O artigo trata do protesto do contrato de locação
quando decorre de descumprimento de quaisquer uma das cláusulas inerente
ao locatário.
1. Introdução:
A Lei 9492/1997, não faz qualquer
objeção ao protesto do contrato de locação, já que se há uma dívida,
pode este ser convertido em título líquido, certo e exigível e, por
consequência pode ser levado a protesto.
Art. 1º
Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o
descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de
dívida.
Numa interpretação teleológica ao artigo
1º da Lei 9492/2004, um contrato inadimplido seria sim, um documento de
dívida, passível de ser levado a protesto.
A partir da leitura dos dispositivos
legais acima elencados, tem-se que a melhor interpretação a ser adotada é
aquela segundo a qual o legislador, quando estendeu para além dos
títulos cambiários, a possibilidade de protesto de "outros documentos de
dívida", teve a intenção de que fazê-lo também para abarcar os títulos
executivos judiciais e extrajudiciais previstos no Código de Processo
Civil e demais legislações suplementares, inserido, nessa hipótese, o
contrato de locação, que encontra previsão na Lei 8245/1991.
O Código de Processo Civil elenca em seu
artigo 585, os títulos ou documentos que se atribuem a qualidade de
título executivos extrajudicial, para fins de execução de quantia certa.
Ex: Qualquer documento particular que origine uma dívida,
devidamente assinado pelo devedor e/ou por duas testemunhas.
Art. 585 - São Títulos Executivos Extrajudiciais:
I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque;
II
- a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor;
o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o
instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela
Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores;
III
- os contratos de hipoteca, de penhor, de anticrese e de caução, bem
como de seguro de vida e de acidentes pessoais de que resulte morte ou
incapacidade;
IV
- o crédito decorrente de foro, laudêmio, aluguel ou renda de imóvel,
bem como encargo de condomínio desde que comprovado por contrato
escrito;
V
- o crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de
tradutor, quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados
por decisão judicial;
Vl
- a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, Estado,
Distrito Federal, Território e Município, correspondente aos créditos
inscritos na forma da lei;
Vll - todos os demais títulos, a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva.
Extraindo-se da redação do artigo 580 do CPC, que diante do
inadimplemento do devedor, seja a execução instaurada para que ele
satisfaça a obrigação certa, líquida e exigível, como determina o artigo
586 do citado diploma legal, consubstanciada em título executivo.Verbaliza SÍLVIO DE SALVO VENOSA que:
"Em matéria cambial, o protesto é prova oficial e insubstituível da falta ou recusa, quer do aceite, quer do pagamento, [...].
Segundo a doutrina tradicional, o protesto é um ato formal com
finalidade essencialmente probatória, uma vez que evidencia que o
devedor não cumpriu a obrigação constante do título. Trata-se de ato
jurídico em sentido estrito. O efeito probante do ato decorre
exclusivamente da lei.
Nesse diapasão, há de se levar em conta o novo protesto com finalidade especial. Essa modalidade de protesto é destinada a títulos e documento que a princípio não eram protestáveis,
mas cujo protesto serve para atingir uma finalidade ou completar o
sentido das obrigações no universo negocial. Em resumo, permitindo o
legislador que outros documentos comprobatórios de obrigações e débitos
em aberto sejam protestados, busca-se, por meio do ato jurídico do protesto, o aperfeiçoamento do princípio pacta sunt servanda.
Nessa modalidade de protesto se incluem, entre outros, sentença com
trânsito em julgado, contratos e outros débitos para fundamentar pedido
de falência contra devedor comerciante (art. 10 da Lei de Falências)."(VENOSA, Sílvio de Salvo. O Protesto de Documentos de Dívida, in Novo Código Civil Interfaces no Ordenamento Jurídico Brasileiro, Coordenadora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, 1. ed. – Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2004, ps. 124/125.)
Vale dizer que, qualquer documento que
represente uma dívida e que esteja apto a uma ação judicial de cobrança
(execução judicial) poderá ser objeto de protesto.
2. Do protesto do contrato locativo em decorrência de dívida
Pode-se dizer, que a partir das mudanças
engendradas na parte de execução de títulos do Código de Processo
Civil, todos os títulos executivos judiciais e extrajudiciais
vislumbrados pela legislação processual poderão ser protestados.
Analisando o contrato de locação, que é claramente regido pelo princípio do pacta sunt servanda,
em que é passível fixar-se disposições pertinente a locação, inclusive
inserir despesas locativas, tais como água e esgoto, força e luz,
impostos e taxas, contribuição condominial, além de multas e constituir
em mora em decorrência de infrações contratuais, que são créditos
líquidos, certos e exigíveis.
Se for pela interpretação do legislador,
há possibilidade de ser protestado o débito do aluguel, desde que seja
apresentado o contrato de locação em sua via original.
