Antes de adentrar no tema do presente artigo, faz-se necessário inicialmente apresentarmos o que vem a ser uma incorporação imobiliária no Brasil.
A palavra “incorporar” apresenta o conceito de reunião ou junção de duas ou mais coisas para a formação de um todo sempre maior.
Quando o assunto diz respeito à construção civil, essas duas coisas que quando se juntam tornam-se um só ente diz respeito à união do terreno (terra nua) e a construção propriamente dita ou prédio a ser erguido dentro do terreno.
O termo “incorporação imobiliária” aplicado no Direito significa a forma pela qual uma pessoa jurídica ou física constrói um ou mais prédios em um terreno.
Normalmente o proprietário do terreno recebe como pagamento pela venda algumas unidades no futuro prédio ou recebe o pagamento em espécie.
Incorporador é a pessoa jurídica ou física, sendo ou não comerciante, que administraa construção em parceria com o proprietário do terreno e que vende as unidades aos interessados sob o regime condominial. Não podemos também confundir o termo “incorporador” com “construtor”, sendo este o responsável pela execução da obra.
Podem ser incorporador: o construtor (conforme Decreto nº 23.569/1933 e 3.995/1941 e Decreto-Lei nº 8.620/1946); o proprietário do terreno (mais comum de se encontrar); o promitente-comprador; o cessionário do terreno; o corretor de imóveis (conforme Lei nº 4.116/1962).
A Lei Federal nº 4.591/1964 (Lei de Incorporações), através do parágrafo único do artigo 28, define o contrato de incorporação imobiliária como sendo o negócio jurídico através do qual o incorporador se obriga a promover e realizar uma construção destinada à alienação de unidades autônomas com pagamento à vista ou em prestações.
Assim, para que exista uma incorporação imobiliária, deve haver uma construção, necessariamente.
Pode ser objeto de incorporação imobiliária o conjunto de casas térreas ou assobradadas situadas em terreno comum (casas, jardim, quintal, etc), bem como também pode ser objeto um conjunto de prédios de dois ou mais andares contendo unidades autônomas, além de apenas um único edifício composto de unidades autônomas localizado em terreno em partes ideais.
Basicamente: i) o proprietário do terreno vende, permuta ou cede seus direitos ao incorporador responsável pela futura construção; ii) o construtor é o responsável pela empreitada da obra.
Sobre o prazo de entrega das unidades e a qualidade construtiva dos imóveis perante os adquirentes é o incorporador o responsável, em regra. Não é, portanto, o construtor, a menos, é claro, que este figure na relação comercial entre as partes também como incorporador, hipótese em que haverá confusão entre a pessoa do incorporador e também do construtor.
Existindo mais de um incorporador, a responsabilidade perante os adquirentes passa a ser solidária.
A incorporação imobiliária extingue-se com a venda total das unidades autônomas e após sua individualização (matrícula) no cartório de registro de imóveis.
Sobre as espécies de construção, a Lei nº 4.591/1964 prevê três modalidades para as incorporações imobiliárias, a saber:
a) Construção por conta e risco do incorporador
b) Construção por empreitada
c) Construção por administração
A construção por conta e risco do incorporador pode ser identificada nos artigos 41 e 43 da Lei nº 4.591/64.
Nessa modalidade de construção, onde não existe a figura jurídica da comissão de representantes, o incorporador compromete-se a construir – ele próprio ou mediante terceirização, o que é mais comum nos grandes centros urbanos – e vender as futuras unidades a preço e prazo certo.
A comercialização dos futuros imóveis poderá ocorrer na planta ou quando a edificação estiver em construção ou até mesmo quando já concluída, respeitados, sempre, as determinações existentes na Lei nº 4.591/64, especialmente porque o incorporador deve seguir uma série de exigências legais para poder comercializar as unidades, como, por exemplo, providenciar o registro da incorporação perante o cartório de registro de imóveis competente, sob pena de nulidade de qualquer venda realizada, dentre outros requisitos legais.
A construção por empreitada é encontrada no artigo 55 da Lei nº 4.591/64.
Também conhecida no mercado imobiliário como construção a preço fechado é a mais comum de se encontrar para imóveis na planta nos grandes centros urbanos.
Nessa espécie de construção, a obra é construída por empresa (empreiteira) terceirizada pelo incorporador, podendo ser construída por ele próprio também, caso assim deseje, havendo a figura jurídica da comissão de representantes.
Nessa modalidade construtiva, a responsabilidade perante os adquirentes em decorrência de eventual atraso na entrega do empreendimento ou pela qualidade construtiva recai nos ombros do construtor ou do incorporador, conforme o caso.
Nada mais é do que a construção de unidades autônomas na planta ou em construção, tratando-se de imóveis constituídos por planta padrão (mas podendo ser modificada mediante pagamento de valor adicional pelo comprador e caso isso seja possível pelo vendedor), cujo preço é pré-estabelecido pelo vendedor considerando o valor atual do metro quadrado na região e o fluxo de pagamento pode ser feito à vista ou a prazo, com a incidência de índice de correção monetária oficial (INCC, CUB, etc.).
No preço fixo em contrato, caso a obra atrase o cronograma de entrega pactuado entre as partes (vendedor e comprador), o adquirente não pagará a mais por isso, a menos que seu fluxo de pagamentos seja a prazo e ainda reste o pagamento de alguma parcela, como, por exemplo, parcela de chaves ou de financiamento. Nessa situação, o comprador continuará obrigado pelo contrato no pagamento da correção monetária até a liquidação da dívida.
