quarta-feira, 4 de maio de 2016

DA COBRANÇA DE MULTA RESCISÓRIA SOBRE O VALOR TOTAL DO IMÓVEL


Temos observado como prática do mercado imobiliário, que algumas construtoras em hipóteses de rescisão contratual provocada pelos adquirentes, realizam a cobrança de multa rescisória em percentual sobre o valor total do imóvel comercializado e não sobre o valor efetivamente pago até o momento da rescisão contratual. Tal prática pode se tornar abusiva e extrapolar a legalidade, expondo o comprador em alguns casos a perda total dos valores pagos e ultrapassando os gastos e custos reais assumidos pelas construtoras com o negócio, podendo até mesmo caracterizar o enriquecimento ilícito da construtora em face do adquirente.

Deve ser assinalado que a relação havida no contrato de compra e venda de unidade imobiliária efetuada diretamente com construtora, qualifica-se como relação de consumo, assim a novel legislação civil impõe ao Juiz a obrigação de reduzir a cláusula penal se aferido que é manifestamente excessiva, conforme disposto no artigo 413 do Código Civil, cuja literalidade é a seguinte:

“Art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.”

Nesta seara rescindida a promessa de compra e venda, resultando na recuperação dos direitos derivados da unidade imobiliária pela construtora, a manutenção da cláusula penal com lastro em percentual do valor do instrumento contratual atualizado, caracteriza-se como injusta, pois desequilibra o contrato, deixa o adquirente em condição de inferioridade em relação à construtora, desequilibrando a equação contratual e desprezando, em suma, o princípio que está impregnado no arcabouço normativo brasileiro que assegura a igualdade de tratamento aos contratantes e, repugna o enriquecimento ilícito.

Além disto, a cláusula que estipula a retenção de percentual do valor atualizado do instrumento contratual, não condiz com o prescrito pelo Código de Defesa do Consumidor, que, além de reputar como nula de pleno direito considera abusiva a cláusula que restringe direito inerente à natureza do contrato, ou que possa redundar em desequilíbrio contratual e se afigurar excessivamente onerosa para o consumidor (artigo 51, IV e parágrafo 1º, II e III do CDC).

Desta forma, a cláusula penal deve restringir-se a percentual sobre o valor efetivamente pago, conforme a pacífica jurisprudência do nosso Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás:

Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel, por culpa de quaisquer contratantes, deve ocorrer à imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador, visto que tal medida mostra-se decorrente da própria rescisão contratual, deduzindo-se 8% do valor a ser restituído para fazer face às despesas geradas com a realização do negócio. (TJGO, APELACAO CIVEL 423906-52.2012.8.09.0051, Rel. DR (A). SERGIO MENDONCA DE ARAUJO, 4A CÂMARA CIVEL, julgado em 10/04/2014, DJe 1528 de 24/04/2014).”

Nesta linha infere-se que a disposição contratual que estabelece retenção de percentual sobre o valor total do contrato em caso de rescisão deste, sujeita o consumidor à condição abusiva e iníqua, pois estabelecida ao exclusivo critério e benefício da construtora, tornando-se desprovida de eficácia e legitimidade ante a circunstância de que coloca o comprador em franca desvantagem em relação ao vendedor.

Bruno Cesar Pio Curado - OAB/GO 29.659
Fonte: Artigos JusBrasil

Nenhum comentário:

Postar um comentário