A
compradora de um imóvel hipotecado, mesmo com contrato não registrado
em cartório, pode embargar penhora para defender seus próprios direitos.
A Quarta Turma chegou a essa conclusão em recurso interposto pela Caixa
Econômica Federal (CEF) contra julgado do Tribunal Regional Federal da
1ª Região (TRF1). A Turma acompanhou de forma unânime o relator do
processo, ministro Raul Araújo.
Em novembro de 1994, a CEF
ajuizou execução hipotecária contra um mutuário inadimplente. Em agosto
de 1995, ele foi citado por edital e no ano seguinte o imóvel foi
penhorado. A compradora alegou que havia adquirido o imóvel em setembro
de 1995, por contrato de promessa de compra e venda não registrado no
cartório imobiliário, o chamado contrato de gaveta. Ela interpôs
embargos de terceiros para suspender a execução da hipoteca e impedir a
desocupação.
Em primeira instância, os embargos foram extintos
sem julgamento de mérito. O juiz considerou que a compradora adquiriu o
bem após a citação do mutuário para a execução hipotecária e que ela
deveria ter-se habilitado como assistente litisconsorcial, ou seja, como
parte interessada no processo que auxilia a parte original.
Entretanto,
o TRF1 considerou que, no caso, não se aplicaria o artigo 42, parágrafo
3º, do Código de Processo Civil (CPC). A regra estabelece que a
alienação de coisa litigiosa não altera a legitimidade das partes no
processo. O que ocorreu, para o TRF1, foi a compra de bem posteriormente
penhorado em execução contra o mutuário. Assim, o tribunal determinou a
volta dos autos à origem para o prosseguimento da ação.
A
CEF recorreu ao STJ afirmando que o artigo 42 do CPC deveria ser
aplicado no caso. Também haveria dissídio jurisprudencial (julgados com
diferentes conclusões sobre o mesmo tema), já que o Tribunal Regional
Federal da 4ª Região (TRF4) entende que um imóvel pode ser considerado
coisa litigiosa mesmo antes da penhora e que o fato de a penhora ocorrer
após a transferência do imóvel não influencia na sua caracterização
como coisa litigiosa.
Recurso da CEF
O TRF4 também considera que a compra de bem com execução hipotecária em curso pode configurar fraude.
A
Súmula 84 do STJ não deveria ser aplicada na hipótese, segundo
argumentou a CEF. A súmula permite o embargo de terceiro fundado em
alegação de posse de imóvelis decorrente de compromisso de compra e
venda, mesmo sem registo. A Caixa apontou que a situação era outra,
pois, na verdade, houve cessão de direitos de financiamento habitacional
não quitado, sem a autorização da instituição financeira.
No
seu voto, o ministro Raul Araújo considerou o entendimento do TRF1
adequado. Ele explicou que a compradora não pretendeu substituir o
mutuário na execução hipotecária, mas, com base no artigo 1.046 do CPC,
embargou a execução para defender direito próprio por ter posse do
imóvel.
Defesa do próprio direito
Portanto, a recorrida não deduz pretensão de
substituição da parte executada na execução hipotecária, mas sim de
defender direito próprio decorrente de sua condição de possuidora e
adquirente/cessionária de direitos relativos ao imóvel hipotecado e
penhorado, esclareceu.
Para o relator, a compradora ajuizou ação
autônoma, com pretensões próprias, por ver atingido seu direito como
possuidora de um bem. O ministro Raul Araújo acrescentou que o fato de
ela ou a CEF ter razão deve ser decidido no momento processual oportuno.
Não há, todavia, impedimento para o embargo ser apreciado.
Fonte: JurisClipping Original - processo REsp 465023
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