Resumo: Passados oito anos, com o advento da Nova Lei do Inquilinato, Lei Nº 12.112/09 que alterou a antiga Lei n.º 8.245/91, trouxe a adequação do texto normativo à realidade dos contratos de locação de imóveis urbanos comercial e residencial, abrangendo aspectos do direito material e processual, de maneira que as alterações se mostraram necessárias, já que a Lei do Inquilinato, desde 1991 não tinha sofrido alterações significativas. Assim, o presente artigo objetiva analisar os aspectos instrumentais da alteração legislativa supra, trazendo as principais consequências e alterações do referido corpo normativo.
1 Procedimentos e disposições gerais das Ações Locatícias
As Ações Locatícias são a instrumentos jurídicos elencados no ordenamento pátrio, à disposição dos entes titulares das relações negociais de locação, com o fim de resguardar os direitos do locador e locatário, seja através da restituição da posse do imóvel locado, ou pela garantia do pagamento eficaz, revisão dos preços, bem como a renovação do contrato locatício.
Correspondem as Ações Locatícias às Ação de Despejo, Ação de Consignação de Pagamento de Alugueres, Ação Revisional de Aluguel e a Renovatória de Locação, esta última, ênfase do presente trabalho. Tratar-se-á genericamente sobre as três e buscar-se-á abordar os principais aspectos doutrinários e instrumentais da Ação Renovatória de Locação à Luz da Lei Nº 8.245/91 com as Alterações da Lei Nº 12.112/09 (Nova Lei do Inquilinato).
Conforme leitura atenta à Lei nº 12.112, de 09 de dezembro de 2009, denominada Nova Lei do inquilinato, observa-se o destaque das suas disposições gerais que abrangem as quatro ações, assim como, capítulo específico normatizando o procedimento peculiar a cada tipo de ação locatícia.
A referida lei supracitada dispõe sobre as normas que regem as locações de imóveis urbanos, bem como os seus procedimentos, uma vez que, como fora supracitado, o Código de Processo Civil não abrange as ações locatícias. No entanto, há que se atentar à regência supletiva da Lei de Ritos, que irá ocorrer quando não houver regras especificas no procedimento especial, momento em que serão aplicadas as normas do procedimento ordinário.
De acordo com o entendimento de Theodoro Jr. (2005, p. 503), As disposições gerais não incidirão sobre as demais ações locatícias, sendo reguladas pelo Código Civil e por leis especiais, nas questões relativas a:
“imóveis de propriedade da União, dos Estados e Municípios, suas autarquias e fundações públicas, vagas autônomas de garagem ou estacionamento de veículos, espaços destinados à publicidade, apart-hóteis, hotéis residências ou equiparados, arrendamento mercantil.”
As ações locatícias são ações judiciais abarcadas pelos procedimentos especiais por não se enquadrarem aos procedimentos comum ou sumário. A ação locatícia é processo de conhecimento não codificado, ou seja, o seu rito não está definido no Código de Processo Civil, mas sim pela legislação extravagante, qual seja, a Lei nº. 8.245, de 18 de outubro de 1991.
2 Aspectos Gerais da Lei n.º 12.112/09 denominada "Nova Lei do Inquilinato"
A locação corresponde à relação negocial na qual uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição. A Lei do Inquilinato, 8.245/91, surge com o intuito de viabilizar efetivamente as relações locatícias, sendo instrumento hábil a facilitar a defesa dos interesses dos entes nos negócios locatícios.
Além da característica da efetividade, a supracitada Lei foi elaborada com o intuito de trazer a pacificação para as relações entre locadores e locatários de imóveis urbanos, posto que diante da desigualdade na relação locatícia prevaleciam melhores condições para apenas uma das partes da relação locatícia. Nesse sentido, nasce a Lei n.º 8.245, de 18 de outubro de 1.991, também conhecida como Lei do Inquilinato e, objetivando amparar a parte fraca da relação, trouxe óbices na retomada do imóvel por parte do locador.
Passados oito anos, com o advento da Nova Lei do Inquilinato, a Lei n.º 12.112/09 trouxe a adequação do texto normativo à realidade dos contratos de locação de imóveis urbanos comercial e residencial, abrangendo aspectos do direito material e processual, de maneira que as alterações se mostraram necessárias, já que a Lei do Inquilinato, desde 1991 não tinha sofrido alterações significativas.
