sexta-feira, 12 de maio de 2017

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM XEQUE


O mercado imobiliário cresceu significativamente na última década e um dos seus principais impulsionadores é a alienação fiduciária, que mantém o imóvel como propriedade do agente financiador até o final do contrato de empréstimo. Com essa garantia, as instituições financeiras disponibilizaram mais recursos para o setor, que sem crédito não cresce, uma vez que esse tipo de bem tem custo muito alto, como provam os números: o estoque de financiamento imobiliário saltou de aproximadamente R$ 60 bilhões, em 2008, para mais de R$ 600 bilhões em janeiro de 2017, conforme o Banco Central (BC).

Mas a atual crise está mostrando que a lei, de 1997, que permitiu essa expansão do mercado ainda precisa ser refinada, a fim de manter o desenvolvimento do setor e impedir o volume crescente de processos judiciais. Um dos maiores desafios para os bancos em tempos de crise é a alta da inadimplência, que afeta também os financiamentos imobiliários. O volume de imóveis que tem sido recuperado por falta de pagamento das prestações tem sido crescente.

Entretanto, os bancos têm encontrado dificuldades em recuperar o crédito por meio da venda desses imóveis. A ampla aplicação da alienação fiduciária como garantia não impede que o devedor possa recorrer ao judiciário quando considera a execução desproporcional. A Lei nº 9.514/97 prevê de forma específica a execução da garantia em leilões. No primeiro deles, o valor deve ser, no mínimo, o da avaliação. Se não houver comprador, realiza-se um segundo leilão para venda do imóvel ao menos pelo valor da dívida. Destaca-se que eventuais valores acima do montante da dívida são devolvidos ao devedor, tal como previsto na legislação.

Contudo, o problema comumente enfrentado e que tem se tornado de difícil solução é quando o valor da dívida é muito inferior ao do imóvel. O Código de Processo Civil (CPC) prevê que não será aceito lance feito a preço vil, ou seja, um valor muito inferior “ao mínimo estipulado pelo juiz e constante em edital”, como diz o CPC, ou menor que 50% do preço estipulado na avaliação, se o magistrado não tiver fixado um valor mínimo. Ao se confrontar os dois dispositivos – o art. 27, § 2º, da lei 9.514/97, que dispõe apenas sobre valor “igual ou superior ou valor da dívida”, e o art. 891, § único, do CPC, que considera preço vil o “valor inferior a cinquenta por cento do valor da avaliação” – há aparente contradição, dada a fixação de critério legal para estipulação de preço mínimo.

Nesse sentido, os Tribunais passaram a receber uma enxurrada de demandas de devedores impugnando leilões de execução de garantia fiduciária nos quais o imóvel teria sido arrematado ou adjudicado pelo credor por valor considerado vil. Muito se tem debatido acerca do critério a ser utilizado para a caracterização do preço vil na venda do imóvel, de forma a evitar o enriquecimento sem causa do credor ou do terceiro adquirente, bem como prestação excessivamente onerosa ao devedor.

O Superior Tribunal de Justiça se posicionou no sentido de que, em relação à garantia fiduciária, se aplica o critério previsto às execuções em geral, considerando como preço vil o montante inferior à metade do valor obtido na avaliação do imóvel. A Corte ratificou essa jurisprudência em recente julgamento, em dezembro de 2016, com a finalidade de dirimir eventuais dúvidas acerca de sua aplicação (AIREsp 1.463.695/RS). Para evitar um volume muito alto de processos, e que se arrastem até a última instância, os credores também estão preferindo renegociar o máximo que podem com quem não está pagando o financiamento imobiliário em dia. Enfim, a alienação fiduciária apresenta um problema crônico, que pode colocar em xeque sua utilização nos contratos de empréstimo.

Luís Fernando de Lima Carvalho e Andréa de Faria Soubihe do CSMV Advogados
Fonte: Segs - Clipp Notícias

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