A diversidade e resistência à mudança são elementos frequentes no setor. Por um lado os clientes, e por outro as empresas envolvidas em um empreendimento, buscam estratégias de maximização de seus próprios benefícios de maneira fragmentada. Os resultados são conhecidos: frequentemente os empreendimentos excedem as previsões iniciais de custo, são entregues com atraso, muitas vezes com alta incidência de não-conformidades, e, ao final, não correspondem às expectativas de clientes e usuários finais. O problema merece reflexão e abre espaço para novas abordagens estratégicas, tendo em vista o novo ciclo de crescimento do setor.
Um estudo de caso de um empreendimento de incorporação imobiliária de grande porte, em que foram verificados níveis de sistematização (75%) e padronização (56%) de iniciativas da abordagem estratégica denominada custeio-meta (target costing). Os resultados sugerem potencial de aplicação na construção civil dessa abordagem originária da manufatura, e oferecem diretrizes para análise e avanço de sua disseminação no setor.
Custeio-Meta
O custeio-meta pode ser entendido como um processo de desenvolvimento de produto em situação de alta competição, que incorpora um sistema de gerenciamento estratégico de lucros (Monden, 1995). A ideia principal é primeiramente conceber um produto com um custo permissível, obtido pela diferença entre o preço de mercado, ditado por informações a partir do cliente, e o lucro almejado pela empresa (Granja, Picchi, Robert, 2005).
Em representação matemática, a abordagem sofre uma modificação sutil da Equação 1 (cost-based method ou cost-plus approach), para a representada pela Equação 2 (abordagem custeio-meta):
Equação 1
Custo de produção + Margem de lucro = Preço do produto
Equação 2
Preço de mercado – Margem de lucro = Custo-Meta
À primeira vista, as fórmulas são análogas. Entretanto, a análise do significado da Equação 1 merece atenção, e é mais importante do que a matemática envolvida. Supondo-se que o custo de produção de um produto manufaturado seja R$ 500, e que a margem de lucro desejada é R$ 50, deve-se fixar o preço do produto no mercado em R$ 550. A empresa não obterá sua margem de lucro desejada caso o preço do produto no mercado seja inferior a R$ 550. Supondo-se que o cliente se recuse a pagar R$ 550 pelo produto, ou que ele possa comprar a mesma coisa em outro lugar por R$ 500, a Equação 1 informa que se gastou R$ 500 para produzir e que não se lucraria nada vendendo-se o produto por R$ 500.
Por outro lado, a Equação 2 simboliza que, num ambiente de concorrência acirrada, o preço de mercado é determinado por um agente externo, ou seja, é o cliente que atribui sua percepção de valor justo a ser pago pelo produto. Suponha-se agora que esse valor em ambiente de concorrência seja R$ 500, e que se deseja obter uma margem de lucro de pelo menos R$ 50. Nesse caso a empresa deveria desenvolver meios para ter um custeio-meta de produção de R$ 450, utilizando, no caso, técnicas e ferramentas da EV (Engenharia de Valor). Diante dessa lógica, a essência do custeio-meta pode ser assimilada por meio da famosa frase de Taiichi Ohno: “custos existem para serem reduzidos, e não para serem calculados” (Ohno, 1982). Nesse sentido, no custeio-meta os custos passam a ser parâmetros de entrada no desenvolvimento do produto, e não apenas consequências do projeto.
Descrição do Caso Analisado
Trata-se de um projeto real de uma incorporadora brasileira. A primeira fase desse empreendimento contou com sete torres (cinco residenciais e duas comerciais), além de um centro comercial, perfazendo um total de 1.559 unidades. O projeto de aproximadamente R$ 550 milhões de VGV (Valor Geral de Vendas) foi lançado na cidade de Salvador, em junho de 2008.
Método de pesquisa
Utilizou-se como referência o fluxograma (Jacomit; Granja, 2008) que representa uma adaptação dos seis princípios apresentados pelo CAM-I (Consortium for Advanced Management – International).