A Lei de Locações, como é conhecida a Lei nº. 8.245/91, dispõe em seu artigo 1º que ela mesma regula a locação de imóvel urbano, salvo nas exceções taxativamente dispostas por ela: quando se tratar de imóveis de propriedade da União, dos Estados e dos Municípios, bem como de suas autarquias e fundações; de vagas autônomas de garagem ou de espaços para estacionamento de veículos; dos espaços destinados à publicidade; ou de “apart-hotéis”, hotéis-residência e equiparados (aqueles que prestam serviços regulares aos seus usuários e possuem autorização para funcionarem).
As locações podem ter fins residenciais, comerciais e industriais, ou mistas (ao mesmo tempo, o imóvel se reserva à exploração de comércio e residência). A ação renovatória de locação comercial e industrial, que será detalhada com maior ênfase neste ponto, destaca-se por suas particularidades, tais como a renovação contratual, a finalidade lucrativa, os prazos, as indenizações, dentre outras.
Portanto, as regras da Lei n.º 8.245/91, vigente há dezoito anos até a elaboração da Lei n.º 12.112/09, reclamavam por mudanças já que se mostravam em dissonância com a realidade locatícia. E assim pôde ser percebida a evolução do direito nas relações locatícias através das inovações das disposições elencadas na nova Lei.
3. Aspectos Instrumentais da Ação Renovatória de Locação à Luz da Lei 12.112/09
3.1 Natureza jurídica e cabimento
A ação renovatória de locação comercial ou industrial é direito subjetivo pertencente ao empresário para renovar o contrato de locação do imóvel onde funciona o seu estabelecimento ou ponto comercial. A Lei nº. 8.245/91 define requisitos específicos para a propositura de tal demanda, a exemplo da subjetividade, do momento oportuno da sua propositura, da não interrupção dos contratos e do exercício da mesma atividade comercial.
O artigo 51 da Lei Nº 8.245/91 com as Alterações da Lei Nº 12.112/09, dispõe sobre a possibilidade de renovação do aluguel, preestabelecendo cumulativamente as seguintes condições, conforme artigo 51, in verbis:
"Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente:
I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado;
II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos seja de cinco anos;
III - o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos.
A Lei 12.112/09 denominada "Nova Lei do Inquilinato", protege e valoriza a atividade empresarial por numerosos motivos, sendo o principal deles a função social, uma vez que em razão dela, ainda que indiretamente, o comércio gera empregos, circulação de riquezas, movimentação da economia e arrecadação impostos em favor do Estado (que serão revertidos em benefícios para toda a sociedade).
O comerciante poderá renovar o contrato de locação do seu ponto comercial mediante acordo, ou, na falta deste, através de ação judicial própria. São consideradas de fins não residenciais as locações para usos de empresários, sócios, gerentes, diretores ou empregados e, atingidos os requisitos legais,as locações merecem ser renovadas. A Lei nº. 8.245/91 dispõe, em seu artigo 45, que são nulas de pleno direito as cláusulas previstas no contrato que obstam o direito à renovação.
3.2 Pressupostos e legitimação
Para que o pedido de renovação presente na ação renovatória de locação comercial ou industrial seja atendido, necessário se faz a satisfação de pressupostos basilares. Inicialmente, deve-se atentar ao prazo de cinco anos, determinado em lei, de locação daquele mesmo ponto comercial. Tal prazo poderá se perfazer pela soma de dois ou mais contratos ininterruptos, no entanto, o locatário (empresário) deve ter explorado a mesma atividade comercial ou industrial pelo tempo mínimo de três anos também ininterruptos.
O locatário interessado em exercer o seu direito de renovação deverá fazê-lo no prazo mínimo de seis meses e máximo de um ano anterior ao termo final do contrato que deseja ser prorrogado. Logo, o prazo deve ser contado retroativamente ao dia que corresponde à data do semestre ou ano anterior. Frise-se que o referido prazo é decadencial e não se interrompe nem se suspende por qualquer que seja o motivo, exceto quando não houver expediente forense, situação na qual caberá prorrogação automática da prática do ato processual até o primeiro dia útil subsequente.
A ação será considerada proposta, de acordo com a melhor doutrina, a partir do despacho do juiz ou do momento da distribuição (em havendo mais de um juízo competente naquela comarca). Na hipótese da petição inicial ser devidamente protocolada e houver eventual inércia de servidores ou do magistrado, o locatário não poderá ser prejudicado.