Ressalte que, segundo o artigo 569,
inciso II do Código Civil c/c artigo 23, inciso I da Lei 8245/1991,
consiste no direito obrigacional por parte do locatário a pagar na data e
lugar em que for ajustado o aluguel e encargos, dando cumprimento ao
contrato; assim pelo fato de haver lugar para que a obrigação de pagar
certa quantia esteja estipulada, subsiste ao credor o direito de
cobrá-la, ainda que em protesto.
SÍLVIO DE SALVO VENOSA expõe que:
"[...]
Desse modo, embora haja quem à primeira vista possa sufragar a opinião
mais extensiva, o dispositivo do artigo 1º deve ser interpretado
restritivamente no sentido de que o protesto é utilizável somente para os títulos cambiários e para os demais títulos executivos judiciais e extrajudiciais, que estão elencados nos arts. 584 e 585 do Código de Processo Civil. Desse modo, doravante, devem ser admitidos a protesto todo o rol elencado nesses dispositivos, entre outros, [...], crédito decorrente de aluguel ou renda de imóvel, [...], desde que comprovado por contrato escrito. Desse modo, por exemplo, o débito resultante da locação de imóvel, comprovado por contrato escrito, pode ser objeto de protesto, tanto quanto ao inquilino como quanto ao fiador, pois a fiança é modalidade de caução e se insere entre os títulos executivos extrajudiciais. [...]"(O Protesto de Documentos de Dívida, in Novo Código Civil Interfaces no Ordenamento Jurídico Brasileiro, Coordenadora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, 1. ed. – Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2004, p. 125.)
Se é possível extrai do contrato de
locação a certeza e a liquidez do crédito, pois a própria Lei de
Locações assim o expressa, sendo desnecessário a sua inclusão no Código
de Processo Civil, a partir do inserimento do inciso IV no artigo 585,
segundo a exposição de motivos do Projeto de Lei 3252/2004 idealizada
pelo Ministro da Justiça à época, Dr. Márcio Thomaz Bastos.
Exposa o citado autor (in,
Palestra "O protesto do fiador e do inquilino sob o prisma da Lei nº
9.492/97", proferida no SECOVI-SP), que: “Desse modo, por exemplo, o débito resultante de locação do imóvel, comprovado por contrato escrito pode ser objeto de protesto,
tanto quanto ao inquilino como quanto ao fiador, pois a fiança é
modalidade de caução e se insere entre os títulos executivos
extrajudiciais”.
Insta informar que, recentemente foi
sancionada no Estado de São Paulo, a Lei 10700 de 29/12/2000, que prevê a
possibilidade do registro de impontualidade de dívida locatícia, ou
seja, permite ao locador, o direito de protesto do contrato de locação,
quando este estiver o locatário e/ou fiador inadimplentes, bem como a
inclusão do nome dos devedores nos cadastros restritivos de crédito.
Nestes termos, é o magistério exarado pelo magistrado VENÍCIO ANTÔNIO DE PAULA SALLES:
"A dicção legal é precisa e insuperável. Protestável
para esta Lei Estadual, são todos os títulos considerados, pela
legislação processual, como TÍTULOS EXECUTIVOS EXTRAJUDICIAIS”.
Consoante NELSON GODOY BASSIL DOWER (in, Curso Básico de Direito Processual Civil,
2ª ed., V.3, p. 74), "esse direito que tem o credor de provocar a
execução é direito de agir, é a ação de execução, sempre baseada
-repita-se- no título executivo e que nasce quando há o inadimplemento
por parte do devedor, dando lugar ao processo executivo".
Encontra-se pacificado frente a
doutrina, que os contratos de locação de imóveis, tais como cheques e
notas promissórias, estes, passíveis de protesto, representam perfeitos
títulos executivos extrajudiciais.
O mencionado processualista, comentando
ementário transcrito pela RT 677/163, descreve que "na execução de
aluguel, o título executivo extrajudicial não é o documento a que se
refere o inc. II do art. 585, mas sim o crédito locatício comprovado por
contrato escrito, revisto pelo inc.IV do mesmo artigo”.
Com amparo nos argumentos doutrinário
acima expostos, pode-se dizer, que se leva a protesto é a dívida
originária do descumprimento de uma das cláusulas constantes no contrato
de locação.
Quanto a possibilidade de se protestar o
fiador, juntamente, com o locatário, é possível, desde que a garantia
fidejussória atribuída ao contrato, seja precedida de solidariedade pelo
cumprimento da obrigação, com fulcro na disposição trazida pelo artigo
828, II do Código Civil, mediante cláusula expressa constante no
Contrato de Locação.