As 17 etapas sugeridas foram validadas e classificadas qualitativamente de acordo com o seguinte critério:
Sistematizada - segue algum nível de organização intelectual, e é recorrente;
Padronizada – apresenta evidências de sequenciamento estruturado, com procedimentos e diretrizes formalizados.
Essa validação se deu por meio da análise de documentação e registros, condução de entrevistas do tipo focada e observação participativa.
Resultados obtidos
Das 17 etapas investigadas, uma não era passível de validação no então estágio do projeto (o produto ainda não havia sido entregue ao cliente). Dessa forma, das 16 etapas validadas, 12 (75%) foram identificadas por mais de uma fonte de evidência na totalidade dos casos. Ainda em relação ao universo validado, nove etapas (56%) apresentavam níveis de padronização. Apesar dos diversos elementos evidenciados, pode-se afirmar que os gestores não tinham consciência conceitual explícita em relação à base teórica do custeio-meta.
Conclusões
No contexto de incorporação imobiliária, onde há forte atenção ao giro de capital, verifica-se menor apelo ao investidor em considerar os custos dos componentes ao longo de suas vidas úteis. Tal situação dificulta desde a incorporação de elementos sustentáveis em edificações (green buildings), até o estabelecimento de alianças estratégicas de médio e longo prazos com parceiros de negócio. O custeio-meta adota uma postura proativa e inovadora em relação aos custos, em que o valor não é definido apenas com base no que os clientes desejam, mas também no quanto eles podem e estão dispostos a pagar. Essa abordagem pode representar uma estratégia de grande potencial para o desenvolvimento de produtos, na qual o foco do planejamento de custos migra para aqueles itens que efetivamente criam valor na perspectiva do cliente. No contexto atual de concorrência acirrada no setor, oportunidades interessantes se apresentam para o desenvolvimento de produtos imobiliários com alto valor agregado na perspectiva do cliente, a um custo, não obstante, razoável.
* A pesquisa completa pode ser obtida com os autores, bem como as referências completas dos trabalhos citados no texto (adgranja@fec.unicamp.br / diego_camargo@ymail.com).
Fonte: Construção Mercado
Um estudo de caso de um empreendimento de incorporação imobiliária de grande porte, em que foram verificados níveis de sistematização (75%) e padronização (56%) de iniciativas da abordagem estratégica denominada custeio-meta (target costing). Os resultados sugerem potencial de aplicação na construção civil dessa abordagem originária da manufatura, e oferecem diretrizes para análise e avanço de sua disseminação no setor.
Custeio-Meta
O custeio-meta pode ser entendido como um processo de desenvolvimento de produto em situação de alta competição, que incorpora um sistema de gerenciamento estratégico de lucros (Monden, 1995). A ideia principal é primeiramente conceber um produto com um custo permissível, obtido pela diferença entre o preço de mercado, ditado por informações a partir do cliente, e o lucro almejado pela empresa (Granja, Picchi, Robert, 2005).
Em representação matemática, a abordagem sofre uma modificação sutil da Equação 1 (cost-based method ou cost-plus approach), para a representada pela Equação 2 (abordagem custeio-meta):
Equação 1
Custo de produção + Margem de lucro = Preço do produto
Equação 2
Preço de mercado – Margem de lucro = Custo-Meta
À primeira vista, as fórmulas são análogas. Entretanto, a análise do significado da Equação 1 merece atenção, e é mais importante do que a matemática envolvida. Supondo-se que o custo de produção de um produto manufaturado seja R$ 500, e que a margem de lucro desejada é R$ 50, deve-se fixar o preço do produto no mercado em R$ 550. A empresa não obterá sua margem de lucro desejada caso o preço do produto no mercado seja inferior a R$ 550. Supondo-se que o cliente se recuse a pagar R$ 550 pelo produto, ou que ele possa comprar a mesma coisa em outro lugar por R$ 500, a Equação 1 informa que se gastou R$ 500 para produzir e que não se lucraria nada vendendo-se o produto por R$ 500.
