A presença de duas
expressões latinas que não fazem parte do cotidiano da maioria dos leitores
pode resultar em reações que levam ao desânimo de prosseguir na leitura ou a
desconfiança de que, mesmo encorajados a prosseguir, não irão compreender o
significado, além do que, alguns poderão cair no ideário popular de que os
advogados se valem dessas estranhas palavras para dificultar o entendimento
de seu vocabulário.
Aos que confiaram no
articulista e prosseguiram na leitura, podemos assegurar que tratam-se se
conceitos importantíssimos no mundo das transações imobiliárias, com maior
presença no meio rural, incluídas em nosso Código Civil e que ensejaram
diversas disputas judiciais, muitas discutidas até a última
instância, nos Tribunais Superiores, em Brasília.
Por definição, a
expressão latina ad corpus, cujo significado seria “por inteiro” ou “assim
como está”, é utilizada nas transações imobiliárias para exprimir uma venda
cujo preço foi estipulado sobre a propriedade como um todo, na forma como
foi apresentada ao comprador, não existindo qualquer tipo de referência ou
amarração à sua metragem.
Em contrapartida, a
expressão ad mensuram, também originária da língua latina, serve para
designar aquela transação imobiliária cuja estipulação do preço foi
condicionada à especificação das dimensões e da área do imóvel, o que enseja
ao comprador o direito à complementação da área, abatimento do preço e, até
mesmo, ao desfazimento do contrato.
Em função desses
conceitos, não é raro que transações ocorridas no meio rural tragam
referência do preço pelo valor unitário, em hectares, sendo a área meramente
enunciativa, onde o comprador paga um sinal e o complemento fica
condicionado à realização de um levantamento topográfico da área, quando
então será estipulado o valor final, podendo inclusive existir a estipulação
de valores diferenciados, um referente às áreas com lavouras e outro
aplicável às partes com terra nua.
Embora no meio urbano essa
ocorrência seja menos comum, haja vista que os levantamentos para
determinação da área sejam mais simples, existem casos de terrenos para
incorporação que o valor também é fixado em função da área a ser apurada,
uma vez que dela dependerá a concretização do futuro empreendimento, cuja
área construída total é o resultado da área do terreno multiplicada pelo
coeficiente de aproveitamento estipulado em lei.
O fundamento legal que
respalda os conceitos ora trazidos, bem como suas implicações no mundo dos
negócios, encontra-se no art. 500 do Código Civil Brasileiro, que prevê o
direito do comprador reclamar em caso diferença, estipulando uma tolerância
de 5,0% (um vigésimo da área), condicionada à prova de influência na
realização do negócio, e ainda a hipótese de excesso e não falta de área,
cuja conseqüência é a devolução do excedente ou o complemento do valor
correspondente.
O mesmo dispositivo legal
ainda determina expressamente que nenhuma dessas hipóteses ocorrerá se a
venda for ad corpus, ou seja, “se o imóvel for vendido como coisa certa e
discriminada, tendo sido apenas enunciativa a referência às suas
dimensões”.
Do ponto de vista da
interpretação de nossos Tribunais, podemos citar Jurisprudência do STJ –
Superior Tribunal de Justiça, que, ao julgar uma ação originária da Comarca
de Dores do Indaiá - MG, decidiu que a venda de imóvel como coisa certa e
determinada, cujas dimensões eram referenciais, não gera direito ao
comprador, uma vez que as provas demonstraram que a extensão da área era
irrelevante para realização do negócio, cujos limites e confrontações eram
de conhecimento dos contratantes, constando inclusive na descrição do
título.
Autor: Eng. Francisco Maia
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