É razoavelmente costumeira durante o período contratual, a modificação das condições da locação, sem a respectiva expressão por escrito. Mas, nem por isso essas modificações deixam de ser validadas juridicamente, malgrado algum dos contratantes possa tentar acusar a existência de infração contratual, objetivando a rescisão e a imposição dos seus consectários.
Ora, essas situações merecem ser apreciadas sob os prismas da preservação da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual e, brevemente, pode ser alinhado:
Como entender o que foi contratado?
É regra tradicional de interpretação do contrato, que ele seja compreendido como sempre o foi pelos pactuantes, como ele foi operado ou executado ao longo do tempo. Ninguém há de entender o combinado melhor do que aqueles que se acertaram e, esta certeza não é nova: trata-se de regra de interpretação já prevista em 1850, no Código Comercial (art. 131), sempre perseguida, aliás, a intenção dos contratantes, em supremacia ao sentido literal do texto (Código Civil antigo: art. 85; Código Civil atual: art. 112).
Até que ponto vale quanto constar em modelos de contrato?
É popular o uso de "modelos", sejam os atualmente localizados na internet, sejam aqueles antigamente vendidos em papelarias e, parece óbvio que são precariamente assumidas as disposições desses modelos pelos contratantes, voltando-se à necessidade de análise da execução do pacto, para conclusão sobre o que foi efetivamente combinado.
Como suprir dúvida em contrato de adesão?
Nesses contratos, assim como naqueles que praticamente o sejam (por aí estão contratos de locação que, embora adequados em algumas particularidades, não deixam de ser contratos de adesão), deve ser recordado o conceito presente no antigo Código Civil, no novo Código, no Código de Defesa do Consumidor e em tantos outros diplomas: na dúvida, será privilegiada a posição do aderente.
Sempre será considerado ilícito o desrespeito ao contrato?
Não, pois a doutrinariamente denominada excludente de ilicitude, pode estar presente, se o contratante (em especial, o que acusou a infração) sempre tiver anuído com o comportamento apontado. Em locação, existem situações clássicas de anuência e exclusão da ilicitude, valendo trazer dois exemplos: 1º) previsto o pagamento do aluguel no dia 5, desde sempre ele tenha se realizado no dia 8, sem protesto ou pena; 2º) previsto o exercício de determinada atividade no imóvel, sempre tenha sido desempenhada outra, complementar ou não.
Quando efetivamente houver infração, sempre será punida?
Nem sempre, e a jurisprudência – em coerência com a boa doutrina - tende a somente punir a prática que lese a outra parte; aquela infração que seja efetiva, que seja grave e traga riscos ou danos reais ao outro contratante. Somente então se passará à rescisão da locação pela prática de infração legal ou contratual, prevista no art. 9º, inciso II da Lei n. 8245/91.
É necessário notificar antes de acionar?
Nessas situações que logicamente remanescem por muito tempo e parecem – se pouco – representar o consenso dos interessados, é preciso apontar o intento, antes de manejar-se ação judicial, até em benefício da supressão do comportamento repentinamente tido como inadequado. Alteradas consensualmente as estipulações expressamente contratadas, a nova pretensão de interpretação configurará verdadeira e lógica alteração do desempenho contratual, devendo, portanto, ser manifestada em interpelação, sob pena de findar inviabilizada a ação judicial.
Como realizar provas judiciais nessas situações?
É claro que uma das partes defenderá a leitura literal do contrato; mas à outra, cumprirá utilizar todos os meios legalmente admitidos, tais como a prova testemunhal, a prova pericial (exame, vistoria, avaliação) quando cabível, a juntada de documentos (recibos, fotografias, memorandos, matérias jornalísticas) e até a inspeção judicial, em algumas circunstâncias o melhor meio de se averiguar, imediatamente, a verdade.
Logo, pode ocorrer alteração consensual e não escrita, do contrato de locação, sendo viável a sua prova através de todos os meios disponíveis em lei, sobrepondo-se na análise do caso concreto, o intento real dos contratantes em detrimento da literalidade do contrato, sempre mantida atenção à prevalência da boa-fé objetiva.
Fonte: Revista Jus Navigandi
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