sábado, 3 de agosto de 2013

ANUIDADE DOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL


Da falta de pertinência temática na origem da Lei 12.514/2011 e a discussão sobre sua inconstitucionalidade.

Os Conselhos de Classes Profissionais são autarquias federais (pessoas jurídicas de direito público), responsáveis pela regulamentação das suas respectivas profissões e fiscalizando o exercício dos profissionais devidamente habilitados.

A forma com que mantêm suas atividades, pagando as despesas de seu funcionamento, é através da cobrança de anuidades, ou seja, da cobrança das contribuições sociais devidas.

Muito se discutiu a respeito da natureza dessas cobranças, sendo que os Egrégios Tribunais Pátrios já pacificaram o assunto, restando incontroverso a natureza tributária das mesmas. Porém, como de praxe, a totalidade dos Conselhos existentes utilizavam resoluções administrativas para majorar os valores das anuidades, contrariando o ordenamento jurídico e violando o princípio da reserva legal descrito no artigo 150, I da CF/88, onde diz que o tributo só pode ser exigido ou majorado em virtude de lei.

Após muita discussão judicial, chegou-se a conclusão que a Lei 6.994/82 era a única que poderia ser utilizada como parâmetro para a fixação dos valores das anuidades, tanto para pessoa física quanto para pessoa jurídica, pois a única devidamente recepcionada pela Carta de 1988, e que não foi objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), levando muitos associados ingressarem judicialmente requerendo a devolução das diferenças pagas.

EMENTA (STF): RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. ENTIDADE REPRESENTATIVA DE CLASSE PROFISSIONAL. CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA - CREA. CONTRIBUIÇÕES. NATUREZA TRIBUTÁRIA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA. INCIDÊNCIA. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. (...) DECIDO. A irresignação não prospera. O agravo foi interposto contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário em que se discute a inexigibilidade dos valores cobrados a título de anuidade, previstos na Lei n.º 6.994/82. Verifico que o pronunciamento da Turma Recursal não destoa da jurisprudência da Corte, que reconhece a natureza jurídica autárquica dos Conselhos de Fiscalização Profissional e o regime jurídico tributário quanto às taxas de determinadas obrigações por eles impostas compulsoriamente, a submetê-los ao sistema principiológico tributário pátrio, sobretudo ao princípio da legalidade estrita, prevista no artigo 150, inciso I, da Carta Magna. (...) (STF - ARE: 649175 PR , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 31/08/2012, Data de Publicação: DJe-176 DIVULG 05/09/2012 PUBLIC 06/09/2012).

Com o advento da Lei 12.514/2011, surgindo com o objetivo de regulamentar tais discrepâncias, muitos tribunais passaram a proferir decisões ordenando o pagamento de tais valores somente até sua vigência, respeitando a anterioridade tributária.

Surge aqui o questionamento principal da matéria, pois novamente o Supremo Tribunal Federal foi solicitado a se manifestar, tendo em vista a interposição da ADI 4.697, atualmente aguardando julgamento, questionando a constitucionalidade dessa lei.

A lei 12.514/2011, eivada de vícios procedimentais arraigados de sua origem, é resultado da conversão da Medida Provisória 536/2011, que tratava, originalmente, apenas das atividades dos médicos residentes, mas foi acrescida, ao ser convertida em lei, de oito artigos sobre as anuidades dos conselhos profissionais.

Ao usar o texto de uma medida provisória para inserir disciplina normativa completamente nova, usurpa a competência exclusiva da Presidente da República para a edição de disposições normativas urgentes e relevantes, não podendo ter valor legal.

Por sua vez, chamado a dar seu parecer, o Procurador Geral da República, V. Exª ROBERTO MONTEIRO GURGEL SANTOS, junto a ADI 4.697 (Lei 12.514/2011), se manifestou dizendo:  

“Portanto, como a Lei 12.514/2011, quanto aos dispositivos impugnados, é fruto de emenda parlamentar que introduz elementos substancialmente novos e sem qualquer pertinência temática com aqueles tratados na medida provisória apresentada pela Presidente da República – limitada, como já referido, ao regime dos médicos residentes -, sua inconstitucionalidade formal deve ser reconhecida. (8577-PGR-RG, Vice-Procuradora-Geral da República – Déborah Macedo Duprat de Britto Pereira_31/10/2012)”.

É certo que as emendas ao texto podem acontecer, mas emendas estranhas ao núcleo material das medidas provisórias evidenciam um desvirtuamento do processo legislativo constitucional, pois ferem os pressupostos da Medida Provisória.

Há que se ponderar que o fato de o Legislativo ter competência para apreciar a relevância e a urgência não significa dizer que está autorizado a introduzir matérias novas não previstas no texto normativo original, utilizando-se desse procedimento de forma irregular para emplacar matérias na “carona” de outras. Isso contraria o artigo 84, XXVI da CF que confere privativamente ao Presidente da República a faculdade de “editar medida provisória com força de lei, nos termos do artigo 62”.

O fato de o Executivo ter sancionado dispositivo estranho, inserido no projeto de conversão, não elimina o vício de iniciativa, pois se é privativo do Chefe do Executivo não pode ser exercitado por outrem sob ulterior confirmação do primeiro.

Conclui-se, contudo, que a Lei 12.514/2011 surgiu com a nobreza de regulamentar as cobranças das anuidades dos Conselhos de Fiscalização Profissional, porém caiu em descrédito e certamente terá sua constitucionalidade negada pelo STF, pois nitidamente equivocada e ilegal em sua origem, ao passo que sua aplicação causaria prejuízos enormes ao Estado Democrático de Direito, burlando a Constituição Federal e todo o ordenamento jurídico vigente.

Autor:  Rui Carlos Pietschmann
Fonte: meuadvogado.com.br 

Nota do Editor:
Clique no link abaixo e acesse a Lei 12.514/2011 na sua íntegra:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12514.htm
A tílulo elucidativo clique no link abaixo para ver recente decisão da 6ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que por unanimidade negou Apelação imposta pela OAB-ES contra decisão da 5ª Vara Federal Cível de Vitória, que acolhera Mandado de Segurança impetrado pelo Sindiadvogado-ES (Sindicato dos Advogados do Espírito Santo).

http://s.conjur.com.br/dl/oab-espirito-santo-devolver-anunidade.pdf

Um comentário:

  1. Professor Marcos.

    Gostaria de saber, com mais profundidade, sobre a obrigatoridade ou não e suas consequências sobre o pagamento ou não da taxa que o Sindicato dos Corretores cobram desses profissionais.

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