Da falta de pertinência temática na origem da Lei 12.514/2011 e a discussão sobre sua inconstitucionalidade.
Os
Conselhos de Classes Profissionais são autarquias federais (pessoas
jurídicas de direito público), responsáveis pela regulamentação das suas
respectivas profissões e fiscalizando o exercício dos profissionais
devidamente habilitados.
A forma com que mantêm suas atividades, pagando as despesas de seu
funcionamento, é através da cobrança de anuidades, ou seja, da cobrança
das contribuições sociais devidas.
Muito se discutiu a respeito da natureza dessas cobranças, sendo que os Egrégios Tribunais Pátrios já pacificaram o assunto, restando incontroverso a natureza tributária das mesmas. Porém, como de praxe, a totalidade dos Conselhos existentes utilizavam resoluções administrativas para majorar os valores das anuidades, contrariando o ordenamento jurídico e violando o princípio da reserva legal descrito no artigo 150, I da CF/88, onde diz que o tributo só pode ser exigido ou majorado em virtude de lei.
Após muita discussão judicial, chegou-se a conclusão que a Lei
6.994/82 era a única que poderia ser utilizada como parâmetro para a
fixação dos valores das anuidades, tanto para pessoa física quanto para
pessoa jurídica, pois a única devidamente recepcionada pela Carta de
1988, e que não foi objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADI), levando muitos associados ingressarem judicialmente requerendo a
devolução das diferenças pagas.
EMENTA (STF): RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. ENTIDADE REPRESENTATIVA DE
CLASSE PROFISSIONAL. CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E
AGRONOMIA - CREA. CONTRIBUIÇÕES. NATUREZA TRIBUTÁRIA. PRINCÍPIO DA
LEGALIDADE TRIBUTÁRIA. INCIDÊNCIA. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. MATÉRIA
INFRACONSTITUCIONAL. (...) DECIDO. A irresignação não prospera. O agravo
foi interposto contra decisão que negou seguimento a recurso
extraordinário em que se discute a inexigibilidade dos valores cobrados a
título de anuidade, previstos na Lei n.º 6.994/82. Verifico que o
pronunciamento da Turma Recursal não destoa da jurisprudência da Corte,
que reconhece a natureza jurídica autárquica dos Conselhos de
Fiscalização Profissional e o regime jurídico tributário quanto às taxas
de determinadas obrigações por eles impostas compulsoriamente, a
submetê-los ao sistema principiológico tributário pátrio, sobretudo ao
princípio da legalidade estrita, prevista no artigo 150, inciso I, da
Carta Magna. (...) (STF - ARE: 649175 PR , Relator: Min. LUIZ FUX, Data
de Julgamento: 31/08/2012, Data de Publicação: DJe-176 DIVULG 05/09/2012
PUBLIC 06/09/2012).
Com o advento da Lei 12.514/2011, surgindo com o objetivo de
regulamentar tais discrepâncias, muitos tribunais passaram a proferir
decisões ordenando o pagamento de tais valores somente até sua vigência,
respeitando a anterioridade tributária.
Surge aqui o questionamento principal da matéria, pois novamente o
Supremo Tribunal Federal foi solicitado a se manifestar, tendo em vista a
interposição da ADI 4.697, atualmente aguardando julgamento,
questionando a constitucionalidade dessa lei.
A lei 12.514/2011, eivada de vícios procedimentais arraigados de sua origem, é resultado da conversão da Medida Provisória 536/2011,
que tratava, originalmente, apenas das atividades dos médicos
residentes, mas foi acrescida, ao ser convertida em lei, de oito artigos
sobre as anuidades dos conselhos profissionais.
Ao usar o texto de uma medida provisória para inserir disciplina
normativa completamente nova, usurpa a competência exclusiva da
Presidente da República para a edição de disposições normativas urgentes
e relevantes, não podendo ter valor legal.
Por sua vez, chamado a dar seu parecer, o Procurador Geral da
República, V. Exª ROBERTO MONTEIRO GURGEL SANTOS, junto a ADI 4.697 (Lei
12.514/2011), se manifestou dizendo:
“Portanto, como a Lei
12.514/2011, quanto aos dispositivos impugnados, é fruto de emenda
parlamentar que introduz elementos substancialmente novos e sem qualquer
pertinência temática com aqueles tratados na medida provisória
apresentada pela Presidente da República – limitada, como já referido,
ao regime dos médicos residentes -, sua inconstitucionalidade formal
deve ser reconhecida. (8577-PGR-RG, Vice-Procuradora-Geral da República –
Déborah Macedo Duprat de Britto Pereira_31/10/2012)”.
É certo que as emendas ao texto podem acontecer, mas
emendas estranhas ao núcleo material das medidas provisórias evidenciam
um desvirtuamento do processo legislativo constitucional, pois ferem os
pressupostos da Medida Provisória.
Há que se ponderar que o fato de o Legislativo ter
competência para apreciar a relevância e a urgência não significa dizer
que está autorizado a introduzir matérias novas não previstas no texto
normativo original, utilizando-se desse procedimento de forma irregular
para emplacar matérias na “carona” de outras. Isso contraria o artigo
84, XXVI da CF que confere privativamente ao Presidente da República a
faculdade de “editar medida provisória com força de lei, nos termos do artigo 62”.
O fato de o Executivo ter sancionado dispositivo
estranho, inserido no projeto de conversão, não elimina o vício de
iniciativa, pois se é privativo do Chefe do Executivo não pode ser
exercitado por outrem sob ulterior confirmação do primeiro.
Conclui-se, contudo, que a Lei 12.514/2011 surgiu com a nobreza de
regulamentar as cobranças das anuidades dos Conselhos de Fiscalização
Profissional, porém caiu em descrédito e certamente terá sua
constitucionalidade negada pelo STF, pois nitidamente equivocada e
ilegal em sua origem, ao passo que sua aplicação causaria prejuízos
enormes ao Estado Democrático de Direito, burlando a Constituição
Federal e todo o ordenamento jurídico vigente.
Autor: Rui Carlos Pietschmann
Fonte: meuadvogado.com.br
Nota do Editor:
Clique no link abaixo e acesse a Lei 12.514/2011 na sua íntegra:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12514.htm
http://s.conjur.com.br/dl/oab-espirito-santo-devolver-anunidade.pdf
A tílulo elucidativo clique no link abaixo para ver
recente decisão da 6ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª
Região, que por unanimidade negou Apelação imposta pela OAB-ES contra
decisão da 5ª Vara Federal Cível de Vitória, que acolhera Mandado de Segurança
impetrado pelo Sindiadvogado-ES (Sindicato dos Advogados do Espírito Santo).
http://s.conjur.com.br/dl/oab-espirito-santo-devolver-anunidade.pdf
Professor Marcos.
ResponderExcluirGostaria de saber, com mais profundidade, sobre a obrigatoridade ou não e suas consequências sobre o pagamento ou não da taxa que o Sindicato dos Corretores cobram desses profissionais.