segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

DIREITO: PROPRIETÁRIO DE IMÓVEL AJUÍZA AÇÃO DE EXECUÇÃO DE ALUGUÉIS NÃO PAGOS E PENHORA IMÓVEL DE RESIDÊNCIA DOS FIADORES

Casa dos Fiadores
Dos fatos:

A empresa Jota Jota Ltda, que explorava o ramo de comércio de eletrônicos, chegou à conclusão de que o ponto comercial no qual estava estabelecida havia se deteriorado e já não mais comportava a circulação de clientes potenciais do seguimento de seu negócio.

Então, com dificuldades de caixa, deixou de pagar os aluguéis de sua sede por vários meses e depois entregou o imóvel sem honrar as suas dívidas locatícias.

O proprietário, depois de constatar que a empresa não possuía patrimônio capaz de garantir a dívida locatícia, concluiu que somente seria possível receber o seu crédito diretamente dos fiadores da locação.

O contrato de locação era antigo, de mais de cinco anos passados, e o prazo original da locação era de apenas três anos, portanto, os meses de aluguéis em atraso eram posteriores ao fim do prazo da locação.

Todavia, havia uma cláusula contratual prevendo que a responsabilidade dos fiadores se estenderia até a efetiva entrega das chaves.

O proprietário tentou localizar os fiadores para negociar o pagamento da dívida e constatou que o casal de fiadores possuía como patrimônio apenas a casa residencial, na qual residiam com seus quatro filhos.

A tentativa de receber os aluguéis em atraso amistosamente não surtiu efeito. O casal de fiadores alegou não ter condição de pagar a dívida. O proprietário, depois de consultar seu advogado, resolveu ajuizar a ação de execução contra a empresa locatária e os fiadores.

Logo depois de distribuída a ação de execução, conforme constava do despacho judicial, o oficial de justiça foi até ao endereço do casal de fiadores, e depois de citá-los, com atendimento aos prazos e às disposições processuais, penhorou-lhes a casa de residência.

Os fiadores, inconformados, tomando conhecimento de que poderiam perder o único patrimônio que possuíam, que também era a residência da família, no prazo legal ofereceram embargos de devedor com o objetivo de se livrarem da execução e obter uma decisão judicial que declarasse a insubsistência da penhora.

Argumentos do Autor na Petição Inicial:

Da petição inicial de Embargos à Execução e os argumentos dos fiadores embargantes:

Os embargantes alegaram que a ação de execução não era o instrumento processual adequado para cobrar as dívidas fundadas em base de cálculo antiga, já que a apuração do débito dependia das atualizações de valores das mensalidades locatícias ao longo dos anos, e que somente pela via da ação de cobrança, com ampla possibilidade de defesa, é que seria possível estabelecer a correta atualização dos valores pretendidos pelo proprietário.

Alegaram também que os aluguéis objeto da execução se referiam a um período posterior ao do vencimento do contrato, e que o contrato de fiança, é um instrumento formal, benéfico, e que seus efeitos não podem exceder ao limite temporal fixado, e que a sua duração até à efetiva entrega das chaves não pode ser entendida como avença em aberto, que possa manter o fiador preso a uma garantia por tempo indeterminado.

Os embargantes alegaram, ainda, que não possuíam qualquer outro imóvel, e que a casa de residência do casal e dos filhos era um "bem de família" nos termos da Lei 8009/90, portanto, impenhorável.

Finalmente, depois de tecer considerações e citar jurisprudência dos tribunais, requereram a procedência dos embargos de devedor, com o objetivo de extinguir a execução e tornar insubsistente a penhora do imóvel "bem de família".

Argumentos do Réu na Contestação:

Da Impugnação aos Embargos à Execução e argumentos do proprietário:

O proprietário impugnou os embargos sob a alegação de que os fiadores eram os principais pagadores da dívida locatícia, e que o próprio Código de Processo Civil estabelecia que os créditos de aluguéis, entre outras espécie de dívidas, são títulos executivos extrajudiciais, passíveis de cobrança pela via de execução, independente de prévia ação de cobrança, mencionando os artigos das normas apontadas:

Alegou também que o instituto jurídico do "bem de família" não se aplicava à hipótese do fiador imobiliário porque a própria lei do inquilinato, expressamente, dispunha que o imóvel de residência dos fiadores responde pela dívida.

Registrou, ainda, que o contrato de locatício era claro e expresso no sentido de que a garantia dos fiadores só terminava com a efetiva entrega das chaves, e que em nenhum momento houve qualquer ressalva dos fiadores com relação a esta cláusula:

Contrato de locação - Cláusula XX
Como garantia do cumprimento das obrigações pactuadas, ao final, assinam os FIADORES, qualificados no preâmbulo deste instrumento, responsabilizando-se, como principais pagadores, pelo fiel cumprimento de todas as cláusulas ora reciprocamente estipuladas e aceitas, até a efetiva entrega das chaves.

