sábado, 27 de setembro de 2014

RENOVAÇÃO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO: UM DIREITO À DISPOSIÇÃO DO EMPRESÁRIO ASSÍDUO NO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES LOCATÍCIAS


Com a ascendente valorização do mercado imobiliário – e não seria demais dizer em “progressão geométrica” – torna-se cada vez mais dispendioso o início de uma atividade empresária. A carga Tributária, despesas trabalhistas e previdenciárias, aquisição inicial de produtos/serviços aliada à aquisição de um local para o início da atividade fazem do investimento inicial algo assustador, com de fato o é.

Fundamentado em um plano de negócio bem elaborado, quase sempre se demonstra a inviabilidade do negócio – entenda-se pelo alto investimento inicial – em caso de compra de um imóvel logo no início da atividade, o que torna recorrente a escolha pelos empresários ao instituto da locação.

Este instituto reduz os custos iniciais, possibilita a previsão mensal de gastos, além de assegurar ao empresário o exercício da sua atividade por um período mínimo de tempo, ante a previsão artigo 4º da Lei do Inquilinato pela qual o locador não pode reaver o imóvel locado, salvo por descumprimento contratual por parte do locatário.

Pois bem. O legislador da lei do inquilinato, acompanhando o desenvolvimento do direito empresarial, percebeu a imprescindibilidade de se proteger o ponto comercial. Este (ponto comercial) compreende o local específico em que ele (estabelecimento empresarial) se encontra. Em função do ramo de atividade explorado pelo empresário, a localização do estabelecimento empresarial pode importar acréscimo, por vezes substantivo, no seu valor.¹

Ou seja, observou-se a relevância que o local do exercício da atividade empresária é para a empresa, para sua clientela e aviamento, sendo fator inarredável e determinante para o sucesso empresarial.

Com esta constatação ímpar do direito empresarial a Lei de Locações de Imóveis Urbanos (Lei nº 8.245/91), ao regular a locação não-residencial, previu no primeiro artigo da Seção III (artigo 51) o direito à renovação compulsória do contrato de locação não residencial.

Importante destacar a palavra “compulsória” tendo em vista que este direito – renovação do contrato – independe da vontade do locador. Assim, caso o locatário cumpra os requisitos previstos em lei, haverá uma relativização do direito do proprietário de usar, gozar, dispor e usufruir do seu imóvel em detrimento da atividade empresária e proteção do ponto comercial exercida naquele imóvel.

Reza o referido dispositivo:

Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente:

I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado;

II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos seja de cinco anos;

III - o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos.

Neste se encontram os requisitos objetivos impostos pela Lei de Locações para que a empresa signatária de contrato de locação para o exercício das suas atividades possua o direito de renová-lo independentemente da vontade do proprietário, destaca-se novamente. Ou seja, é necessário que o contrato de locação tenha sido celebrado por escrito, com prazo mínimo de 5 (cinco) anos, mas sempre com prazo determinado, cuja atividade empresária esteja sendo exercida há mais de 3 (três) anos. O atendimento à estes pressupostos é indispensável ao direito à renovação.

O requisito previsto no inciso III deixa evidente que o legislador da Lei do Inquilinato acolheu a observância do Direito Empresarial de que o ponto comercial é extremamente importante, fixando o prazo mínimo de 3 (três) anos de exercício de atividade empresarial como sendo aquele protegido legalmente. Ou seja, esta exploração trienal é o tempo mínimo para a valorização do ponto comercial e, consequentemente, assegurá-lo de proteção legal.

Tutela-se, em conclusão, o valor agregado ao estabelecimento pelo uso de um mesmo ponto durante certo lapso temporal – também chamada de tutela de inerência no ponto – amparando o interesse do empresário de permanecer com sua atividade exatamente no imóvel locado.

