quarta-feira, 12 de novembro de 2014

REQUISITOS E ELEMENTOS ESSENCIAIS DA USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA


A usucapião especial urbana se distingue das demais modalidades principalmente por ter determinado um prazo consideravelmente inferior comparado com as outras espécies, sendo esse de cinco anos contínuos e sem oposição.

É evidente que os imóveis urbanos sempre foram passíveis de serem usucapidos por meio das modalidades ordinária e extraordinária, com prazos maiores e sem especificações. Não obstante, o usucapião especial urbano surgiu para especificar essa parte do regime, alcançando o possuidor que não tem moradia e nem outro imóvel.

Após destaque na Lei Maior referente ao princípio de que a propriedade está subordinada a cumprir a função social, o legislador passou a se preocupar com as áreas urbanas inutilizadas, aquelas que esperam futura valorização, enquanto há uma grande massa de pessoas sem moradia e sem lugar para se instalarem. A solução para esse problema foi o usucapião especial urbano, conhecido também como usucapião de solo urbano, usucapião pro morare, pro casa ou pro moradia.

O usucapião urbano, nas lições do nobre Des. Rui Geraldo Camargo Viana, teria por escopo dar oportunidade de acesso a propriedade urbana e, conseqüentemente, moradia a essa camada desfavorecida da população das grandes cidades, que está obrigada a se manter em uma posição de ilegalidade, clandestinidade e precariedade habitacional.

É considerado razoável e oportuno que, o proprietário de um terreno que busca somente o acúmulo de capital, sem lhe dar um aproveitamento e ignorando a função social da propriedade, sem nem mesmo tomar conhecimento do que se passa nele, perca o seu domínio para alguém que até então não tinha nem condições de se abrigar.

A) Legitimidade

A finalidade da usucapião especial urbana é garantir moradia ao possuidor e sua família. A vista disso, possuidor como pessoa física é quem ostenta legitimidade para usucapir. No mesmo sentido, de acordo com a letra da lei em seu art. 183 da Constituição Federal, “Aquele que possuir” será o beneficiário da aquisição da propriedade pela usucapião urbana.

Vale lembrar que, já destacado nos artigos da lei, o possuidor não pode ser proprietário de outro imóvel, tanto urbano ou rural.

O brasileiro nato e naturalizado podem se valer da usucapião urbana especial, e quanto ao estrangeiro, há uma restrição exigindo que tenha residência no país para ter acesso a esse direito.

A pessoa jurídica não tem legitimidade para se valer dessa prescrição aquisitiva, devido a lei exigir que o imóvel seja utilizado para moradia própria ou de família, não alcançando portanto a pessoa jurídica.

Em se tratando da capacidade civil demandada do possuidor para usucapir, deve ser observado o Art. 1 do Código Civil, trazendo que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.

A obtenção da propriedade por meio desse instituto permite ao possuidor dispor do bem como melhor entender, não precisando limitar-se somente a moradia, estando livre para vender, doar ou até mesmo permutar o bem. O legislador, visando cobrir todos os espaços e não dar margem a falhas, previu no parágrafo 2 do art. 183 da Constituição Federal que o usucapião urbano “não será reconhecido ao possuidor mais de uma vez”, impedindo que tentassem transformar o instituto em negócio com fins exclusivamente lucrativos.

Porém, o uso do imóvel por terceiros, a titulo de locação residencial ou comodato, desvia sua finalidade destacada pela Carta Magna, não autorizando dessa forma a usucapião urbana.

Tal limitação se aplica somente para o usucapião especial urbano, portanto, é possível que o possuidor adquira outra propriedade por meio de outra modalidade de usucapião.

B) Área usucapível

A extensão disposta pelo art. 183 da Carta Maior da área de 250m² representa o tamanho máximo permitido para se usucapir por meio dessa modalidade especial, sendo tido como suficiente para a moradia do possuidor ou de sua família.

A questão enfrentou controvérsias em relação ao critério de contagem da medida, se havia ou não distinção entre o solo urbano ou da construção da área usucapienda. Prevaleceu o entendimento de que não pode ser ultrapassado o limite de 250m², seja para a área do solo, seja para a área construída, devendo se valer da que for maior, dentro da limitação.

Celso Bastos, lecionando sobre o material, ressalta que a inteligência correta dos limites usucapíveis com fundamento nesse preceito é de que o imóvel não poderá ter mais que 250m², seja de terreno, seja de área construída.

Em se tratando de apartamentos cuja fração do solo e mínima, deve ser considerada a área da unidade autônoma, afastado da contagem a área comum.

A propriedade com área superior ao parâmetro constitucional já foi objeto de discussão entre juristas, acompanhado da questão se seria possível limitar o pedido para se adequar a área proposta pelo instituto. O entendimento por uma das correntes acredita que não será passível de usucapião a propriedade com área superior aos 250m², salvo se for possível a redução possessória aos limites fixados pela Lei Maior, contanto que seja possível ser perfeitamente delimitada e sua dimensão não exceda o espaço de 250m². A outra corrente, que defende a impossibilidade absoluta de limitar o pedido para adequar a área permitida para usucapir de forma especial, acredita que o proprietário com imóvel maior que 250m² prevê que para usucapir seu terreno, precisaria transcorrer o prazo de quinze anos que correspondem a usucapião extraordinária, portanto, confiante de que a lei o protege, poderia ser considerado desleal deixar que seu imóvel fosse usucapido pela modalidade especial, seria como um golpe inesperado, atingindo o dono do imóvel desprevenido.