Afirmou, com respaldo na cópia do documento respectivo, que a entrega das chaves só se dera depois do vencimento da última das prestações locatícias cobradas.

Por fim, pediu pelo prosseguimento da execução e manutenção da penhora do imóvel de residência dos embargantes.

Informações Adicionais:

Das provas produzidas antes e durante a audiência:

Os fiadores provaram com documentos e testemunhas que não possuíam nenhum outro imóvel além daquele de sua residência;

que os valores dos aluguéis originais já haviam sido reajustados várias vezes pelos índices de inflação;

que o contrato de locação já se encontrava vencido há mais de ano quando o locatário deixou de pagar os aluguéis cobrados na execução embargada.

O proprietário comprovou, por documentos e testemunhas, que a entrega das chaves somente havia ocorrido depois do vencimento da última prestação cobrada;

que as mensalidades locatícias cobradas correspondiam exatamente ao valor original da mensalidade contratada, acrescida da atualização monetária legal e também prevista contratualmente;

que o contrato locatício assinado pelas partes previa que a responsabilidade dos fiadores persistiria até a efetiva entrega das chaves.

Solução proposta pelo Coordenador (Sentença):

Da sentença, na opinião do Coordenador:

É opinião do coordenador que, no item da alegada impropriedade da execução para cobrança de aluguéis, os embargantes não têm razão. O proprietário poderia ter ajuizado a execução, independente da ação de cobrança, porque, conforme prescreve o Código de Processo Civil, o crédito de aluguéis é título executivo extrajudicial. Portanto, a forma correta de sua cobrança é a execução judicial.

Código de Processo Civil
Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais:
...
IV - o crédito decorrente de foro, laudêmio, aluguel ou renda de imóvel, bem como encargo de condomínio desde que comprovado por contrato escrito;

Também, na questão da impenhorabilidade do imóvel de residência dos fiadores, os embargantes não merecem obter sucesso na sua demanda. É que a lei claramente dispõe, e é pacífico o entendimento jurisprudencial dos tribunais, que a impenhorabilidade do único imóvel de residência dos devedores não se aplica ao caso de fiança locatícia.

Lei nº 8.009/90
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
...
VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Entretanto, no que se refere à validade da fiança, em face de contratos vencidos, os embargantes devem receber o provimento judicial.

É dominante na jurisprudência que a data de vigência do contrato formal deve prevalecer em relação aos fiadores. Se consta uma data certa para o término da locação, este deverá ser o limite temporal da responsabilidade dos fiadores. Portanto, não devem responder pelas mensalidades locatícias vencidas depois do término do contrato escrito, ainda que exista cláusula que imponha a responsabilidade dos fiadores até a data da efetiva entrega das chaves.

É que devem ser entendidas como ineficazes as cláusulas que conflitam com os princípios que orientam os institutos jurídicos, no caso, a data limítrofe que estabelece a validade do contrato em relação aos fiadores.

Isto porque a fiança é um contrato benéfico, formal, que não se coaduna com a duplicidade de vínculos; um que estabeleça a data de início e término do compromisso, e outra, em aberto, que mantém o fiador preso a uma garantia por tempo indeterminado.

No caso estas cláusulas, atípicas, sempre provocam cerceamento de direitos ou inutilizam o prazo de validade estabelecido no contrato de locação, em benefício apenas do proprietário, razão pela qual não devem produzir efeitos jurídicos.

Cumpre registrar, por oportuno, que esta é opinião do coordenador e também da maioria dos Ministros do Egrégio Superior de Justiça, conforme as recentes decisões abaixo transcritas:

REsp 860795 / RJ - 2006/0151513-6
O fiador responderá pelos encargos decorrentes do contrato de locação tão-somente pelo período inicialmente determinado, ainda que exista cláusula estendendo a sua obrigação até a entrega das chaves. Precedentes do STJ.
O contrato acessório de fiança obedece à forma escrita, é consensual, deve ser interpretado restritivamente e no sentido mais favorável ao fiador. Assim, a prorrogação por tempo indeterminado do contrato de locação, compulsória ou voluntária, desobriga o fiador que a ela não anuiu. Precedentes.

AgRg no Ag 736119 / RJ - 2006/0007757-0
O Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento no sentido de que a fiança como contrato benéfico, não admite a sua interpretação extensiva, não tendo eficácia a cláusula contratual que preveja a obrigação fidejussória até a entrega das chaves, ou que pretenda afastar a disposição do art. 1500 do Código Civil de 1916.
Assim, há que se ter como termo final do período a que se obrigaram os fiadores a data na qual se extinguiu a avença locativa originária, impondo-se afastar, para fins de responsabilização afiançatória, o lapso temporal que se seguiu, creditado à conta de prorrogação do contrato.

Assim, na opinião do coordenador, o fiador embargante tem razão.

Fonte: www.jurisway.org.br

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