Impulsionado pelos anos de estabilidade na economia, aumento da renda, expansão do volume de crédito, redução da inflação, aliado à ideia de modernidade trazendo maior segurança, facilidade nos serviços e conforto aos usuários deste segmento, os shoppings centers tiveram forte expansão nas cidades, tornando-se uma forma de varejo inovadora, amplamente aceita pela população para realizar suas compras e lazer.
Os shoppings, regulamentados pela ABRASCE - Associação Brasileira de Shopping Centers (atua na defesa dos interesses dos shoppings), e a ALSHOP - Associação Brasileira de Lojistas de Shoppings (representa o segmento dos lojistas varejistas), associações que tem por objetivo o aprimoramento, desenvolvimento de estudos e pesquisas sobre a caracterização, manutenção e operação de shopping centers no Brasil, visualizando as melhores práticas comerciais e ações de marketing; caracterizam o shopping centers como o espaço que preenche os requisitos:
- Localização em ponto previamente estudado, com base em pesquisa de crescimento populacional, características socioeconômicas, potencial de consumo, acesso e tráfego, de forma a tornar viável o empreendimento e estabelecer, com segurança, suas dimensões.
- Presença de "lojas-âncora", que são aquelas empresas maiores, com ofertas de produtos de grande consumo, localizadas em pontos estratégicos e que por si constituem polos de atração para os shopping centers.
- Planejamento técnico de variedade de ramos de lojistas, seleção, definição do tamanho de sua área e localização, de modo a atender às necessidades e desejos de compradores, permitindo assim um fluxo perfeito de consumidores às lojas e introduzindo-os à compra de forma conveniente, racional e organizada.
- Sistema básico de locação das lojas, como forma adequada de manter o planejamento da variedade de ramos de lojistas, adaptada ao mercado local, permitindo por parte dos consumidores a compra comparada, além de garantir um retorno sobre o vultoso investimento e assegurar o controle do empreendimento.
- Estacionamento compatível com a "área bruta locável" (ABL), que garanta a fluência e o escoamento tranquilo do fluxo de automóveis que virão diariamente ao shopping center.
- Idoneidade e capacidade empresarial do grupo empreendedor, devido ao vultoso investimento necessário à sua implantação.
Os shoppings centers não são lojas quaisquer. Eles se apresentam como um belo edifício de proporções ciclópicas, composto de numerosos salões, de área de lazer, de estacionamento e veículos, de agências bancárias; tudo isso integrado em um conjunto, dando a impressão de que foi mera coincidência de que todas aquelas entidades, aquelas lojas, aqueles comerciantes, que lá se encontram alojados para vender suas mercadorias, ali estão por acaso. Mas não estão. Tudo foi objeto de um estudo prévio, um estude de marketing, um exame de viabilidade de sua promoção, a começar de sua localização.
Os centros comerciais - shoppings centers - funcionam como pequenas cidades, possuindo uma estrutura governamental (a administração) e seus serviços de polícia e bombeiros (segurança), de limpeza, de abastecimento de água, de manutenção de infraestruturas lazer, etc, o que pode-se concluir que não basta a construção de aglomerados de lojas nas ruas de uma cidade ou daquelas localizadas dentro de uma galeria de um prédio comercial. Há sim necessidade de que exista uma disposição arquitetônica apurada das lojas em seu interior, com um planejamento adequado e um sentido organizacional apurado.
E dentro desta disposição e planejamento, os pontos fundamentais que compõem a estrutura de um shopping centers, são:
- Lojas âncoras: são lojas de grande porte que incentivam a visita dos consumidores ao shopping center
- Lojas semi-âncoras: em geral lojas de "grifes", com determinada linha de mercadoria, em grande escala, com ampla variedade de produto
- Lojas satélites: são lojas com áreas menores, que compõem o "mix" dos shoppings centers
- Tenant mix: é a estruturação do complexo de lojas, com o fito de atender o objetivo comercial almejado pelo empresário, que é um shopping center. O tenant mix aufere aos lojistas, invariavelmente, um considerável benefício, pois os consumidores são atraídos pela organização do shopping center que, pela distribuição planejada, atenderá às suas múltiplas necessidades. Os lojistas, assim, beneficiam-se com a clientela definido do shopping center.
- Clientes de corredores: é um conceito formado a partir da perspectiva de não possuir lojas voltadas para a rua, com o fim de estimular a circulação dentro do centro comercial e o consequente interesse por todas as lojas que o integram.
A complexidade de todas as características que sustentam um shopping center, como não poderia ser diferente de ser, está associada a um contrato igualmente complexo. Os documentos que integram este universo são: o Contrato de Locação (definirá as relações entre locador e locatário), a Escritura Declaratória de Normas Complementares e o Estatuto da Associação dos Lojistas (Documento que cria o vínculo entre os lojistas do shopping).
Inicialmente, para o entendimento da matéria é importante dizer que a relação locatícia estabelecida entre o empreendedor e o locatário é uma relação que resulta em um contrato atípico, permitido pela lei, através do teor do art. 425 do Código Civil:
"É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código."