A construção por administração é prevista no artigo 58 da Lei nº 4.591/64.
Essa terceira modalidade de construção também é conhecida como “a preço de custo” e é a mais arriscada para o comprador, pois aqui o condomínio composto pelos adquirentes é obrigado a custear a obra, ou seja, há a transferência dos riscos para o adquirente de unidade autônoma e isso pode ser algo desagradável para grande parcela da população.
Na construção por administração há a figura jurídica da comissão de representantes, comissão essa responsável pelo pagamento do custo integral da obra, além de ter o dever de zelar pelo tempo de construção e pela qualidade dos materiais usados no empreendimento, ou seja, aqui não é o construtor ou incorporador o único responsável pela obra.
Na hipótese de existir atraso na entrega do empreendimento ou queixas relacionadas à má qualidade dos materiais utilizados na construção, conforme previsto no artigo 58 da Lei nº 4.591/64, a responsabilidade civil recairá sobre a comissão de representantes perante os adquirentes, desde que, evidentemente, tais problemas tenham ocorrido por falha da própria comissão e não da construtora contratada para a execução dos serviços.
Após a formação do grupo é realizada a primeira assembleia, onde os adquirentes assumirão a posição do incorporador, tendo domínio sobre todas as ações a serem executadas no campo financeiro e administrativo, sendo que as funções serão determinadas pelo conselho gestor e fiscal da obra.
Na construção por administração o perigo reside no aspecto da segurança técnica, logística, financeira e administrativa do incorporador para iniciar e finalizar o empreendimento imobiliário. Caso o incorporador desenvolva todas as atividades relacionadas à obra com conhecimento, provavelmente os compradores pagarão um preço mais baixo do que na modalidade da construção por empreitada.
Porém, se houver atraso quanto ao prazo de entrega do empreendimento previsto pelo incorporador ou ainda, o incorporador necessitar ampliar os gastos na construção por erro no cronograma logístico-financeiro da obra, os adquirentes pagarão mais – e às vezes, muito mais! – pelas unidades autônomas.
Por outro lado, não é menos verdade que há no Brasil um modelo de construção por administração onde o incorporador GARANTE ao adquirente um preço máximo de pagamento pelo imóvel, a fim de minimizar a insegurança financeira nesse tipo de construção.
Assim, caso o interessado deseje adquirir um imóvel nesse modelo de construção, recomenda-se assegurar-se se o contrato, de fato, possui alguma cláusula onde o vendedor garante o preço máximo para a unidade.
A grande vantagem da construção por administração depende exclusivamente da condução da obra. Se houver uma boa gestão, todos, sem exceção, saem ganhando. Ganha o incorporadora, ganham os fornecedores e os próprios compradores.
A vantagem nessa modalidade de construção em comparação com a construção por empreitada reside nos benefícios fiscais aplicados na construção por administração, havendo redução da carga tributária, pois os tributos incidentes, especialmente, os impostos sobre materiais e os demais (instalações e mão-de-obra), não são cobrados pelo construtor, mas sim repassados ao dono da obra.
Principais diferenças entre as duas modalidades:
As principais diferenças entre a construção por empreitada e a construção por administração estão relacionadas aos seguintes pontos:
Preço - Na modalidade “por empreitada”, em tese, o valor do imóvel tende a ser maior do que na espécie “por administração”. Fora isso, na modalidade “por empreitada” o adquirente sabe qual é o valor de que deverá pagar e na espécie “por administração” o preço da unidade inicialmente contratada é meramente estimativo, podendo sofrer alterações;
Índice de correção monetária das parcelas - Na modalidade “por empreitada”, na imensa maioria dos contratos, tem-se a presença do INCC, já na espécie “por administração” o índice de correção normalmente é o CUB;
Responsabilidade civil - Na modalidade “por empreitada”, a responsabilidade pelo dono da obra (incorporador/construtor) é maior do que na espécie “por administração”;
Tributos - Na modalidade “por administração”, se bem conduzidos os trabalhos, especialmente a contratação de mão-de-obra e materiais (quantidade e qualidade), a incidência dos impostos ocorre uma única vez, sempre para o dono da obra e o valor da carga tributária tende a ser menor do que na espécie “por empreitada”; e
Responsabilidade trabalhista - Em que pese ser solidária a responsabilidade trabalhista e previdenciária pelas obrigações dos empreiteiros e subempreiteiros da obra, quem figura como principal responsável é sempre o dono da obra na modalidade “por administração”.
Essa responsabilidade trabalhista abrange os recolhimentos de tributos e contribuições, pagamento de salários e demais benefícios trabalhistas, existindo muitas vezes a necessidade da contratação de empresa responsável pela fiscalização, objetivando a redução de eventuais contingências nesse sentido.
Evidentemente que, por outro lado, a empresa contratada para coordenar a obra (o que em tese cabe à comissão de representante) passa a também assumir a responsabilidade solidária com as empreiteiras, respondendo por eventuais danos causados por estas e seus subempreiteiros.
Já na construção “por empreitada” essa responsabilidade é exclusiva do incorporador ou construtor (empreiteiro).
Ivan Mercadante Boscardin (Mercadante Advocacia) - Advogado especialista em Direito Imobiliário e Consumidor
Fonte: Artigos JusBrasil
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