A Lei Maior decreta que aquele que possuir imóvel em área urbana até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-se para sua moradia ou de sua família, adquirar-lhe-a o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. A interpretação do dispositivo não resta dúvidas de que foi determinado apenas um limite máximo da área, não existindo qualquer limite mínimo.

C) Posse e Animus Domini

A posse assume um papel fundamental para esse tipo de usucapião. Observados os preceitos do dispositivo constitucional, percebe-se que a posse deve ser revestida de animus domini, qualificada como ininterrupta e sem oposição, sendo exercida de forma direta e pessoal, mansa e pacífica.

No quadro da usucapião especial urbana, exige-se também do possuidor a utilização da área para sua moradia (posse pro habitatio) ou de sua família, não sendo contabilizado o tempo de seu antecessor na moradia, o que significaria reduzir o prazo prescricional para o novo possuidor. Não obstante, é permitido que quando o sucessor fizer parte da família que habita o imóvel para residência, e em momento posterior, os membros se dispersarem antes de completado o lapso quinquenal, é possível que ele de continuidade ao vínculo.

O animus domini corresponde a posse com a ideia ou convicção de proprietário, ou seja, a posse com a intenção de ser dono da coisa. O termo foi originado dos romanos, na expressão possessio cum animo domini.

Esta implícito na expressão “como sua”, que se encontra nas exigências legais de que o possuidor deve “possuir como sua” área urbana, “por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição…”.

Fica percebido também que a lei não exige título ou boa fé nessa espécie, elementos que não refletem no animus domini.

D) Lapso temporal

A lei fixou em cinco anos o prazo para o possuidor adquirir área urbana para sua moradia ou de sua família, sem interrupções. Tanto a doutrina como a jurisprudência entende que se o usucapiente vier a sofrer qualquer interdito possessório, chegando a perder o corpus do objeto, ainda assim não será descaracterizada a posse para efeitos da usucapião, mesmo que venha a ser praticada pelo proprietário, que deverá retomá-la por meios lícitos.

Alguns dos motivos que nortearam o legislador para fixar o prazo de cinco anos estão entre a facilidade de locomoção e comunicação para o verdadeiro proprietário, o agravamento da situação habitacional de nossas cidades, com urgência de soluções, o desinteresse do proprietário em edificar, conservar, ou vigiar o seu imóvel, e ainda a necessidade de adaptar a propriedade a sua função social. Acerca dessas razões, foi tido como razoável o prazo de cinco anos para usucapir por meio dessa modalidade.

A usucapião urbana e instituto novo no ordenamento jurídico, iniciado com a Constituição Federal de 5 de outubro de 1988, não tendo vínculo direto com as outras formas usucapiatórias anteriores existentes (usucapiões ordinária e extraordinária). Ao aparecer no ordenamento jurídico, logo surgirá dissidio na doutrina e jurisprudência no que se refere a aplicação desse novo instituto nas prescrições aquisitivas que estavam em curso no momento em que entrou em vigor.

Foi consolidado o entendimento então que a usucapião especial urbana e direito novo, portanto, não deve incidir sobre as prescrições em curso no momento da entrada em vigor da Constituição de 1988. Observado que a aplicação de tempo pretérito causaria prejuízo e surpresa ao proprietário que estivesse atento a maiores prazos prescricionais, passaria a ser um “golpe baixo” se na entrada do novo instituto já fosse válido sua aplicação nas prescrições aquisitivas em curso, que não ocorreu para preservar o proprietário impedindo-o de ser pego desprevenido.

E) Dispensa de justo titulo e boa fé

Na modalidade em questão, os requisitos da boa fé e justo titulo do usucapiente que são indispensáveis na usucapião tradicional de menor prazo, passaram a ser dispensáveis na usucapião especial urbana.

Na visão do ilustre Des. Rui Camargo Viana, a dispensa da exigência de boa fé e curial, quando se vê que, pressionados pela miséria e pelo desespero, tais ocupantes agem, reiteradamente, sem cogitação de outro titulo que não o inato direito de edificar o seu teto.

Compreende-se, portanto que a ausência desses requisitos se justifica pela necessidade do usucapiente de sobreviver.

Sendo assim, em resumo, o justo titulo é dispensado, e a boa fé, desnecessária.

Referências Bibliográficas

DINIZ, Maria Helena – Curso de Direito Civil Brasileiro 4. Direito das Coisas – 26a edição – São Paulo – Saraiva – 2011

NASCIMENTO, Tupinamba Miguel Castro do – Usucapião – Rio de Janeiro – Aide – 1992

PEREIRA, Caio Mario da Silva – Instituições de Direito Civil, Volume IV, Direitos reais – 21a edição – Rio de Janeiro – Forense – 2012

RIBEIRO, Benedito Silvério – Tratado de Usucapião -7a edição – Volumes 1 e 2 – São Paulo – Editora Saraiva – 2010

SALLES, Jose Carlos de Moraes – Usucapião de bens imóveis e moveis – 7a edição – São Paulo – Revista dos Tribunais – 2010

SANTOS, Ozéias – Ação de Usucapião – São Paulo – Aga Juris Editora – 1998

Eric Arvanites / Fonte: Artigos JusBrasil

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