Considero esta newsletter proveitosa para você, que se interessa pela perícia judicial: ela contém um resumo de informações acerca das perguntas (quesitos) que o perito deve responder no seu laudo ou em complementação a ele.
Os quesitos são elaborados estrategicamente pelo advogado com a ajuda do assistente técnico.
O antigo Código de Processo Civil – CPC era bem claro quanto à definição de cada modalidade de quesito. O novo CPC nada mudou em relação a isso, porém deixou clara a possibilidade de utilização dos quesitos complementares, que antes já eram usados.
As respostas dos quesitos dadas pelo perito, nas modalidades exibidas nesta newsletter, são utilizadas pelo assistente técnico em seu laudo, a fim de corroborar e enfatizar a sua tese. Em um mesmo sentido, o advogado utiliza as respostas para defender aquilo que pede definitivamente no processo. Os dois pretendem que o juiz utilize as respostas como fundamentação da sentença, a favor de sua parte.
Vejamos a seguir os tipos de quesitos que, facultativamente, as partes e o juiz podem fazer.
Quesitos normais
Os quesitos normais, ou que podemos denominar quesitos regulares, são apresentados pelas partes junto com o nome dos assistentes técnicos, antes de o perito efetivar a proposta de honorários e do início de perícia. Os quesitos normais deverão ser sugeridos pelo assistente técnico da parte ao advogado, caso esta tenha contratado algum. O advogado analisará se junta ou não as sugestões. Obviamente, os quesitos normais estão previstos no novo e no antigo Código de Processo Civil.
Os quesitos regulares devem ser respondidos conclusivamente pelo perito. O assistente técnico, por sua vez, não é obrigado a responder.
Art. 465 do novo CPC. ...
§ 1o Incumbe às partes, dentro de 15 (quinze) dias contados da intimação do despacho de nomeação do perito:
I - arguir o impedimento ou a suspeição do perito, se for o caso;
II - indicar assistente técnico;
III - apresentar quesitos.
§ 2o ... § 3o ... § 4o ... § 5o ... § 6o ...
Quesitos complementares
Os chamados quesitos complementares não existem, já que não estão previstos no antigo Código de Processo Civil, nem no novo; porém, eles de fato existem, se considerarmos o fato de serem praticados de norte a sul do país, utilizando-se a mesma denominação do que não existiria.
Os quesitos complementares eram utilizados pelas partes como meio de pedir explicações aos peritos quanto às dúvidas que tinham sobre o laudo, na vigência do antigo CPC. Os juízes, com receio de serem acusados de cerceamento de defesa ou de direito ao contraditório, mesmo quando as partes tinham a intenção de meramente protelar o processo, deixavam os quesitos complementares passarem, obrigando o perito a voltar ao processo para responder coisas, sem necessidade.
Na verdade, o instrumento do antigo Código de Processo Civil para tirar dúvidas era o perito respondê-las em audiência de instrução e julgamento. Para que ocorressem os esclarecimentos, a parte deveria fazer as perguntas com as dúvidas, sob a forma de quesitos. Entretanto, os advogados não gostavam de recorrer a esse instrumento, logicamente porque o perito experiente responderia as dúvidas, veementemente, com as mesmas palavras que colocou no laudo. Dava, assim, mais corpo ao laudo como prova, a qual o perito deseja que seja indiscutível. Fato que advogados, igualmente experientes, procuravam evitar, pois a situação poderia fugir ao controle.
Para se ter uma ideia da não utilização da audiência de instrução e julgamento com a finalidade de tirar dúvidas do laudo, um perito com uma grande quantidade de laudos realizados em um ano apenas iria a uma audiência para esclarecer algum, no mesmo período.
Então, em substituição à audiência que esclareceria dúvidas, os advogados preferiam apresentar os tais quesitos complementares, quando da vigência do antigo CPC.
O legislador do novo CPC percebeu a prática dos quesitos complementares e incluiu nele um instrumento que obriga o perito a responder, por escrito, as dúvidas que a parte tenha sobre o laudo, se o juiz assim determinar, em um prazo de quinze dias. Dessa forma, ficam previstos, indiretamente, os quesitos complementares.