Por outro lado, a Equação 2 simboliza que, num ambiente de concorrência acirrada, o preço de mercado é determinado por um agente externo, ou seja, é o cliente que atribui sua percepção de valor justo a ser pago pelo produto. Suponha-se agora que esse valor em ambiente de concorrência seja R$ 500, e que se deseja obter uma margem de lucro de pelo menos R$ 50. Nesse caso a empresa deveria desenvolver meios para ter um custeio-meta de produção de R$ 450, utilizando, no caso, técnicas e ferramentas da EV (Engenharia de Valor). Diante dessa lógica, a essência do custeio-meta pode ser assimilada por meio da famosa frase de Taiichi Ohno: “custos existem para serem reduzidos, e não para serem calculados” (Ohno, 1982). Nesse sentido, no custeio-meta os custos passam a ser parâmetros de entrada no desenvolvimento do produto, e não apenas consequências do projeto.
Descrição do Caso Analisado
Trata-se de um projeto real de uma incorporadora brasileira. A primeira fase desse empreendimento contou com sete torres (cinco residenciais e duas comerciais), além de um centro comercial, perfazendo um total de 1.559 unidades. O projeto de aproximadamente R$ 550 milhões de VGV (Valor Geral de Vendas) foi lançado na cidade de Salvador, em junho de 2008.
Método de pesquisa
Utilizou-se como referência o fluxograma (Jacomit; Granja, 2008) que representa uma adaptação dos seis princípios apresentados pelo CAM-I (Consortium for Advanced Management – International).
As 17 etapas sugeridas foram validadas e classificadas qualitativamente de acordo com o seguinte critério:
Sistematizada - segue algum nível de organização intelectual, e é recorrente;
Padronizada – apresenta evidências de sequenciamento estruturado, com procedimentos e diretrizes formalizados.
Essa validação se deu por meio da análise de documentação e registros, condução de entrevistas do tipo focada e observação participativa.
Resultados obtidos
Das 17 etapas investigadas, uma não era passível de validação no então estágio do projeto (o produto ainda não havia sido entregue ao cliente). Dessa forma, das 16 etapas validadas, 12 (75%) foram identificadas por mais de uma fonte de evidência na totalidade dos casos. Ainda em relação ao universo validado, nove etapas (56%) apresentavam níveis de padronização. Apesar dos diversos elementos evidenciados, pode-se afirmar que os gestores não tinham consciência conceitual explícita em relação à base teórica do custeio-meta.
Conclusões
No contexto de incorporação imobiliária, onde há forte atenção ao giro de capital, verifica-se menor apelo ao investidor em considerar os custos dos componentes ao longo de suas vidas úteis. Tal situação dificulta desde a incorporação de elementos sustentáveis em edificações (green buildings), até o estabelecimento de alianças estratégicas de médio e longo prazos com parceiros de negócio. O custeio-meta adota uma postura proativa e inovadora em relação aos custos, em que o valor não é definido apenas com base no que os clientes desejam, mas também no quanto eles podem e estão dispostos a pagar. Essa abordagem pode representar uma estratégia de grande potencial para o desenvolvimento de produtos, na qual o foco do planejamento de custos migra para aqueles itens que efetivamente criam valor na perspectiva do cliente. No contexto atual de concorrência acirrada no setor, oportunidades interessantes se apresentam para o desenvolvimento de produtos imobiliários com alto valor agregado na perspectiva do cliente, a um custo, não obstante, razoável.
* A pesquisa completa pode ser obtida com os autores, bem como as referências completas dos trabalhos citados no texto (adgranja@fec.unicamp.br / diego_camargo@ymail.com).
Fonte: Construção Mercado
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