Com este escrito, ao contrário do disposto na Lei do Inquilinato, pretendemos
comprovar que nos contratos de locação urbana a caução em dinheiro
poderá exceder o equivalente a três meses de aluguel.
A anterior Lei nº 6.649, de 16 de maio de 1979, que regulava a locação predial urbana, dispunha no seu art. 31 que “No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes garantias: I – caução em dinheiro.”
Repete-se: caução em dinheiro.
Dita caução, à luz do disposto no art. 32 da aludida Lei nº 6.649, de 1979, previa que “A caução em dinheiro não poderá exceder ao valor de três meses de aluguel”.
Através da Resolução nº 9, de 13 de agosto de 1979, do antigo e extinto Banco Nacional da Habitação, foi regulamentado “o
depósito nas entidades do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo,
de valores oferecidos em garantia de contrato de locação”.
Pois bem.
Quando redigimos a primeira versão do Anteprojeto de uma nova Lei do
Inquilinato mantivemos a mesma sistemática no sentido de que a
caução em dinheiro, nas locações prediais urbanas, não poderia exceder ao valor de três meses de aluguel.
No entanto, nas reuniões da Comissão Interministerial, criada
especificamente pelo Governo Federal da época para elaborar o Projeto
de Lei a ser submetido ao Congresso Nacional, da qual participávamos
como um dos autores do Anteprojeto, resolveu-se retirar da caução no contrato de locação a proibição de não “exceder ao valor de três meses de aluguel”.
Vale dizer a caução, em matéria de locação predial urbana, não seria mais necessariamente em dinheiro, podendo sê-lo “em bens móveis ou imóveis”, de quaisquer valores, consoante previsto no vigente art. 38 da Lei nº 8.245, de 1991.
Ocorre que nas diversas redações submetidas à
discussão na Comissão Interministerial e, posteriormente, nas
Comissões temáticas da Câmara Federal e do Senado Federal, nas quais
assessoramos os seus membros relatores, inadvertidamente, ficou mantido
o disposto no § 2º do referido art. 38, o qual estabelece que “A caução em dinheiro, que não poderá exceder o equivalente a três meses de aluguel (…)”
Se a caução (art. 37) poderá ser em bens móveis ou imóveis, de quaisquer valores (art. 38), é inteiramente contraditório restar estabelecido no § 2º do art. 38 que “A caução em dinheiro, que não poderá exceder o equivalente a três meses de aluguel (…).
Ora, se um bem móvel, por exemplo um veículo, uma jóia, determinada quantidade de ações de companhias, etc, ou um bem imóvel, tais como apartamento, vaga de garagem autônoma, loja, terreno, sítio, fazenda, etc, podem
ser de qualquer valor superior a três meses de aluguel, porque a caução
em dinheiro terá de ficar restrita ao valor de três meses de aluguel ?
Não faz, pois, o menor sentido essa contraditória erronia legislativa !
Sabe-se que no mercado locatício, em visível prejuízo ao locatário, está cada vez mais difícil a prestação pelo locatário da garantia da tradicional fiança (art. 37, II), pelas mais variadas razões.
Por sua vez, o seguro fiança locatícia (art. 37, III) – (de
longe a melhor das garantias locatícias) – para a maioria dos
locatários, notadamente os das locações residenciais, ainda é caro
suportar o pagamento do prêmio, ou seja a prestação paga pelo segurado (
o locatário) para a contratação do seguro.
É caro porque não está massificado, como o é o seguro dos veículos. E
não é massificado porque é caro. Somente se um dia vier a ocorrer a
massificação desse tipo de seguro, poderão os locatários suportarem o
pagamento do prêmio correspondente.
A cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento (art. 37 IV), incluído pela Lei nº 11.196, de 2005, ainda não está sendo aplicada no mercado das locações.
Então diante desse quadro fático está sendo cada vez mais utilizada a prestação da caução em dinheiro em quantidade expressiva.
Notadamente nas inúmeras locações para locatários oriundos de outras
cidades para as regiões metropolitanas da grandes cidades, à vista das
novas oportunidades de emprego, diante do expressivo crescimento da
economia brasileira.
De registrar-se que a partir dagora o Governo Federal está
facilitando o ingresso de estrangeiros titulares de mão de obra
qualificada.
De que modo essas pessoas, tantos os nacionais que estão se
locomovendo de umas cidades para outras , quanto os alienígenos que
estão aportando aos centro das grandes cidades, ou até mesmo para as
cidades interioranas, poderão garantir as suas locações ?
Não esquecer-se que o valor “equivalente a três meses de aluguel”
não garante nada, já que devido ao acúmulo dos diversos procedimentos
em tramitação nos pretórios, as ações de despejo por falta de pagamento
de aluguel, demoram muito mais de três meses, atingindo, muitas das
vezes mais de doze meses.
Sem falar que alguns juízes – após a contestação do locatário que não
purga a mora – designam audiência de conciliação (SIC), em lugar de na
direção do processo velar pela rápida solução do litígio (art. 125, II, do CPC) e cumprir as claras regras dispostas no art. 62, incisos I ao VI e seu parágrafo único da Lei nº 8.245, de 1991, retardando, mais ainda, a solução do litígio.
Registre-se que o locador que convencionar com o locatário
a caução em dinheiro em valor superior a três meses do aluguel
pactuado, não incorrerá em nenhuma das penalidades estipuladas nos artigos 43 e 44 da Lei do Inquilinato e nem ocorrerá nulidade da cláusula porque ela não visa a elidir os objetivos da Lei inquilinária (art. 45).
Diante de tudo isso, não vemos qualquer vedação legal na
estipulação de caução em dinheiro de valor superior a três meses do
aluguel.
Ao contrário enxergamos somente vantagens para o locatário, que
poderá efetuar locação sem depender de pedir fiança, ou pagar caro
seguro de fiança locatícia.
Portanto, podem e devem, locadores e locatários convencionarem
livremente o valor que bem entenderem para garantir a locação firmada.
Quando finda, resilida ou rescindida a locação, o locador fica
obrigado a devolver ao locatário o valor recebido em caução, acrescido
de todas as vantagens oriundas de caderneta de poupança.
Autor: Geraldo Beire Simões
Fonte: ABAMI - Associação Brasileira dos Advogados do Mercado Imobiliário
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