No mesmo novo CPC, se ainda restarem dúvidas, após as explicações dadas às indagações formuladas na forma de quesitos complementares ou de outra forma, somente restará à parte peticionar, requerendo que o perito as responda na audiência de instrução e julgamento.
A partir do momento em que o novo Código de Processo Civil não permite mais questionamentos acerca do laudo do perito depois da audiência de instrução e julgamento, ele pretende acabar, definitivamente, com as idas e vindas do perito ao processo para explicar o seu laudo, depois que o entregou, a fim de responder a lotes de quesitos complementares, que levam a postergar o processo, invariavelmente de valor da causa elevado, por tempo indeterminado. Peritos reclamavam dessa prática nociva, à época do antigo CPC.
O assistente técnico deve incluir, no seu parecer, perguntas para o perito responder sobre a discrepância do seu parecer com o laudo do perito ou com perguntas relativas à obscuridade do laudo ou sua falha visível. Ou, ainda, o assistente poderá fornecer as mesmas perguntas ao advogado, a fim de que, na forma de quesitos complementares, obrigue o perito a se explicar sobre eventuais erros, discrepâncias com o parecer e obscuridades que o laudo possua.
De onde saiu a possibilidade de o assistente técnico fazer quesitos no seu parecer para o perito responder? O novo Código de Processo Civil – CPC abre claramente essa possibilidade que, no antigo, não ficava claro. O artigo 477 do novo CPC, parágrafo segundo, inciso dois, estabelece que o perito deverá esclarecer ponto divergente apresentado no parecer do assistente técnico da parte. Dessa forma, o assistente pode apontar a divergência entre o que pensa e o laudo do perito, em seu parecer, pedindo, ali, para que o perito responda as contradições e os pedidos de complementação do laudo, na forma de quesitos.
O artigo 477 do novo CPC explica tudo o que pode acontecer depois que o perito entrega o laudo. Veja a seguir.
Art. 477 do novo CPC. O perito protocolará o laudo em juízo, no prazo fixado pelo juiz, pelo menos 20 (vinte) dias antes da audiência de instrução e julgamento.
§ 1o As partes serão intimadas para, querendo, manifestar-se sobre o laudo do perito do juízo no prazo comum de 15 (quinze) dias, podendo o assistente técnico de cada uma das partes, em igual prazo, apresentar seu respectivo parecer.
§ 2o O perito do juízo tem o dever de, no prazo de 15 (quinze) dias, esclarecer ponto:
I - sobre o qual exista divergência ou dúvida de qualquer das partes, do juiz ou do órgão do Ministério Público;
II - divergente apresentado no parecer do assistente técnico da parte.
§ 3o Se ainda houver necessidade de esclarecimentos, a parte requererá ao juiz que mande intimar o perito ou o assistente técnico a comparecer à audiência de instrução e julgamento, formulando, desde logo, as perguntas, sob forma de quesitos.
§ 4o O perito ou o assistente técnico será intimado por meio eletrônico, com pelo menos 10 (dez) dias de antecedência da audiência.
Quesitos suplementares
A apresentação dos quesitos suplementares só é possível do momento em que o perito pegou o processo para começar a perícia até o momento em que ele entrega o seu laudo.
Poucos assistentes técnicos sabem que as partes no processo judicial podem apresentar quesitos suplementares. No entanto, eles podem constituir verdadeira estratégia de ataque. Até mesmo advogados experientes deixam de apresentá-los por falta de conhecimento ou falta de lembrança. Na verdade, o assistente técnico é quem deve alertar o advogado da parte que representa a respeito da possibilidade de apresentar quesitos suplementares. Por isso, é sempre importante que a parte indique um assistente técnico conhecedor da prática e da burocracia forense se deseja realmente ser bem-representada na perícia judicial. Isso porque a falta de ação de um assistente técnico, no processo, pode chegar ao nível de tornar-se calamitosa.
