quinta-feira, 2 de junho de 2016

PRESCRIÇÃO DE DÉBITO CONDOMINIAL DEVE SER DE 10 ANOS


Questão controversa desde a entrada em vigor do Código Civil de 2002 gira em torno do prazo prescricional das cotas condominiais, se de cinco ou de dez anos. A celeuma se instalou em razão de omissão e da falta de precisão do legislador ordinário acerca do tema. Isto porque, enquanto o artigo 205 caput do Código Civil determina que a prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não haja fixado prazo menor, o artigo 206, §5º, inciso I, da mesma lei fixa a prescrição quinquenária para a pretensão de cobrança de dívidas líquidas, constantes de instrumento público ou particular.

Com isso, há os que defendem a prescrição decenal das cotas condominiais em razão da lei não preceituar prazo menor para a prescrição de dívidas desta natureza, enquanto outros advogam pela prescrição quinquenária dos débitos de natureza condominial, já que dívidas dessa natureza se enquadrariam nos requisitos do artigo 206, §5º, inciso I do Código Civil, ou seja, são dívidas líquidas e constantes de instrumento particular.

A divergência é tão reiterada nos tribunais do país e, por consequência, no Superior Tribunal de Justiça, que foi submetido, pelo ministro Luis Felipe Salomão, à 2ª Seção do STJ o julgamento de um recurso na sistemática dos repetitivos, onde se decidirá, de uma vez por todas, o prazo prescricional das cotas condominiais.

Embora o STJ tenha mantido, durante anos, o entendimento de que as cotas condominiais prescrevem em cinco anos, em razão de, no seu entendimento, as dívidas desta natureza se encaixarem aos requisitos do artigo 206, §5º, inciso I do Código Civil, fundamentos não faltam para que a corte decida, em definitivo, que esse prazo para dívidas dessa natureza é de dez anos.

Isto porque, além de o prazo prescricional das despesas condominiais não se amoldarem às situações específicas tratadas no artigo 206 do Código Civil, não foi atribuído a este tema tratamento especial seja pelo próprio Código Civil, seja pela Lei 4.591/64, que rege os condomínios edilícios.

Ou seja, se não há na legislação ordinária previsão expressa acerca do prazo prescricional das cotas condominiais, e a obrigação de pagá-las não se acomoda nos requisitos estipulados peça artigo 206, §5º, inciso I do CC/2002, é inegável que o referido prazo é de dez anos, em observância ao positivado no artigo 205 do CC/2002.

Além dos fundamentos acima, que, por si só, garantem a aplicação do prazo decenal para as cotas condominiais, tem-se que, nos exatos termos do artigo 1.336, inciso I do Código Civil, a obrigação de pagar essas despesas decorre da lei e não de instrumento público ou particular, obrigando o titular da unidade imobiliária ao pagamento de contribuição condominial justamente pelo fato ostentar esta condição, em conformidade com o Princípio da Solidariedade, que, sobretudo, norteia a vida em condomínio.

Então, não pode o artigo 206, parágrafo 5º, inciso I, do Código Civil ser aplicável às cotas, mormente pelo fato de ser a convenção de condomínio tão somente um documento que regula a cobrança das prestações devidas pelos condôminos, e não instrumento de fonte da obrigação.

A esse respeito, é importante deixar claro o fato de que o nascimento da relação obrigacional decorrente da propriedade de uma unidade imobiliária que integre um condomínio edilício não se dá pela convenção deste, que apenas regulamenta tal obrigação. A obrigação de pagamento de cotas tem natureza “propter rem”, o que significa que seu nascimento se dá em razão da relação jurídica existente entre uma pessoa e um determinado bem, relação de propriedade, sendo certo que a obrigação, nesses casos, acompanha o bem imóvel, independentemente da sua titularidade.

Evidente que sendo o pagamento de despesa condominial uma obrigação propter rem (própria da coisa), esta não tem correspondência com a dívida líquida constante de instrumento público ou particular, justamente porque tais instrumentos não são a fonte da obrigação condominial.

Esclareça-se que ainda que a convenção condominial instrumentalize a obrigação de cooperar com o pagamento das despesas de manutenção das partes comuns nos condomínios edilícios, como corriqueiramente ocorre, é certo que esse instrumento não é a fonte de tal obrigação.

Ainda assim, não bastassem todos os argumentos acima, é certo que a adoção de entendimento diverso se consubstanciaria em uma flagrante premiação para os condôminos inadimplentes, em detrimento do direito da coletividade que compõe o condomínio e, por consequência, do Princípio Constitucional da Solidariedade, que norteia a vida nessa modalidade de organização.

Por outro lado, o prazo de prescrição decenal, além de ser o previsto em lei, é o mais benéfico à coletividade, já que, em caso de inadimplemento, serão os moradores que integram o condomínio edilício, pares do inadimplente, que eventualmente serão prejudicados pela prescrição das dívidas no exíguo prazo de cinco anos, período que, muitas vezes, é utilizado pelo condomínio na tentativa de solucionar a questão extrajudicialmente, mormente quando as cotas não montam cifras elevadas.

Dessa forma, o resultado do julgamento a ser enfrentado pelo Superior Tribunal de Justiça quando da análise do Recurso Especial 1.783.930, que está sob a sistemática dos recursos repetitivos, terá um enorme impacto para os condomínios, já que há grande quantidade de ações tramitando em que se discute a prescrição das cotas condominiais, além de que encerrará recorrente controvérsia que já se arrasta há muito nos tribunais do país.

Espera-se que o Superior Tribunal de Justiça interprete sistematicamente os mencionados artigos em choque do Código Civil para determinar a aplicação do artigo 205 caput às dívidas de natureza condominial, garantindo, assim, o prazo prescricional de dez anos aos débitos dessa natureza, em homenagem ao Princípio Constitucional da Solidariedade e mitigando os prejuízos dos condôminos adimplentes com suas obrigações, já que eventuais débitos sempre recaem sobre os adimplentes com suas obrigações decorrentes da propriedade.

Thiago Nicolay - Advogado e especialista em Direito Imobiliário.
Fonte: Revista Consultor Jurídico

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