O artigo 51 acima transcrito deve ser observado em conjunto ao artigo 71 da mesma lei, que diz:

Art. 71. Além dos demais requisitos exigidos no art. 282 do Código de Processo Civil, a petição inicial da ação renovatória deverá ser instruída com:

I - prova do preenchimento dos requisitos dos incisos I, II e III do art. 51;

II - prova do exato cumprimento do contrato em curso;

III - prova da quitação dos impostos e taxas que incidiram sobre o imóvel e cujo pagamento lhe incumbia;

IV - indicação clara e precisa das condições oferecidas para a renovação da locação;

V – indicação do fiador quando houver no contrato a renovar e, quando não for o mesmo, com indicação do nome ou denominação completa, número de sua inscrição no Ministério da Fazenda, endereço e, tratando-se de pessoa natural, a nacionalidade, o estado civil, a profissão e o número da carteira de identidade, comprovando, desde logo, mesmo que não haja alteração do fiador, a atual idoneidade financeira;

VI - prova de que o fiador do contrato ou o que o substituir na renovação aceita os encargos da fiança, autorizado por seu cônjuge, se casado for;

VII - prova, quando for o caso, de ser cessionário ou sucessor, em virtude de título oponível ao proprietário.

E não demanda uma análise com afinco das normas legais (requisitos) acima transcritas para que se perceba que este direito à renovação do contrato está umbilicalmente atrelado ao cumprimento das obrigações contratuais, acaso superados os requisitos previstos no artigo 51.

Isto porque na interposição da Ação Renovatória de Locação é necessário que o locatário faça prova do exato cumprimento do contrato em curso. Os demais requisitos previstos dependem do cumprimento das obrigações contratuais. Não se trata de simplesmente atingir o termo final da locação. É imprescindível que o empresário tenha sido diligente, assíduo e pontual no cumprimento das obrigações assumidas contratualmente.

Em face disto evidencia-se a proteção legal àquele empresário que cumpre fielmente o proposto perante o locador. Ora, seria no mínimo incongruente a lei obrigar o proprietário de um imóvel locado a renovar eventual contrato de locação cujo locatário, p. ex., tenha sempre realizado o pagamento dos alugueis com atraso durante o prazo locatício, não formalizou seguro de incêndio, etc.

Fazer prova do exato cumprimento do contrato traduz-se no adimplemento atempado de todas as obrigações assumidas, sejam pecuniárias ou não. Não há suporte legal para o locatário/empresário inadimplente.

Somente existem restritas hipóteses, as quais também estão previstas em lei que podem elidir o direito do locatário à renovação compulsória do contrato. São elas: realização de obras determinadas pelo poder público ou pelo próprio locador que importem em alteração radical do imóvel, no primeiro caso, ou que aumente o valor do negócio ou da propriedade, no segundo; utilização pelo próprio locador ou transferência de comércio cujo é detentor da maioria do capital social, ou também seu cônjuge, ascendente e descendente; o valor do novo aluguel proposto pelo locatário não estar conforme valor de mercado; ou o locador ter proposta formal de terceiro em condições melhores.

Portanto, somente nestas hipóteses o locador não será obrigado a renovar o contrato de locação. Fora elas, o contrato será renovado e o empresário poderá permanecer utilizando o imóvel para o exercício das suas atividades.

É importante salientar, ainda, que a renovação não será no exclusivo interesse do locatário ou nas mesmas condições anteriormente pactuadas. Ao interpor a ação renovatória é necessário que a empresa apresente uma proposta com as novas condições de locação, em especial o valor locativo real do imóvel à época da renovação, as garantias contratuais e o prazo da locação – que não poderá ser superior ao prazo do contrato a ser renovado.

Em arremate, a Lei de Locações de Imóveis Urbanos, por intermédio do artigo 45, reconhece como nula de pleno direito eventual cláusula prevista em contrato de locação que afaste o direito à renovação do contrato. Ou seja, ainda que haja no contrato eventual renúncia ou impossibilidade de renovação do contrato de locação, este direito é assegurado, visto ser esta cláusula nula de pleno direito.

Sendo assim, em congratulações ao legislador da Lei do Inquilinato pela observância da necessidade de proteção ao ponto comercial, é forçoso concluir que o empresário fiel ao adimplemento das suas obrigações contratuais poderá assegurar o exercício de suas atividades por um período assecuratório da manutenção do sucesso empresarial

¹COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa. 23ª, Ed. – São Paulo: Saraiva, 2011. Pág. 83

Frederico Rodrigues de SantanaPós Graduando em Direito Imobiliário pela Escola Superior de Direito de São Paulo; Advogado do escritório Dayrell, Rodrigues & Advogados Associados.
Fonte: Revista Jus Navigandi

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