No tocante à exploração da atividade comercial dentro do período de três anos, pequenas alterações ocorridas dentro daquela mesma atividade não descaracterizam o requisito. Para que o locatário renove o seu contrato, exige-se apenas que o triênio de exploração se complete até a data que limita os seis meses anteriores ao direito de pedir a renovação.
Quanto à legitimação para requerer a renovação do contrato, possuem legitimidade o locatário, seus cessionários ou sucessores. A locação pode ser cedida (alienação pura e simples do fundo de comércio e não integração deste em quota social), salvo se houver expressa previsão contratual dispondo o contrário, ou ser objeto de sucessão, caso o locatário venha a falecer no exercício da sua atividade comercial.
A sociedade anônima também está legitimada a figurar como parte nas ações locatícias renovatórias e pleitear a renovação contratual, basta que os sócios sejam identificáveis e o estabelecimento comercial em questão tenha servido para a integração do capital social (quota-parte do locatário na empresa). Com a morte do sócio, poderá a sociedade dissolver-se, ou não, permanecendo com esta o direito de renovação contratual.
Mesmo na hipótese de o contrato prever cláusula proibitiva de renovação da sublocação, o sublocatário poderá exigi-la perante o sublocador, baseando-se sempre no princípio da boa-fé contratual, uma vez que deve dispor do prazo necessário à renovação e outros requisitos. Quanto à sublocação propriamente dita, a sua proibição deve ser feita por meio de cláusula contratual expressa.
A princípio, ainda que consentida, a sublocação não gera direitos e obrigações entre sublocatário e proprietário, a não ser no que se refere à inadimplência do primeiro. Numa ação judicial, o sublocatário poderá requerer a citação do sublocador e do proprietário ou tão somente do sublocador, vai depender dos prazos fixados na Lei nº. 8.245/91.
3.3 Da tramitação durante as férias forenses
O Procedimento para o transcurso das Ações Locatícias de rito especial, notadamente a Ação Renovatória de Locação, tem a característica de abranger as férias forenses. Importa informar, no entanto, o quanto trazido por Simão (2008, p.124), férias forenses e feriados são coisas distintas:
“Férias forenses são aquelas coletivas que gozam os membros dos Tribunais, de acordo com o art. 66, § 1º, da LOMAN (Lei Orgânica da Magistratura), e compreendem os períodos de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho (SANTOS, 2004, p. 448). Já os feriados são os domingos e os dias declarados por lei” (CPC, art. 175).
Impende informar que a Emenda Constitucional 45, ao acrescentar o inciso VII ao artigo 93 da Constituição, trouxe a vedação expressa das férias coletivas nas instâncias de segundo grau de jurisdição, de forma que tal atividade deverá ocorrer sem interrupções. Nesta linha de pensamento, Simão (2008), afirma que só existirão férias forenses nos Tribunais Superiores.
Há de ser considerado ainda nesta questão do prazo de tramitação, as inovações trazidas pelo Novo Código de Processo Civil, Lei Nº 13.105, de 16 de março de 2015.
3.4 Competência do forum rei sitae
A competência para a tramitação da Ação Renovatória de Locação com as alterações trazidas pela Lei 12.112/09 é estabelecida pelo critério da territorialidade. Nesse sentido, a partir de uma concepção teleológica de instrumentalidade a inovação pretende mais uma vez a efetivação da função social da empresa, já que, por esta via, a instrumentalidade do foro estabelecida passou a ter regra especial de competência.
Conforme Theodoro Jr., as Ações Locatícias têm natureza pessoal. A lei nº 8.245/91, inova ao eleger o foro da situação do imóvel, ressalvadas as hipóteses de eleição do foro através do contrato. A disciplina anterior normatizava como competente o foro do domicílio do réu, já que se submetia às regras comuns de competência.
Observa-se que a exceção à competência rei sitae elencada na legislação supra, corresponde à conveniência das partes na relação negocial, fazendo prevalecer também a vontade das partes da relação privada de interesse patrimonial destas.
Diante de tal inovação quanto ao foro competente para tramitação da Ação Renovatória de Locação, conclui-se que a alteração da regra geral de competência territorial do foro do réu, para a do foro do local do imóvel aproxima-se com maior êxito do primado constitucional da função social da empresa e seus consectários interesses protetivos do Direito Imobiliário.