3. Da divergência jurisprudencial quanto a matéria em análise
O TJSP, assim como o entendimento
majoritária da 5ª Turma do STJ ao julgar o RMS 17400, com acórdão
publicado no DJ-e em 3/11/2011, que teve o voto vencedor do Ministro
Adilson Macabu, não pode ser protestado o contrato de locação, por ser
título executivo extrajudicial, ficando vencida a Ministra-relatora
Laurita Vaz, que com fulcro em outros precedentes desta Corte, entendia
que:
"...
esta Corte Superior de Justiça possui jurisprudência remansosa no
sentido de atribuir ao contrato de locação a natureza de título
executivo extrajudicial ".
O aresto origina-se de Mandado de
segurança oriundo do TJSP, que foi impetrado contra ato do Corregedor
Geral de Justiça do Estado de São Paulo, que tornou sem efeito permissão
concedida para protesto de contratos de locação aos Tabeliães de
Protestos de Letras e Títulos da comarca da Capital, inclusive
determinando o cancelamento daqueles que haviam sido lavrados durante a
vigência da citada permissão, que por unanimidade foi negado o mandamus, sob o fundamento de que:
“...
expressamente não ficou estabelecido que o contrato de locação de
imóvel deveria ser considerado como título executivo extrajudicial hábil
a ser protestado, não se pode dizer que o ato praticado violou um
direito da impetrante, sendo que foi dada uma interpretação viável ao
assunto.”
O entendimento externado pela 5ª Turma
do STJ, não parece ser muito congruente, haja vista que a dívida, em
caso de não pagamento da locação ou de seus encargos, pode ser
contabilizada e, levado os cálculos como o boleto de cobrança ao ato de
protesto desde que apresentado o contrato original.
Assim, pode-se dizer que é cabível o
protesto do contrato de locação, até porque “O protesto, quando devido, é
poderoso instrumento que possui o credor para compelir o devedor ao
adimplemento da obrigação.
E o protesto será devido sempre que a obrigação reclamada for líquida, certa e exigível.
(...)
Se aos títulos de crédito, documentos
particulares produzidos sem a chancela do Estado, oferece-se o protesto
como forma de colocar o devedor em mora, ...
(...)
Contudo, além desses escopos, o protesto
causa efeito negativo na vida do devedor recalcitrante. A publicidade
específica, que causa a restrição ao crédito, leva o devedor a adimplir
sua obrigação, tão logo quanto possível, para livrar-se da restrição
creditícia.” (REsp 750805, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ-e
16/6/2009).
Se a própria 3ª Turma do STJ admite até o
protesto de sentença judicial, mais ainda se pode admitir o do Contrato
de Locação, quando advier dívidas decorrentes de inadimplência,
independentemente da interposição de procedimento judicial.
Logo, o locador de imóvel com locatário inadimplente poderá direcionar a protesto o contrato de locação vencido e não quitado.
A competência do protesto será o local
de pagamento expresso no contrato, ou seja, a praça de pagamento. Na
ausência deste, será adotado o critério do domicílio do devedor.
O locador terá a possibilidade de indicação a protesto apenas do locatário ou do locatário e do fiador.
4. Conclusão
Portanto, conclui-se que a dívida
deixada em aberto no contrato de locação, se pode ser cobrada ou
executada, possibilidade existe no protesto da mesma, eis que é
originária de um contato, e reflexamente, cabível levar-se a protesto o
contrato de locação.
O entendimento jurisprudencial da
maioria da 5ª Turma do STJ se encontra equivocado, bem como do TJSP, até
porque o julgador não pode inovar e nem dar a interpretação, que se
encontra dissociada a lei.
A doutrina se perfilha tanto com o
entendimento do legislador reformista do Código de Processo Civil, no
que pertine aos títulos executivos, quanto ao legislador elaborador da
Lei 9492/2004, que admite o protesto do contrato de locação, quando
houver dívida oriunda de descumprimento de cláusula contratual.
Razão mais ainda assiste, aos defensores
da corrente que admite o protesto do contrato de locação, até porque se
é admissível a propositura da ação de despejo por falta de pagamento ou
por descumprimento de quaisquer uma das cláusulas constante no contrato
de locação, em que se pede o desalijo compulsório do inquilino devedor,
dando-se ciência ao fiador.
Pontofinalizando, o protesto do contrato
de locação, que é um título executivo extrajudicial, possuidor de força
executória, sendo exigível, e a dívida decorrente de descumprimento
deste, ser certa e líquida, pode ser realizada nos Cartórios de Protesto
de Título, não podendo tais serventias se excusarem de fazê-lo,
baseando-se em entendimento duvidoso e isolada de parte da 5ª Turma do
STJ. (Grifo nosso)
Autor: Dr. Márcio Antonio Alves
Fonte: meuadvogado.com.br
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