sábado, 16 de setembro de 2017

ALUGUEL DE IMÓVEIS E OS RISCOS DO SEGURO FIANÇA


O aluguel de imóveis no Brasil é complexo e exigiu a criação de diversas leis que foram sendo aperfeiçoadas com o passar do tempo. Comprovou-se que a atuação das imobiliárias é essencial para amenizar os riscos decorrentes da inadimplência dos inquilinos. Contudo, de tempos em tempos surgem novidades muito atraentes que ao final descobrimos ser uma ilusão, como a promessa da administradora ou imobiliária pagar o seguro fiança no lugar do inquilino, de maneira que essa empresa venha a desenvolver sua atividade mesmo tendo prejuízo.

A experiência comprova ser impossível conduzir uma locação por meio virtual, pois computador não tem como avaliar e nem pesquisar in loco vários imóveis para apurar o valor de mercado, fazer a vistoria de maneira a cobrar os danos provocados pelo inquilino, negociar os reajustes, uma reforma e muito menos resolver os conflitos que surgem em qualquer locação.

Em geral, o maior risco de prejuízo numa locação ocorre no momento da desocupação do imóvel, pois nessa hora o inquilino não se preocupa tanto com sua imagem e assim, muitas vezes, deixa de cumprir suas obrigações já que está indo embora. É, ao final da locação, que se mostra importante a solidez dos fiadores ou de outro tipo de garantia, como o seguro fiança ou um depósito de valor expressivo em um título de capitalização.

Imobiliária iniciante e a ilusão da locação rápida

Algumas imobiliárias principiantes locam o imóvel para qualquer um, fazendo parecer que sua rapidez é eficiência. Em geral, ligam para o proprietário alegando que já têm um pretendente excelente e assim procuram pegar as chaves para induzi-lo a permitir que venham a promover também a locação. Cometem a falta de ética de criticar a imobiliária que trabalha com seriedade, que tem a preocupação de fazer uma locação segura, o que exige critério para aprovar as fichas do inquilino e dos fiadores.

Essas imobiliárias aventureiras, que felizmente são exceção, apregoam que são mais ágeis e assim, com a única intenção de ganhar de imediato a taxa de contrato/cadastro e a comissão mensal, fazem a locação de maneira descuidada, contando com o fato de o locador ser leigo e que este não conferirá a precariedade do cadastro, que às vezes, nem é realizado.

Nova onda da internet pode gerar uma surpresa

Desde 2014, com o grande crescimento de oferta de imóveis após o boom imobiliário, surgiram algumas startups focadas no setor de locação de imóveis. Têm tudo para ser a nova versão da Bolha da Internet, que alguns se lembram como “Bolha das Empresas ponto com” que foi uma bolha especulativa criada no final da década de 1990, que gerou uma forte alta das ações das novas empresas de tecnologia da informação e comunicação baseadas na internet. Milhares de pessoas perderam fortunas após a especulação atingir o auge em 10/03/2000 na Bolsa de Nova Iorque, tendo a partir de 2001, a Nasdaq despencado e a bolha se esvaziado rapidamente com algumas empresas “ponto com” sido vendidas ou absorvidas por fusão, sendo que a maioria quebrou ou desapareceu.

Essas novas imobiliárias do futuro que surgiram de startups, têm prometido a locação milagrosa, como se só existissem pessoas honestas. Certamente, essa forma de trabalhar seria viável na Suécia, Nova Zelândia, Noruega, Suíça ou Canadá, onde a justiça é pouco acionada, sendo até dispensável os fiadores. Bem diferente do Brasil, onde é comum ações de cobrança de aluguéis que demoram anos e ser raridade o imóvel ser devolvido espontaneamente em perfeito estado.

Você acredita numa empresa que trabalha para ter prejuízo? 

Essas imobiliárias virtuais prometem o milagre de pagar o seguro fiança que tem o custo entre 9,6% a 15% ao mês, apesar de receber apenas 10% de comissão do locador. Fica evidente que há algo errado! Nenhuma imobiliária de verdade se mantem com 0,4% de comissão ao mês, a não ser que seja na realidade uma corretora de seguros que tem outro foco de serviços. Ao verificar o contrato social e o CNPJ de algumas delas percebe-se que o foco não é realmente administrar uma locação de maneira a proteger o locador, mas sim criar uma carteira de clientes que será negociada futuramente de maneira a obter uma vantagem financeira nesses negócios do outro mundo. Quer comprovar? Peça o balanço da imobiliária e solicite explicações sobre como ela consegue pagar as despesas operacionais.

É comum o locador perceber que foi mal assessorado somente na ocorrência de despejo por falta de pagamento ou no ato da cobrança dos danos do imóvel, quando toma conhecimento do péssimo negócio realizado pela suposta imobiliária. Esta não diz que o seguro de 9,6% tem várias limitações, sendo que não garante a pintura e os danos do imóvel.

Seguradora quando vê o prejuízo sai fora do problema

Atuar no ramo imobiliário não é para amadores, pois basta vermos a história que comprova os vários insucessos de grandes cias seguradoras que lançaram o seguro fiança locatícia sem ter pleno domínio do assunto. Uma coisa é vender garantia e outra muito diferente e entender a Lei do Inquilinato e os desdobramentos desse setor de alta complexidade. Se garantir as obrigações de uma locação fosse simples, o seguro fiança criado desde 1979 pela Lei n° 6.649, já seria sucesso há décadas.

Somente em 1994, após a Lei nº 8.245/91, esse seguro começou a ser oferecido, sendo que nesses 23 anos diversas Cias. Seguradoras fracassaram ao tentar emplacá-lo.

Dentre as Cias. que trabalharam com o Seguro Fiança e encerraram as atividades, temos a União, Rural e a Phenix, seguradoras que não constam mais na Superintendência de Seguros Privados (SUSEP). Depois vieram a Sauex que atuou até abril 2001, a Martinelli até março 2003 e a Interbrasil que desistiu em junho de 2005. Há ainda grandes seguradoras que têm o produto quase paralisado, pois não conseguiram viabilizá-lo. Várias seguradoras tiveram enormes prejuízos com fraudes, má gestão, pois desconheciam as particularidades da Lei do Inquilinato e a morosidade da Justiça contra os devedores numa locação.

Corretor travestido de imobiliária

O corretor de seguro travestido de imobiliária falta com a verdade ao dizer que o seguro de 9,6% garante tudo, pois no momento da renovação do seguro, se houver sinistro, o valor do seguro subirá expressivamente e o locador terá surpresas, não adiantando reclamar no site que ficou sem qualquer garantia apesar do imóvel estar ocupado. Essa possibilidade de problemas é real diante do aumento do desemprego e do desaquecimento da economia, pois a história comprova como é complicado aventurar nesse mercado.

Kênio de Souza Pereira - Advogado e presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG.

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