Neste artigo vou tratar especificamente sobre as novas regras da alienação fiduciária de imóveis.
Antes de explicar o tema, é importante observar que as modificações da legislação facilitaram a vida das construtoras e incorporadoras, de modo que o procedimento ficou mais rigoroso e duro para aquele que compra o imóvel, caso se torne inadimplente com as obrigações.
Note que em momento algum ocorre a participação do Poder Judiciário. Ou seja, o procedimento de cobrança não vai parar na justiça, nas mãos de um Juiz. Tudo é feito de forma extrajudicial, no Cartório de Registro de Imóveis.
II – O QUE É ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL?
Ultrapassada a introdução, é preciso esclarecer o que é a alienação fiduciária e por que é importante que você conheça as regras trazidas em Julho de 2017.
Pois bem. A alienação fiduciária é uma garantia atribuída pelo devedor (fiduciante), que transfere a propriedade de seu imóvel ao credor (fiduciário), até que pague a dívida.
Na prática, o devedor continua utilizando um bem que não mais lhe pertence. Uma vez paga a dívida, o devedor, automaticamente, volta ser o proprietário da garantia. Na hipótese de não pagamento do débito, o credor, titular do bem, poderá, rapidamente, reaver a posse direta das mãos do devedor e efetuar a execução da garantia, alienando-a.
Note que é diferente da hipoteca, procedimento em que há a necessidade da participação do Poder Judiciário.
Quando se compra um imóvel na planta, por exemplo, este instituto tem sido muito utilizado por sua segurança e celeridade.
A Lei que regula o procedimento é a Lei nº 9.514/1997.
III – PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL NO CASO DE INADIMPLEMENTO – CONSIDERANDO AS ALTERAÇÕES DA NOVA LEI
Para efeito ilustrativo, imagine-se que o devedor (fiduciante) não paga em dia suas prestações de seu financiamento imobiliário (sendo utilizado da alienação fiduciária de imóvel).
Após o vencimento e ultrapassado o eventual prazo de carência concedido em contrato, ocorre a constituição em mora do fiduciante, de modo que ele é notificado pra pagar em 15 dias todos os valores, juros, penalidades, encargos, tributos, condomínios e despesas de cobrança.
E quando se menciona todos os valores, leia-se os vencidos e os que se vencerem até a data do pagamento, conforme o art. 26, §1º da Lei 9.514/97.
A notificação é realizada através do Oficial de Registro de Imóveis, que poderá delegar a atribuição ao Oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio do notificado.
De forma que o próprio oficial do cartório (de registro de imóveis ou de títulos e documentos) vai “notificar” o devedor do pagamento da dívida.
E se o devedor se esconder, se ocultar de alguma forma? A Lei 13.465/17 trouxe uma regra nova, segundo a qual quando o oficial houver procurado o devedor por duas vezes sem o encontrar, se houver suspeita de ocultação, ele poderá intimar qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho de que, no próximo dia útil, retornará ao imóvel para efetuar a intimação, na hora que designar.
E no caso de condomínios com controle de acesso (portaria), a intimação indicada acima poderá ser feita ao funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência.
Note que mesmo que o devedor se esquive de receber a intimação, não é possível alegar seu desconhecimento. Trata-se de uma medida que facilita o procedimento.
É possível, também, a citação por edital. O Oficial do cartório (Registro de Imóveis) publicará por 3 (três) dias em jornal local de grande circulação a citação do devedor, valendo como citado.
Após os 15 dias, há dois caminhos. O não pagamento da dívida ou o pagamento no cartório (purgação da mora no registro de imóveis).
Caso ocorra o pagamento no cartório, nos 3 dias seguintes, ocorre a entrega dos valores ao fiduciário, descontadas as despesas de cobrança e intimação.
No caso de financiamento com recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (inclusive Minha Casa Minha Vida), a consolidação da propriedade se dá em 45 dias, levando-se em conta os 15 dias da notificação e 30 dias previstos no art. 26-A, §1º da Lei.
No caso do não pagamento pelo devedor, ocorre a consolidação da propriedade em nome do fiduciário com o pagamento do ITBI e, se for o caso, do laudêmio. O que quer dizer que se o devedor (aquele que comprou o bem) não pagar, no próprio cartório ocorrerá o procedimento para que a propriedade volte para aquele que “vendeu” o imóvel.
Uma vez consolidada a propriedade em nome do fiduciário, em 30 dias este promoverá público leilão para a alienação do imóvel. De modo que o imóvel ira a leilão para sua venda.
O primeiro leilão será pelo valor do imóvel indicado no contrato ou sobre o valor de referência para o ITBI, o que for maior (inovação do art. 39, parágrafo único da Lei).
Se neste primeiro leilão o maior valor oferecido for inferior ao valor do imóvel ( na forma do dispositivo anterior) será feito um segundo leilão em até 15 dias do primeiro. Este segundo, pelo valor mínimo do saldo devedor total e despesas, consideradas incluídas no valor as benfeitorias, que não dão direito de retenção.
Caso o valor da arrematação seja superior ao da dívida e das despesas, ocorre a entrega do valor que sobejar ao devedor.
Caso o valor da arrematação seja inferior ao da dívida e das despesas, fica o devedor exonerado, recebendo quitação da dívida em 5 dias.
As datas e locais dos leilões serão comunicados ao devedor, mediante correspondência dirigida ao endereço constante do contrato.
IV – COMO ERA ANTES DA LEI 13.465/17
Antes da entrada em vigor da Lei 13.465/17, o STJ havia alterado substancialmente o sentido da Lei 9.514/97, dificultando a recuperação do crédito.
O primeiro obstáculo a dificultar a recuperação do crédito era a aplicação do Decreto Lei 70/66 e conseguinte necessidade de intimação pessoal do devedor acerca da data do leilão. Entendia-se que era necessária a intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial (REsp 1447687/DF e AgRg no REsp 1367704/RS).
Apesar de não mais se aplicar o Decreto-Lei 70/66, a Lei 13.465/17 trouxe disciplina propria para a comunicação dos leilões, de modo que serão comunicados ao devedor mediante correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico, conforme já explicado acima (art. 27, §2º-A da Lei 9.514/97).
Outro obstáculo era a purgação da mora até a assinatura da arrematação (REsp 1.433.031/DF e REsp 1447687/DF).
V – CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Lei 13.465/17 chegou ao mundo jurídico em Julho de 2017 e facilitou, em muito, a vida dos profissionais que vendem imóveis se utilizando da figura da alienação fiduciária de imóvel, em especial as construtoras e incorporadoras. E dificultou a vida do comprador do imóvel, de forma que para este, é preciso saber realmente se conseguirá pagar integralmente seu financiamento imobiliário. Pois, como já afirmado, a retomada por parte da construtora é célere e dispensa a utilização da justiça.
Fellipe Duarte - Especialista em Direito Imobiliário