São muito comuns os negócios que envolvem a alienação do fundo de
comércio ou estabelecimento, especialmente, aqueles abrangendo a cessão
do contrato de locação.
Outrossim, igualmente, são comuns os problemas
enfrentados pelas partes nestas operações, em razão da ausência de
atenção para alguns cuidados essenciais.
Em razão da dinâmica do mercado imobiliário, potencializado
pelas locações em shopping centers, cada vez mais, por exemplo, nos
deparamos com “adquirentes de lojas” condenados por dívidas dos
“vendedores”. Na Justiça do Trabalho esta é uma prática recorrente,
apesar de por vezes ser injusta. Com efeito, este artigo é dirigido aos
lojistas/locatários e redes de franquia, todavia igualmente poderá ser
útil para situações similares.
O fundo de comércio ou estabelecimento, à luz do artigo 1.142,
do Novo Código Civil, é definido como o conjunto de bens corpóreos
(mobiliário, equipamentos etc.) e incorpóreos (ponto comercial, marca
etc.) utilizados para exploração da atividade econômica escolhida.
Feitos tais esclarecimentos, importante indicar, desde logo, os riscos
inerentes à operação em pauta, seja do ponto do cedente/locatário
(alienante do estabelecimento) ou do cessionário/locatário (adquirente
do estabelecimento).
Sob a ótica do cessionário, além dos cuidados referentes ao
contrato de locação, os quais serão pormenorizados abaixo, o principal
temor existente trata-se da eventual responsabilização por débitos do
cedente. Em suma, dependendo da circunstância, o cessionário pode ser
responsabilizado nas esferas civil, trabalhista e fiscal por dívidas
contraídas exclusivamente pelo cedente, ou seja, por dívidas criadas
antes da aquisição do estabelecimento/fundo de comércio. A legislação
pátria possui dispositivos específicos (vide artigos 10 e 448, da CLT e
artigo 133, do CTN), merecendo destaque o artigo 1.146, do Código Civil,
cuja entrada em vigor se deu em 2003.
Nessa linha, antes de ser concretizado do negócio, sem
prejuízo das demais diligências de praxe, inclusive com a completa
auditoria legal, imprescindível que o cessionário analise o passivo da
empresa/cedente, a fim de que seja avaliado o risco existente, o qual,
em última análise, servirá de base para a quantificação do preço do
estabelecimento.
Do ponto de vista da cedente, cabe ressaltar a parte final do
artigo 1.146 do Código Civil, a qual estabelece que o “devedor
primitivo” continua obrigado pelo prazo de um ano, “a partir, quanto aos
créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do
vencimento”.
Quanto ao contrato de locação, as partes (cedente e
cessionário) precisam prontificar-se que o mesmo foi cedido
corretamente, com o fito de evitar responsabilização por débitos
locatícios, a retomada da posse pelo locador entre outros problemas.
Ademais, em ocorrendo a ocupação irregular do imóvel locado, o
cessionário ficará privado da ação renovatória de contrato de locação, o
que pode ser uma tragédia, na medida em que o ponto comercial é muitas
vezes o bem mais valioso do estabelecimento adquirido.
Como o assunto é extremamente complexo e compreendem diversas
variáveis (por exemplo, a responsabilização do cessionário do contrato
de locação na Justiça do Trabalho não se configura de plano, sendo
necessário, basicamente, que seja dada continuidade ao negócio do
cedente), fica o registro de que os cuidados acima são meros exemplos
para embasar o argumento do presente, no sentido de que, sem prejuízo da
devida análise comercial, é fundamental o prévio exame jurídico
completo da viabilidade do negócio.
Daniel Alcântara Nastri Cerveira, sócio do escritório
Cerveira Advogados Associados; professor de pós-graduação em Direito
Imobiliário do Instituto de Direito da PUC/RJ; instrutor homologado da
ABF - Associação Brasileira de Franchising; pós-graduado em Direito
Econômico pela FGV-SP; pós-graduado em Direito Empresarial pela
Universidade Presbiteriana Mackenzie e autor das obras "Shopping
Centers - Limites na liberdade de contratar" e “Franchising – Temas
Jurídicos” – daniel@cerveiraadvogados.com.br
Fonte: Diário da Manhã
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