O assistente, ao não ser acolhido pelo perito, no pedido de aplicar esforços em determinada diligência, cuja necessidade foi somente detectada no decorrer da perícia, pode se dirigir ao advogado e comunicar o fato. Na ocasião, sugeriria, desde logo, quesitos suplementares que viriam obrigar o perito a realizar tal diligência.
Assistentes técnicos mais experientes costumam ficar atentos aos procedimentos do perito durante as vistorias, exames de pessoas e de documentos ou trabalhos em que atuam conjuntamente, a fim de detectar qual é o entendimento que o perito está tendo sobre o objeto da perícia e qual direção tomará o laudo.
Se o assistente perceber que é necessário colocar o perito em outra direção, a propósito de que ele investigue e estude fatos e técnicas que favoreçam a tese da parte que representa, impõe-se ao assistente formular quesitos suplementares e propô-los ao advogado, que, julgando conveniente, os juntará ao processo.
Em uma situação hipotética, pode o assistente técnico pedir para o perito entrevistar uma testemunha sobre o objeto da perícia, e ele se negar. O que faria o assistente frente à negativa: reclamaria, no seu parecer, que o perito não procurou a pessoa para obter informações? Nesse caso, “o leite já estaria derramado”, pois o perito, então, teria entregue o laudo, e as informações importantes não estariam constantes nele.
Quando sabe da utilidade de quesitos suplementares, na conjectura proposta acima, o assistente técnico reúne-se com o advogado da parte que representa e informa a negativa do perito em entrevistar a testemunha. De imediato, sugere quesitos suplementares que obriguem o perito a procurar a testemunha em busca de informações sobre a perícia. Pronto! O perito estaria colocado nos trilhos. As respostas dadas pelo perito, nos quesitos suplementares, seriam muito bem desenvolvidas pelo assistente no seu parecer e, claro, o advogado daquela parte, também.
O assistente tem quinze dias para apresentar o seu parecer técnico, depois que o perito entrega o laudo. Consequentemente, o assistente lê o laudo do perito no processo, e aproveita, no parecer, aquilo que o perito escreve. Por exemplo: os resultados da entrevista com a testemunha.
O perito tem fé pública: aquilo que ele escuta da testemunha e coloca no laudo tem carácter fidedigno. Lógico, o depoimento obtido pelo perito tem um peso maior do que o obtido pelo assistente. Então, o assistente técnico utiliza o depoimento escrito pelo perito na construção de sua tese – ou seja, o perito fornece munição para o assistente sustentá-la.
Da mesma forma, como nos quesitos regulares, o perito é obrigado a responder os quesitos suplementares, concludentemente; já o assistente técnico sequer necessita contravir.
No artigo 469 do novo CPC, abaixo, vemos quando podemos apresentar quesitos suplementares.
Art. 469 do novo CPC. As partes poderão apresentar quesitos suplementares durante a diligência, que poderão ser respondidos pelo perito previamente ou na audiência de instrução e julgamento.
Parágrafo único. O escrivão dará à parte contrária ciência da juntada dos quesitos aos autos.
Rui Juliano é perito judicial, constantemente nomeado, desde 1983. Autor do livro Manual de Perícias, obra de referência, com 600 páginas, seis edições, sendo a última atualizada pelo novo Código de Processo Civil e ministrante do curso presencial Perícias Judiciais, desde 2001, com edições periódicas em vinte capitais e nas principais cidades do país. Ministrante do curso a distância Perícia Judicial Online desde 2006 e do curso a distância Perícias de Cálculos Financeiros e Trabalhistas, do qual é também coordenador, desde 2009. Criador e fornecedor permanente de conteúdo do acesso restrito a assinantes do Roteiro de Perícias. Criador do site www.manualdepericias.com.br e do Cadastro Nacional de Peritos, disponíveis desde 1997. Autor do conteúdo gratuito publicado no site www.ruijuliano.com, desde 2017.
Bem didático e elucidativo. Nada como ter a experiência na área. Este tipo de conhecimento, de dicas, não tem preço
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