segunda-feira, 2 de setembro de 2019

BLOCKCHAIN E A REVOLUÇÃO DO MERCADO IMOBILIÁRIO


Editada em 31 de dezembro de 1973, a lei 6.015 ao dispor sobre os registros públicos, trata de realidade que de longe já não mais se adequa à situação dos negócios imobiliários atuais.

A Lei de Registros Públicos, ou LRP como será chamada, traz alguns conceitos e preceitos que para a realidade do mercado atual desafia a lógica.

Já não dá mais para chamarmos de futuro. Com a evolução tecnológica, surgiram uma série de ferramentas que podem dar autenticidade e segurança a documentos e transações, sem a necessidade de um terceiro que venha a intervir como autorizado pelo poder público para lastrear a transação ali consignada.

A proteção à propriedade tem sido preocupação nas constituições brasileiras desde a de 1824, garantindo a livre utilização da propriedade, o que foi seguido pelas constituições posteriores, inclusive a de 1988 a quem foi dada exclusividade àqueles a quem o poder publico delegar os serviços notariais e de registro em caráter privado, por delegação do Poder Público. 

À época, a forma identificável para garantir segurança e publicidade às transações imobiliária era a de registro através dos cartórios de registros de imóveis, e, por esta razão este foi o caminho seguido pelo legislador.

Nos dias atuais, são inquestionáveis os conflitos e a dificuldade que os diversos cidadãos, compradores, vendedores, consultores jurídicos e mesmo o poder público encontram com os cartórios de registros públicos. Ademais, diversos são os meios possíveis à garantia de segurança e publicidade das transações imobiliárias.

Ademais, admitir-se que determinada transação realizada por dois indivíduos de boa-fé, um detentor da propriedade de um bem e outro com interesse em adquirir-lhe o domínio só seria válida caso houvesse a intervenção do tabelião do cartório, é tirar destes indivíduos a possibilidade de construírem sua própria realidade, e, portanto, é trazer um viés antidemocrático ao ambiente dos negócios.

A palavra democracia em sua definição axiológica pode ser entendida como substantivo feminino que se originando do grego significando a partir do “demos” significando povo e “cratos” significando poder, teríamos, portanto, o poder do povo.

Da simples análise axiológica poderíamos entender a democracia como o sistema no qual o poder e portanto as decisões caberiam ao povo, e portanto, estes estariam no centro das decisões.

A visão democrática dos negócios seria, portanto, a possibilidade, ou mesmo o poder do povo de construir a sua própria realidade. Partindo deste conceito, de democracia como a construção da realidade pelo cidadão, apresenta-se uma visão de democracia transcendendo às meras escolhas políticas e encontrando-se com o cenário de construção de uma realidade no dia-a-dia.

A transferência ao estado da autorização, fiscalização e chancela das relações individuais dos cidadãos, tal como o registro imobiliário de transação de compra e venda, afasta o cidadão da construção da sua realidade.

O monopólio pelos Cartórios de Registro Imobiliário da formalização dos contratos de compra e venda, tira dos indivíduos partes no contrato a possibilidade de realizar formalmente a transação sem a necessária intervenção de terceiro/autoridade.

Entende-se que a liberdade de contratar, para que se tenha uma construção de uma realidade negocial verdadeiramente democrática, tem que ir além do mero ato de intenção, como ocorre no contrato de promessa de compra e venda, e chegar até a efetiva realização do registro imobiliário na modalidade em que as partes desejarem.

Assim, entendemos que essa descentralização dos registros de chancelas pelo poder público dos atos de escolha, e dos negócios jurídicos trazem, além de uma visão liberal, um efetivo sentimento de liberdade e mais ainda de democracia, em que o povo tem a possibilidade de livre do estado/autoridade, construir a sua realidade de negócios.

Com o surgimento das criptomoedas, em especial a denominada bitcoin, ganhou fama o sistema utilizado por estas criptomoedas para registrar as transações realizadas, a denominada blockchain.

Para explicarmos a blockchain, alguns conceitos têm que fica delineados para então, podermos entender o funcionamento e características do sistema. 

Na blockchain, os registros se dão de forma criptografada. Criptografia é um mecanismo de segurança e privacidade que faz com que a comunicação e registros realizados nesta modalidade sejam ininteligíveis para os que não sejam detentores dos códigos de programação necessários à tradução dos códigos utilizados para o registro. Assim, um registro criptografado, como os realizados na blockchain, só podem ser alterados por quem detenha as chaves de tradução desse mecanismo de segurança.

Assim, a blockchain é uma tecnologia de registro distribuído através de blocos de computadores organizados em cadeias, por isso a denominação blockchain, que significaria cadeia de blocos, na qual estes registros, pode se dar em forma criptografada não podem, serem alterados e o sistema é, na visão dos programadores, incorruptível.

Nesse sistema, os registros são realizados de forma criptografadas em um dos blocos em cadeia, e assim, imediatamente, replicados nos demais blocos, trazendo a segurança de que, ainda que metade dos blocos sofra por qualquer razão uma danificação, milhares de outros computadores espalhados pelo mundo serão responsáveis pela manutenção da integridade dos registros.

A segurança trazida pela tecnologia blockchain, fez com que a mesma tenha, nos dias atuais, uma série de outas aplicações que não a de registro das criptomoedas.

Em 12 de agosto, foi feita a escritura do terreno e, no dia 16, registrada a incorporação imobiliária. O empreendimento, destinado à faixa 3 do Minha Casa, Minha Vida e à faixa logo acima do programa habitacional, com unidades até R$ 340 mil, foi lançado no último fim de semana.

Assim, ante a segurança, transparência e baixos custos da blockchain, evidencia-se que estamos vivenciando uma revolução no mercado imobiliário a qual, trazida por estas tecnologias trazem maior celeridade, redução de custo e um maior controle e segurança jurídica pelos envolvidos na transação.
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Fernando Medeiros é sócio do escritório Medeiros Advocacia e Consultoria.
Fonte: Migalhas de Peso

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