3.5 Natureza dúplice da ação renovatória e natureza da sentença
A ação renovatória possui natureza dúplice, tendo em vista que a negativa do pleito de renovação implica em decretação da extinção da relação locatícia e, consequentemente, o locatário acaba ficando sujeito à devolução do imóvel. Ou seja, uma mesma ação pode acarretar duas consequências, uma delas indireta.
A sentença que decreta a renovação contratual, por sua vez, possui natureza constitutiva, uma vez que cria uma situação nova. Será constitutiva também a sentença que negar a renovação, pois haverá uma declaração judicial de extinção daquela relação jurídica (locação).
Se a locação não for renovada, por qualquer que seja o motivo (carência, improcedência do pedido etc.), o juiz deve determinar a devolução do imóvel no prazo de trinta dias após o trânsito em julgado da decisão em razão da natureza dúplice da ação, mesmo que não tenha sido este o pedido. Na hipótese de a coisa julgada se perfazer antes do término do contrato, a obrigação de devolução do imóvel será dilatada para o dia do vencimento, desde que o locador tenha pleiteado expressamente em sua peça de defesa (contestação).
É possível que o locador promova a ação renovatória de locação, atendidos os mesmos requisitos e condições do locatário, com o fim de renovar a locação ou exercer o direito de retomada. O inquilino, por sua vez, poderá se defender com a simples alegação de desinteresse no prosseguimento da locação.
Caso o inquilino deva pagar alguma indenização, o despejo somente será concretizado com a prova do pagamento, nos termos do artigo 615, inciso IV, do Código de Processo Civil (aplicação subsidiária). Na hipótese de recusa, o artigo 570 do mesmo diploma legal aduz que é possível a consignação por título judicial. Caso seja renovada a locação e o locatário seja constituído em mora, as diferenças dos aluguéis vencidos podem ser executadas nos mesmos autos, bem como podem ser pagas em conjunto.
Após o trânsito em julgado da sentença, independentemente de requerimento das partes, aquela será registrada no Registro de Títulos e Documentos do juízo da ação, mediante mandado que reproduz a sentença e as condições do contrato. A inscrição é indispensável para que o contrato seja oposto a terceiros no caso de alienação.
4. Considerações Finais
A Nova Lei do Inquilinato, Nº n.º 12.112, de 09 de dezembro de 2009, veio atender aos anseios dos entes da relação locatícia, através do beneficiamento principalmente dos locadores e fiadores. A referida Lei trouxe maiores benefícios para estes entes já que a partir da sua vigência puderam ser exonerados de certas obrigações.
A ação renovatória de imóvel não residencial ultrapassa a simples noção contratual locatícia pois é formada por outros interesses de natureza empresarial, como por exemplo a conservação do aviamento. Por este aspecto, a inovação legislativa veio a contribuir para a evolução e segurança nestas relações, tornando-se importante instrumento aliado à proteção de certos direitos empresariais.
A Lei 8.245/91 buscando proteger a figura do empresário, no desenvolvimento da sua atividade em determinado local, durante certo lapso temporal, realmente mostrou-se como efetivo instrumento protetivo e assecuratório do seu direito em permanecer com a locação sem a indevida interferência do locador dando continuidade no contrato, preservando sua atividade empresarial.
Referências
BERNARDES, Hilton Meirelles. Das Garantias Locatícias – Problemas e Soluções:Verbo Jurídico,Agosto de 2006.
BRASIL, Lei No 8.245, de 18 de Outubro de 1991.Dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes.Presidência da República, Casa Civil - Subchefia para Assuntos Jurídicos. Brasília, 18 de outubro de 1991, D.O.U. de 21.10.1991.
SANTOS, Ernane F. dos Santos. Manual de Direito Processual Civil - Vol. III -Procedimentos Especiais Codificados e da legislação Esparsa, Jurisdição Contenciosa e Jurisdição Voluntária. 8 ª Ed. Rev, e Amp. São Paulo: Saraiva, 2002.
TEODORO JR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 34ª Ed. Vol. III.Rio de Janeiro: Forense, 2005.
THEODORO Jr, Humberto. Algumas Questões Polêmicas Enfrentadas pela Reforma da Lei do Inquilinato Operada pela Lei nº 12.112, de 09.12.2009. Editora Magister - Porto Alegre - RS. Publicado em: 14 jul. 2011. Disponível em: .
Miriã Marques da Silva Araujo - Advogada e Consultora Jurídica com formação pela Universidade Católica do Salvador - UCSAL.
Fonte: Revista Âmbito Jurídico
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