
E aqui é oportuno salientar que o condomínio tem personalidade jurídica
própria, respondendo por suas obrigações civis, trabalhistas e
tributárias. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ, como se verifica da
ementa abaixo:
“Ementa. Tributário. Contribuição previdenciária incidente sobre remuneração de síndico. Taxa condominial. LC n° 84/96. Instrução normativa n° 06/96. Condomínio. Pessoa jurídica. Lei n° 9.876/99. Legitimidade da cobrança. Precedente.
...
2. É devida a contribuição social sobre o pagamento do pró-labore aos síndicos de condomínios imobiliários, assim como sobre a isenção da taxa condominial devida a eles, na vigência da Lei Complementar nº 84/96, porquanto a Instrução Normativa do INSS nº 06/96 não ampliou os seus conceitos, caracterizando-se o condomínio como pessoa jurídica, à semelhança das cooperativas, mormente não objetivar o lucro e não realizar exploração de atividade econômica” (REsp 1064455/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Castro Meira, DJe 11-09-2008).
A proclamação da existência de personalidade jurídica do condomínio é
importante para afastar o ADI nº 2, de 27-3-2007, da Secretaria da
Receita Federal que responsabiliza os condôminos por todas as obrigações
tributárias decorrentes de locações de partes comuns de condomínio
edilício. Condomínio e condôminos são pessoas diferentes.
4 Garagens pertencentes a terceiros não condôminos
Já se tornou praxe a construção de prédios contendo garagens, para fins
comerciais, que são alienadas a terceiras pessoas não proprietárias de
unidades autônomas de natureza residencial. Há, também, casos de
garagens comerciais em prédios de natureza comercial alienadas a
terceiros.
No primeiro caso, a alíquota do IPTU a ser aplicada deve corresponder à
de um imóvel não residencial que, atualmente, é de 1,5% contra 1%
previsto para imóvel residencial, visto tratar-se de garagens
independentes.
Em compensação, na apuração do valor venal dessas garagens não se deve
aplicar o § 2°, do art. 15, da Lei n° 10.235/86 que determina a
observância do mesmo tipo de construção e mesmo padrão de construção
pertinente à unidade autônoma.
Quando as garagens autônomas estão desvencilhadas de quaisquer unidades
autônomas do condomínio, apresentando características próprias que as
diferencia das unidades autônomas de natureza residencial, deverá ser
adotado um critério diverso, conforme prescrição do já citado § 1°, do
art. 15, da Lei n° 10.235/86;
“§ 1º Nos casos em que a área predominante não corresponder à destinação principal da edificação, ou conjunto de edificações, poderá ser adotado critério diverso, a juízo da Administração.”
Esse preceito legal deve ser interpretado dentro da ordem jurídica
global que não permite na seara do lançamento tributário tamanha
discrição da Administração. Constatada a diferenciação das
características da construção a utilização de critério diverso é
impositiva não ficando a critério da Administração como se depreende da
leitura literal do texto legal. Não cabe ao agente do fisco aumentar ou
diminuir o valor venal do imóvel a seu critério.
Se as garagens autônomas apresentam características inferiores às das
unidades autônomas impõe-se a adoção de critério distintivo para o
correto enquadramento dessas garagens no tipo de construção e no padrão
de construção previstos na Lei n° 10.235/86.
A Tabela V anexa à Lei 10.235/86 prevê, para esses casos, o tipo 6, padrão A, in verbis:
“Edifícios de garagem-prédio vertical, destinados única e exclusivamente à guarda de veículos – Padrão A.”
Pouco importa que essas garagens estejam localizadas no subsolo de um
condomínio de luxo, pois para fins de tributação cada unidade deve ser
considerada isoladamente ao teor do já citado art. 11, da Lei n°
4.591/64.
Como se verifica, para cada tipo de construção e padrão de construção
deve-se aplicar o valor unitário do m² que resulta da classificação do
imóvel, de conformidade com o previsto na Tabela V anexa à Lei n°
10.235/86.
O fisco municipal de São Paulo vem cometendo ilegalidade e abuso de
poder no lançamento do IPTU em relação a essas garagens de natureza
comercial, existentes nos subsolos de prédios residenciais de alto luxo.
Para fins de exacerbação de alíquota do imposto essas garagens são
consideradas de natureza comercial (1,5%), independentes e autônomas em
relação às unidades condominiais residenciais, porque utilizadas para
locação de vagas. Porém, para o efeito de sua classificação no tipo e no
padrão de construção são consideradas acessórias de unidade condominial
residencial de alto luxo, implicando majoração indevida da base de
cálculo do IPTU.
Ora, de duas uma: ou essas garagens são acessórias e como tais devem
ser tributadas como unidades residenciais, ou, são independentes devendo
ser classificadas no tipo e padrão próprio.
Por tais razões, tramitam perante a Justiça inúmeras ações de anulação de lançamento de IPTU.
Jurista.
Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Professor.
Especialista em Direito Financeiro e Tributário pela USP.
Fonte: Revista Jus Navigandi
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