quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

LGPD para os condomínios (residenciais, comerciais e corporativos) – Por Adrianne Lima, Flávia Alcassa dos Santos, Anielle E. Martinelli e Mirian Aparecida Esquárcio Jabur


Serão abordados temas como problemas, sanções administrativas e indenizações à titulares relacionados aos atores envolvidos no cenário de condomínios residenciais e comerciais, sob fundamento da LGPD

O início de vigência da LGPD vem trazendo impactos a todos que, de alguma forma, realizam tratamento de dados pessoais.

Seu principal objetivo visa regular a proteção de dados pessoais, os direitos de liberdade e privacidade dos titulares de dados, sendo que, se for cabível a aplicação da lei, a organização, seja ela empresa, condomínio, administradora ou portaria eletrônica, terá de buscar adequação às obrigações legais, abrangidas pelo programa de governança em privacidade.

Como forma de contextualizar a importância da LGPD no cenários dos condomínios, relembramos como ela classifica que são considerados dados pessoais, descrito em seu artigo 5, são aquelas informações relacionadas a pessoa natural identificada ou identificável, ou seja, a placa de um veículo pode levar a identificar uma pessoa natural, portanto pode ser considerado um dado pessoal.

Já os dados sensíveis são aqueles relacionados a origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, de uma pessoa natural.

Dessa forma, condomínios, sejam eles de prédios residenciais ou comerciais, também devem buscar a adequação à LGPD, caso realize atividades envolvendo dados, por exemplo, de moradores, trabalhadores, prestadores e visitante.

Embora haja a possibilidade da Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ANPD, como previsto no artigo 55-J, XVIII, da LGPD, vir a flexibilizar algumas obrigações, fato é que, atualmente, a lei tem que ser cumprida por todos aqueles que realizam tratamento de dados pessoais, sendo cabível também aos condomínios.

As obrigações trazidas pela LGPD, independentemente do tipo, abrange também medidas técnicas e organizacionais, como a revisão de documentos que o condomínio compartilha com terceiros os quais contenham dados pessoal, tais como, contratos com as gestoras e administradoras, profissionais liberais, contadores para emissão de guias fiscais e folha de pagamento, bem como com as empresas de monitoramento e limpeza); Outro aspecto a ser levado em consideração são as lista de autorizações, políticas e manuais de procedimento que envolvam dados pessoais em geral.

Apesar da necessidade dos condomínios de se adequarem, ainda existem vários questionamentos que precisam ser explicitados, dentre os quais é como a ANPD aplicará as sanções descritas no artigo 52 da LGPD, ou seja, como será a base de cálculo para a definição de sanção pecuniária, levará em consideração o valor arrecadado pelo condomínio, tendo em vista não se tratar de faturamento?

Outro questionamento que necessitará uma avaliação e definição por parte da ANPD é, uma vez recebida a multa pelo condomínio, esta seria dividida entre os condôminos, assim como definido pelo artigo 1.317 do Código Civil e entendimento da jurisprudência, descrito a seguir.

“Diferentemente do que ocorre com as pessoas jurídicas, qualquer repercussão econômica negativa será suportada, ao fim e ao cabo, pelos próprios condôminos, a quem incumbe contribuir para todas as despesas condominiais, e/ou pelos respectivos proprietários”.
(REsp 1.736.593 / SP, STJ, 3ª Turma. j. 11/02/2020).

Espera-se que a ANPD venha a elucidar tais questões específicas aos condomínios, mas certo é que a governança de privacidade deve ser adotada a fim de não prejudicar futura ratificação de obrigações.

1 – A APLICABILIDADE À CONDOMÍNIOS COMERCIAIS E RESIDÊNCIAIS

Ao analisar o Código Civil sobre a natureza jurídica dos condomínios, mais especificamente no artigo 44, verifica-se que ele não elencar o condomínio como uma possível pessoa jurídica de direito privado, causando certa discussão sobre a sua natureza.

Há jurisprudência e juristas que discutem a temática, tanto que no próprio STJ, há divergências sobre essa questão:

“a Primeira Seção, especializada em direito público, entende que em matéria tributária os condomínios possuem personalidade jurídica ou devem ser tratados como pessoa jurídica; na Segunda Seção, que julga casos de direito privado, prevalece a corrente para a qual eles são entes despersonalizados” (STJ, 2020).

Nesse sentido, Caio Mário da Silva Pereira explica que:

“Continua acirrada, na moderna doutrina, a discussão quanto a ter o condomínio edilício uma personalidade jurídica.

Pessoalmente nos alinhamos entre aqueles que o consideram um ente despersonalizado, ou seja, uma pessoa formal, já que lhe falta a affectio societatis, sendo apenas dotado de personalidade judiciária e de plena capacidade processual, o que lhe permite estar em juízo, em nome próprio, representado pelo síndico, na defesa dos interesses comuns dos condôminos”.

Porém, o doutrinador admite que, apesar de se tratar de ente despersonificado, o condomínio poderia assumir direitos e obrigações:

“No entanto, somos forçados a admitir que vem se fortalecendo a corrente dos que atribuem ao condomínio uma personalidade jurídica autônoma, já tendo sido aprovado o Enunciado n. 246, na IV Jornada de Direito Civil, que segue na mesma direção”. (Pereira, 2016) (grifos nossos)

Há também entendimento de que os condomínios são equiparados a pessoa jurídica de direito privado, especialmente como as empresas, tendo em vista a obrigatoriedade de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ e, assim, seria considerada empresa por equiparação ou ente despersonificado.

Da mesma forma, Frederico Henrique Viegas de Lima ensina que, considerando a lacuna da lei, é possível a interpretação sistemática, a partir da argumentação jurídica, a qual permite reconhecer a personalidade jurídica dos condomínios, adequando o sistema às novas necessidades sociais:

“Não é possível a admissão simplista de que o condomínio em edificações seja um ente despersonalizado, tal como o são a massa falida e o espólio. Aquele não pode ser comparado com estes por motivos bastante singelos. De uma parte, tanto a massa falida quanto o espólio são situações jurídicas transitórias, onde se pode vislumbrar sua extinção. Ao passo que o condomínio em edificações possui a característica de perenidade, transpondo-se ao longo dos anos e, até mesmo, dos séculos. De outra parte, como derivação desta primeira distinção, o número de relações jurídicas e as possíveis modalidades que pode ter o condomínio em edificações como sujeito de direitos são infinitamente superiores àquelas outras”.
(Revista Trimestral de Direito Civil, 2009)

A Segunda Turma do STJ já julgou que, “embora o condomínio não possua personalidade jurídica, deve-lhe ser assegurado o tratamento conferido à pessoa jurídica, no que diz respeito à possibilidade de condenação em danos morais, sendo-lhe aplicável a Súmula 227 desta Corte, in verbis: ‘A pessoa jurídica pode sofrer dano moral'”.

A conclusão foi que “a pessoa jurídica pode sofrer dano moral – no caso, o Condomínio -, desde que demonstrada ofensa à sua honra objetiva” (AgRg no AREsp 189.780/SP, julgado em 09/09/2014, DJe 16/09/2014).

Clique aqui para conferir a íntegra do artigo.

Fonte: Migalhas

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