quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

NOBEL DA ECONOMIA VOLTA A PREVER ESTOURO DA BOLHA IMOBILIÁRIA

Robert Shiller - Foto Fórum Econômico Mundial/Flickr

O perigo de uma crise como a de 2008 não está assim tão distante, adverte Robert J. Shiller, o economista que recebeu este ano o Nobel da Economia e que alertou para o estouro da bolha do subprime nos EUA com um ano de antecedência.

“Em muitos países os preços imobiliários e nas bolsas têm subido muito. Estou particularmente preocupado com o boom nos Estados Unidos porque a nossa economia ainda está fraca e vulnerável. Tudo isso pode terminar mal”, disse Shiller à revista alemã Der Spiegel.

Segundo Shiller, a bolha não se limita aos países anglo-saxônicos, cujas economias estão tradicionalmente mais dependentes de movimentos financeiros e imobiliários. Nas suas declarações, o economista destacou o aumento do preço dos imóveis no Rio de Janeiro nos últimos cinco anos. “Parece-me um pouco o que ocorreu nos Estados Unidos em 2004, quando se justificava essa situação pelas oportunidades de investimento que existiam e por uma florescente classe média”, disse Shiller à Der Spiegel. Ele não é apenas o Prémio Nobel. Shiller foi um dos poucos a prever um ano antes o colapso das hipotecas “subprime” em 2008 e seu índice “Case Shiller” é uma referência para o cálculo dos preços imobiliários nos Estados Unidos.

A bolha anglo-saxônica
Em abril deste ano o índice Shiller estimou que o ritmo de aumento dos imóveis nos Estados Unidos tinha alcançado o seu nível máximo desde o feroz estouro da bolha em 2007-2008. Em setembro, o movimento seguia claramente em alta com uma elevação interanual dos preços hipotecários de 12,8%. Em lugares como Sacramento, o incremento disparava para 34,1%. Em Las Vegas, era de 33,3%, em Riverside, Califórnia, de 31%.

Enquanto isso, no Reino Unido, o preço da moradia está a subir 6,5% ao ano, mais do dobro da inflação em um país com salários virtualmente congelados. Esta percentagem dispara quando se analisa o caso particular de Londres onde a propriedade aumentou 9,7% nos últimos 12 meses, um ritmo superior ao máximo obtido em 2008.

Um colapso imobiliário no Reino Unido ou no Brasil não teria um impacto global. A situação muda de figura se a bolha estourar nos Estados Unidos. Diferentemente da crise de 2008, alimentada pela venda de “hipotecas podres” a pessoas que muitas vezes não tinham emprego, a bolha atual pode ser sentida no segmento de rendimento médio-alto e alto através das chamadas “hipotecas jumbo”.

A regulação do mercado hipotecário estadunidense estipula um teto de 417 mil dólares para os empréstimos a um imóvel de família típico, limite que sobe para 625 mil dólares em áreas mais caras como Nova York ou Los Angeles. As “hipotecas jumbo” situam-se acima dessas cifras e tem uma taxa de juro mais alta – cerca de 0,25% a mais – para incorporar ao preço do empréstimo o risco adicional de um montante muito mais alto. Mas agora os bancos estão a promover hipotecas jumbo de 30 anos que custam menos que os empréstimos para uma família standard.

Um especialista do mercado imobiliário na Flórida, Peter Zalewski, da Condo Vultures, considera que a bolha está em pleno desenvolvimento. “A diferença é que agora vemos nichos, as propriedades que valem ao redor de um milhão de dólares, por exemplo, às quais têm acesso norte-americanos ou estrangeiros muito ricos e investidores institucionais. Os latino-americanos estão a contribuir ativamente para esta bolha”, disse Zalewski à Carta Maior.

O modelo econômico
No Reino Unido está a ocorrer um fenômeno similar. A imobiliária Savills calcula que 38% das moradias do centro de Londres estão a ser compradas por estrangeiros e, se só se leva em conta o imóvel recém-construído, esse percentual sobe para 74%. Segundo alguns, o impacto que isso tem no modelo económico britânico é que se está converter num país de agentes imobiliários, como ironizou em outubro um editorial do Guardian. “Hoje há cerca de 562 mil agentes imobiliários, recorde histórico; no último ano juntaram-se cerca de 77 mil novos empregados no setor”, resumia o editorial.

Este nível de emprego é indicador de um modelo econômico que continua ancorado ao consumo baseado no crédito e na especulação imobiliária. A diferença é que agora as autoridades estão mais conscientes de que as bolhas terminam por estourar com consequências devastadoras. Na sexta-feira, o novo presidente do Banco da Inglaterra, o canadiano Mark Carney, interveio ao desviar para pequenas e médias empresas os fundos de ajuda destinados ao setor imobiliário. “Seria bom que as pessoas se perguntassem se poderão pagar em cinco ou dez anos os créditos hipotecários se as taxas de juro aumentarem”, advertiu Carney ao The Guardian.

O problema é que o crescimento é tão dependente do crédito no Reino Unido que o debate desta semana é que impacto terá na economia que cresceu no último trimestre um anêmico 0,8%. Esta dependência económica está igualmente presente nos Estados Unidos e foi a base da crise de 2008. Segundo o co-diretor do Center for Economic and Policy Research de Washington, Dean Baker, as mudanças no sistema regulatório para enfrentar o problema têm sido de natureza cosmética. “O crescimento dos últimos 10 anos baseou-se em bolhas. É assombroso que a Reserva Federal não tenha visto isso. O sistema regulatório apenas mudou um pouco”, disse à Carta Maior.

Artigo de Marcelo Justo, da Carta Maior.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer. 

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