Nos últimos meses o mercado imobiliário apresentou um resultado abaixo das expectativas como efeito da crise política e econômica pela qual passa o país. Como consequência natural desses resultados, os investimentos na construção civil foram minando para outros setores, impactando diretamente o fluxo de caixa das empresas do ramo que, como alternativa para se capitalizarem, viram-se forçadas a reduzir o valor das unidades imobiliárias em estoque com o objetivo de acelerar a velocidade de venda e, desse modo, repor o próprio caixa.
Se por um lado esse fato tornou-se um estímulo para aqueles que enxergam esse momento crítico como uma oportunidade única, no qual podem adquirir um imóvel recém construído por um valor abaixo do valor de mercado, por outro lado alguns adquirentes de imóveis em construção estão preocupados em não ter o imóvel adquirido concluído diante da escassez de recursos das construtoras.
Esse medo tem fundamento porque, em um cenário de crise, não são raras as empresas que, sem capital, são obrigadas a interrupção das atividades comerciais e, com isso, ao descumprimento dos contratos celebrados com seus consumidores, sem ressarcir os prejuízos causados.
No entanto, é preciso frisar que nem tudo estará perdido caso ocorra a hipótese de a construtora falir antes de realizar a entrega das chaves do imóvel. Isso porque, o adquirente de um imóvel na planta possui um sistema de proteção legal que mitiga esses riscos do negócio, qual seja: a Lei de Incorporações Imobiliárias e o Código de Defesa do Consumidor. Podendo o adquirente de um imóvel na planta optar entre os caminhos oferecidos por essas leis caso essa hipótese se torne realidade.
Nesse sentido, a Lei de Incorporações (Lei nº 4.591/64) possui mecanismos que permitem aos adquirentes de unidades imobiliárias em construção maior gerência sobre a execução da obra e, em determinados casos, permite até mesmo destituir o incorporador, que é o responsável pelo desenvolvimento do empreendimento.
Com essa finalidade, por exemplo, podemos citar o artigo 50 da Lei de Incorporações que, sob o escopo de possibilitar o efetivo exercício de fiscalização e, em sendo o caso, da administração da obra pelos adquirentes, prevê a instituição da figura da comissão de representantes de adquirentes de unidades imobiliárias.
A comissão de representantes possui o importante papel de acompanhar a execução do contrato de incorporação e construção, sendo o instrumento de que os adquirentes dispõem para fiscalizar a arrecadação das contribuições e a aplicação dos recursos na construção do empreendimento, podendo adotar as medidas que julgar necessárias para a conclusão do empreendimento e outorga das escrituras dos imóveis.
A possibilidade de destituição do incorporador e a assunção da obra pelos adquirentes de imóveis na planta, por sua vez, encontra-se regulada pelo inciso VI do artigo 43 e pelos parágrafos 2º e 1º do artigo 31-F da citada lei.
O inciso VI do artigo 43 da Lei de Incorporações estipula que, se o incorporador paralisar as obras por mais de 30 (trinta) dias sem justa causa, ou retardar excessivamente o andamento das obras, os adquirentes de unidades imobiliárias poderão promover sua notificação judicial para que dê seguimento às obras.
Caso não seja atendida a notificação judicial pelo incorporador, será facultado aos adquirentes optarem pela sua destituição, decidindo em assembleia geral sobre o prosseguimento da obra por conta própria ou não.
Os parágrafos 2º e 1º do artigo 31-F da citada lei, a seu tempo, trazem a possibilidade de prosseguimento das obras do empreendimento pelos adquirentes das unidades imobiliárias diante da insolvência ou falência do incorporador.
Com base nesses fundamentos legais é que muitos empreendimentos inacabados tiveram suas obras assumidas e concluídas pelos próprios adquirentes das unidades imobiliárias dos empreendimentos.
Relembre-se, por oportuno, a falência da construtora Encol, ocorrida no ano de 1999. Estima-se que com a sua falência foram deixadas mais de 710 obras inacabadas, lesando 42.000 adquirentes de imóveis na planta.
A lembrança do caso Encol certamente tira o sono de qualquer um que tenha adquirido um imóvel na planta e que ainda não tenha recebido as chaves da construtora, seja pela vigência do prazo de conclusão das obras ou por atraso na conclusão das obras.
Contudo, o próprio caso Encol é um exemplo de que apesar das dificuldades envolvidas na superveniência da falência de uma construtora nem tudo estará perdido. De fato, são muitos os exemplos de empreendimentos iniciados pela Encol que foram concluídos pelos seus adquirentes, que assumiram a administração da obra.
A opção por prosseguir com a obra até a conclusão do empreendimento deverá levar em consideração uma série de fatores, tais como: o estágio atual da obra, o custo estimado para a conclusão do empreendimento e a propriedade do terreno do empreendimento. Esses fatores deverão ser analisados pelos adquirentes das unidades do empreendimento e especialistas da área imobiliária, que irão pontuar sobre a viabilidade da retomada das obras.
No que diz respeito a hipótese de os adquirentes das unidades imobiliárias decidirem em assembleia pelo não prosseguimento da obra, alternativa existente é a de buscarem indenizações pelos danos decorrentes do descumprimento do contrato celebrado, na forma do sistema de proteção ao consumidor, pleiteando judicialmente o ressarcimento pelos valores pagos e pela compensação pelos danos ocasionados.
Nesse caso, ao optarem pelo caminho do ressarcimento dos valores pagos e pela compensação dos danos sofridos com a interveniência do Poder Judiciário, deverão ter em mente que, em virtude da falência, mesmo sendo a construtora, ou, a incorporadora, condenada pelo Poder Judiciário a restituição dos valores pagos na aquisição do imóvel, não há garantia de que serão indenizados.
Portanto, se a construtora decretar falência antes da conclusão das obras do empreendimento os adquirentes poderão optar entre a assunção das obras do empreendimento, ou, pela compensação dos danos sofridos em decorrência do descumprimento do contrato perante o Poder Judiciário. Analisando, caso a caso, os prós e os contras da questão.
É de se concluir, por fim, que o adquirente de um imóvel na planta não está abandonado a própria sorte, dispondo de meios legais para agir e mitigar o prejuízo nas hipóteses de paralisação, atraso injustificado das obras do empreendimento, escassez de recursos financeiros ou falência do incorporador.
Artur Angelo Ferraz Guarnieri - Advogado especializado em Direito Civil e Criminal
Fonte: Artigos JusBrasil
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