WASHINGTON
- O Brasil pode ser "vítima de seu próprio sucesso". O alerta do Fundo
Monetário Internacional (FMI) refere-se aos riscos da expansão acelerada
do crédito e também da redução da taxa básica de juros, a Selic, sem o
necessário alongamento dos prazos de crédito. Bolhas em preços no setor
imobiliário e o endividamento das famílias são dois dos riscos mais
evidentes.
No documento Avaliação da Estabilidade do Sistema
Financeiro, o FMI chama a atenção também para os riscos externos ao
setor gerados pela volatilidade do mercado de capitais e pelos preços
das commodities.
"Existe o risco de o sistema financeiro tornar-se
vítima de seu próprio sucesso no País", afirmou Dimitri Demekas,
diretor-assistente do Departamento de Mercados Monetários e de Capitais
do Fundo, ao Boletim Digital da instituição. "A expansão acelerada do
crédito nos últimos anos apoiou o crescimento da economia interna e o
aumento da inclusão financeira. Mas essa expansão também poderia gerar
vulnerabilidades."
Esta foi a primeira vez que o governo
brasileiro autorizou a divulgação do documento pelo FMI. A avaliação do
setor financeiro é feita desde 1999, a cada cincos, em 25 países. Desde
2002, quando deu-se a primeira avaliação do Brasil, o FMI constatou ter
havido "crescimento, diversificação e sofisticação do sistema", que
mostrou-se capaz de atravessar "excepcionalmente bem" a crise de 2008. O
ambiente atual, porém, é de desafios, alerta o Fundo.
A expansão
do crédito nos últimos anos é um deles, mesmo sendo o total de
empréstimos em relação do Produto Interno Bruto (PIB) ainda baixo. Essa
situação não representa risco para os grandes bancos, mas gera
vulnerabilidade para instituições de pequeno porte, com menos capacidade
de cobrir uma eventual necessidade de liquidez. "É preciso monitorar e
adotar medidas pró-ativas para conter essas crescentes
vulnerabilidades", recomendou o FMI.
O Fundo reforça sua mensagem
em favor da redução da Selic, hoje em 8,0% ao ano. Porém, chama a
atenção das autoridades brasileiras para o fato de essa queda gradual
romper o atual equilíbrio existente no sistema financeiro brasileiro de
juros altos e crédito de curto prazo. Será preciso, portanto, extremo
cuidado para acomodar a economia e o setor financeiro em um novo
equilíbrio, mais saudável, de juros baixos e crédito de longo prazo.
Sem
esse cuidado, inúmeros riscos podem emergir. Se mexer só na Selic, o
Banco Central pode estimular o aumento da inflação, criar instabilidade
macroeconômica e favorecer a formação de bolhas de preços de ativos,
especialmente dos imóveis. Se apenas estimular o alongamento do prazo do
crédito, pode ampliar demais o passivo financeiro.
Nessa tarefa, a
mudança de foco do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES) será requerida. Há duas semanas, em sua avaliação da economia
brasileira, o FMI já havia feito a mesma recomendação para o BNDES
concentrar-se mais na concessão de crédito de longo prazo - em especial,
para empresas sem capacidade de captar recursos no setor privado - e no
financiamento de projetos infraestrutura. O BNDES, salientou o Fundo,
precisa deixar de lado os empréstimos de baixo risco - como os
concedidos para a Petrobrás - e tornar-se mais competitivo com o mercado
privado.
Em outro documento divulgado nesta terça-feira, 31,
sobre a observância das regras da Basileia pelo sistema bancário
brasileiro, o FMI insistiu na necessidade de o governo aprovar
legislação para garantir, formalmente, a autonomia do Banco Central. A
questão, informa o documento, "continua em aberto". O País colocou em
prática as regras de Basileia 2 e está em consultas para a aplicação
gradual das de Basileia 3. Mas será preciso, reforçou o FMI, também
reformar a governança do Fundo Garantidor de Crédito (FGC).
De
forma geral, o FMI considerou o sistema financeiro brasileiro como
"amplo, concentrado e altamente conectado, no âmbito doméstico". O
sistema é formado por 1.475 instituições de depósito cujos ativos,
somados, superam 100% do PIB do País. A capitalização é superior ao
mínimo recomendado. Os cinco maiores bancos respondem por dois terços
dos ativos. A presença de instituições estrangeiras ainda é menor do que
em outros países latino-americanos. Esses bancos controlam menos de 20%
do total de ativos do setor do País.
Fonte: msnEstadão
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