Empresas de incorporação imobiliária, por meio de sua entidade, a Abrainc, solicitou ao governo federal, por meio do Ministério da Economia, a suspensão temporária das alíquotas de importação de materiais de construção, segundo o Valor apurou. A pressão de custos de materiais tem sido considerada o maior desafio para incorporadoras e construtoras, principalmente na cidade de São Paulo, onde o mercado imobiliário é mais pujante.
“Há conversas com o governo para ver o que é possível fazer, por um determinado período, para que os fornecedores de materiais mantenham os preços”, conta uma fonte do setor. No momento, Abrainc e Ministério da Economia estão realizando - cada parte, por seu lado - análises técnicas sobre as implicações das importações. Procurada, a entidade não se manifestou.
“A construção está bastante sufocada com o aumento dos insumos”, afirma Senra, presidente do Sinduscon-SP
Materiais como aço, concreto, fios de cobre e PVC estão entre os que têm as altas mais comentadas no setor. Conforme a fase da obra, o empreendimento será mais afetado pelos reajustes de materiais básicos ou de acabamento. “A construção está bastante sufocada com o aumento dos insumos”, afirma o presidente do Sindicato da Construção (Sinduscon-SP), Odair Senra.
Segundo o vice-presidente de relações institucionais da Tecnisa, Fabio Villas Bôas, no ano passado, o setor entendeu que as altas de preços praticadas pelos fornecedores de materiais eram um “ajuste” após a retomada da demanda. “Mas, aparentemente, os aumentos não têm fim”, diz o executivo.
Elevações dos insumos têm contribuído para pressionar o indicador de referência para ajustes das parcelas pagas pelo comprador à incorporadora até o recebimento das chaves. Em 12 meses, o Índice Nacional de Custo da Construção - Disponibilidade Interna (INCC-DI) acumulado é de 9,37%. A alta de janeiro foi de 0,89%.
Na avaliação de Senra, do Sinduscon-SP, ajustes acentuados do INCC podem vir a resultar em inadimplência ou distratos se não forem acompanhados por aumento de renda do comprador. “Isso ainda não está acontecendo, mas é uma preocupação de todos nós”, ressalta Villas Bôas.
Os prazos para recebimento dos insumos também está mais dilatado. Na SKR Incorporadora e Construtora, o tempo entre pedir e receber aço de fornecedores pequenos costumava ser de 15 a 20 dias e, das grandes produtoras, por volta de 30 dias. “Agora, nos pedem de 60 a 90 dias para a programação de entrega”, compara Gabriel Junqueira, diretor de engenharia da SKR.
Nos padrões médio e alto, incorporadoras podem repassar as elevações de custos para os preços dos imóveis ainda não vendidos, desde que o novo valor não ultrapasse a capacidade de compra dos consumidores ou torne a unidade pouco competitiva em relação a imóveis semelhantes comercializados na mesma região.
Segundo o diretor financeiro e de relações com investidores da Mitre Realty, Rodrigo Cagali, a incorporadora conseguirá vender lançamentos com elevação de preços para preservar margens, assim como ocorreu em 2020. Já o diretor técnico da Trisul, Roberto Pastor, diz não ser possível repassar aumentos de custos para os preços, o que leva a companhia a buscar outras formas de compensação. “Estamos buscando tornar a construção mais racional e mais tecnológica”, afirma Pastor.
Na baixa renda, repassar os aumentos é ainda mais difícil por causa do teto de preço definido para cada faixa de imóveis incluídos no programa habitacional Casa Verde e Amarela. “Do total de nossas obras, 90% está no programa. Temos tentado fazer as construções em tempo menor, mas não há muito para onde correr”, diz Dante Seferian, presidente da Danpris.
Algumas incorporadoras já se preocupam com a potencial volta do risco de estouros de orçamentos. No começo da década passada, o setor enfrentou revisões de orçamento que prejudicaram as margens das empresas. “Em 2020, havia folga, mas os aumentos dos insumos têm comido nossa economia de obras. Em algum momento, pode haver estouro de novo”, diz o vice-presidente da Tecnisa.
O presidente da Direcional Engenharia, Ricardo Gontijo, porém, diz não ver o setor voltar àquela situação de estouro de custos do passado. “O setor aprendeu demais. Houve mudança de processos construtivos que possibilitaram elevar a produtividade. E, lá atrás, o maior problema foi ligado à mão de obra, não aos materiais”, destaca.
Em um cenário mais extremo, construtoras que prestam serviços a incorporadoras podem ter de paralisar obras pela inviabilidade dos custos, no entendimento do presidente do Sinduscon-SP.
A preocupação com a inflação ultrapassa os limites setoriais, de acordo com o executivo de uma incorporadora. O principal impulso para as vendas de imóveis têm sido os juros baixos. Conforme o patamar de alta da inflação, as taxas de juros poderão voltar a subir, alterando a dinâmica favorável ao setor. Não é o que as empresas esperam para o curto prazo, mas trata-se de ponto de atenção.
Fonte: VALOR ECONôMICO
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