Os contratos de locação dos shoppings centers, são regidos pela lei 8.245/91, em que no seu artigo 54, a lei do inquilinato dispõe:
"nas relações entre lojistas e empreendedores de shopping center, prevalecerão as condições livremente pactuadas nos contratos de locação respectivos e as disposições procedimentais previstas nesta lei"
Desta forma, prevalecerão as condições livremente pactuadas entre lojistas e shopping center. As cláusulas contratuais são respeitadas com base no chamado princípio do pacta sunt servanda, segundo o qual deve-se cumprir exatamente o que foi estipulado em contrato.
Com base nas leis acima, os contratos locatícios dos imóveis em shopping center são determinados através de: aluguel mínimo e aluguel em percentual sobre as vendas.
No caso do aluguel mínimo, o empreendedor fixa a verba de locação de cada unidade, que é determinada pelo metro quadrado na região e na localização do empreendimento, prática no mercado imobiliário. É uma quantia fixa estabelecida, devida na eventualidade do valor do aluguel percentual não alcançar o valor da quantia fixa.
No aluguel em percentual, é aplicado sobre o faturamento bruto da loja, sendo devido quando exceder o aluguel mínimo e naquilo que o ultrapassar; em regra, esse percentual é de 7%. Neste cenário o empreendedor fiscaliza o caixa do lojista para precisar o faturamento bruto periódico.
Ainda na determinação do locativo, é estipulado um índice de rateio de despesas (espécie de condomínio), e, dependendo das condições contratuais, incorporam-se os fundos de promoção (verbas para campanhas de publicidade do shopping) e aluguéis em dobro em meses específicos (para suprir necessidade de novas contratações de pessoas para limpeza, segurança, organização, além das despesas de décimo terceiro salário, eventos promocionais, etc).
Importante destacar que as locações em shopping são peculiares pela sua complexidade. Existem nos contratos de locação em shopping center uma natureza dupla, com identidade ao de uma locação singela e sob outro aspecto, um contrato atípico.
Independentemente da classificação, com o covid-19, as relações jurídicas entre locador e locatário dos shoppings centers foram impactadas diante da pandemia e dos órgãos governamentais, tais como o fechamento destes estabelecimentos comerciais, ainda que transitoriamente, a proibição de uso de provadores, a abertura com apenas 20% da capacidade de público, a redução de horas de abertura das lojas, entre outros, resultando numa diminuição do fluxo de consumidores, fazendo com que muitos lojistas buscassem a renegociação contratual, com o objetivo de reduzir seus custos ocupacionais e operacionais, com o fito de evitar o encerramento de seus negócios.
Os impactos econômicos ocasionados pela covid-19, ao longo de 2020 no faturamento de shopping centers, significaram um decréscimo de 33,2% segundo a ABASCE, fazendo com que este setor recuasse aos níveis de venda de 2009.
Sobre a taxa de vacância, a ABRASCE informa que, no ano de 2020, atingiu-se 9,3% em shoppings tradicionais; e, nos shoppings mais novos, esse percentual chegou a ser o dobro. Houve uma queda de visitas mensais aos shoppings de 32%, e redução de 9,4% no número de vagas de empregos.
Com o fechamento dos shoppings, os lojistas passaram a enfrentar dificuldades em arcar com os custos de aluguel, condomínio, fundo de propaganda e promoção, além dos salários de seus funcionários. Por outro lado, as administradoras também precisam honrar seus compromissos, de tal forma que equilibrar esta equação tornou-se um grande desafio.
É do conhecimento que muitos contratos foram feitos quando a economia estava em expansão. Entretanto, com a queda de receita, os lojistas não têm conseguido cumprir com os valores acordados nos contratos. Cerca de 75% das lojas de shopping são pequenas, e nestas lojas, antes da crise, seu lucro líquido girava em torno de 8% a 10%; hoje, está negativo ou perto de zero, de acordo com a Alshop (Associação de Lojistas de Shoppings), que representa o segmento dos lojistas varejistas.
Assim, dentro do atual cenário da econômica provocado pela covid-19, a ABRASCE (Associação Brasileira de Shoppings Centers) e a ALSHOP (Associação Brasileira de Lojistas de Shoppings) buscaram entendimentos sobre a matéria "Contrato de Locação", entre as instituições shoppings e lojistas, chegando a um consenso de que a melhor solução seria uma renegociação direta entre eles, tendo por objetivo manter o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, evitando-se que apenas uma parte fosse prejudicada.
E neste escopo, os shoppings se viram obrigados a oferecer auxílios aos lojistas como descontos, suspensões ou adiamento do pagamento do aluguel mínimo, além da interrupção do fundo de propaganda e promoção (FPP), assim como descontos nos condomínios. Salienta-se que, apesar dos esforços de redução de custos e busca por linhas de crédito, a lucratividade e liquidez de lojistas, em especial os de menor porte, para os quais o crédito bancário é escasso, levando ao aumento da inadimplência junto às administradoras
No entanto, se, apesar de todos os esforços e das orientações, não se obtiver êxito na renegociação, a alternativa será o ajuizamento de uma ação judicial para revisão dos valores pagos.
Atualizado em: 4/5/2021 12:33
Luiz Paulo Gião de Campos - Perito judicial e assistente técnico. Consultor do escritório Lopes & Giorno Advogados.
Fonte: Migalhas de Peso
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