Pedro Teobaldo
A Lei 13.105/2015 (Código de Processo Civil - CPC) promulgada em 2015, entrando em vigor no ano seguinte, trouxe disposto no artigo 1.071 a forma administrativa do reconhecimento da usucapião diretamente no ofício de registro de imóveis, como continuidade do entusiasmo legislativo para desjudicialização.
O texto originário do Código de Processo Civil não estava adequado aos anseios práticos dos operadores do direito e nem da sociedade. Não possibilitava com intensidade o desafogo do judiciário. Existia entrave legal que exigia a anuência expressa dos titulares de direitos reais registrados ou averbados na matrícula do imóvel e considerava o silêncio como discordância.
Motivada pela pressão social e jurídica para uma alteração que adequasse ao disposto no Código Civil, o Poder Executivo editou uma medida provisória posteriormente convertida na graciosa lei nº 13.465/2017, que além de mudar com essa aberração do silêncio como negação, criou outras ferramentas para regularização fundiária.
Passaram-se dois anos e meio da edição da lei facilitadora e o instrumento da usucapião extrajudicial ainda engatinha. Este procedimento precisa vingar, os autores precisam se inteirar, usar e trabalhar na aplicação deste instituto extrajudicial. É um procedimento rico em detalhes, mas não é difícil, pelo contrário, é fácil, célere, seguro e mais barato que o judicial.
A facilidade está na existência de tabeliães e registradores em todos os municípios brasileiros. A celeridade se encontra no procedimento objetivamente elaborado. A segurança está na fé pública das autoridades das serventias extrajudiciais, onde confia-se na aplicação da lei e da normas para aplicação do direito. Quando não protegido pelos benefícios da gratuidade judicial, o processo judicial pode custar muito mais do que o extrajudicial, em razão da extensa demora e dos procedimentos legais necessários.
Os principais atores do procedimento são: advogados, engenheiros ou arquitetos e afins, tabeliães de notas e os registradores de imóveis. Todos têm a função de elaborar e construir o procedimento até culminar em seu reconhecimento ou negativa.
O advogado, antes do tabelião, é o primeiro jurista a ter contato com o caso, por isso, é o primeiro a crer no direito a ser pleiteado. Assim, deve ter o maior zelo e cuidado com processo, expondo minuciosamente todo o espaço da posse percorrido, juntar documentos pertinentes e comprobatórios, observando todas as nuances previstas na legislação, bem como, os provimentos estaduais e o nacional editado pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, o criterioso Provimento nº 65/2017, uma apaziguadora e cuidadosa diretriz criada para orientar todos os envolvidos no procedimento nas serventias extrajudiciais.
O procedimento se inicia extrajudicialmente no cartório de notas (Tabelionato de Notas), lavrando-se a ata notarial de atestação de posse para fins de usucapião. Documento dotado de fé pública, onde o tabelião faz constar sua percepção pessoal de todos os documentos apresentados pelo advogado do requerente fundamentando o direito e a petição deste.
A ata notarial é o documento mais importante para apresentação ao Oficial de Registro de Imóveis e, deve, obrigatoriamente, ser lavrada por tabelião de notas da circunscrição do bem. O tabelião, inclusive, poderá fazer diligências diretamente no imóvel (§ 1º do art. 5 do Provimento 65/2017), para que sua convicção do direito do requerente seja amplamente formada. Pode, ainda, o tabelião, tomar depoimentos de testemunhas, vizinhos, síndico, e de qualquer pessoa importante para afirmar aquilo declarado pelo requerente em seus documentos e formar sua convicção.
Cuidadosamente, o advogado recepcionando o instrumento notarial lavrado e acompanhado dos documentos necessários e importantes para conceder robustez à afirmação do direito de seu cliente, apresentará juntamente com um requerimento (nos moldes de uma petição inicial, conforme art. 389 do CPC); instrumento do mandato, subscrito pelo requerente e seu cônjuge/companheiro, com firma reconhecida; planta do imóvel, se for o caso e os apresentará ao ofício de imóveis competente para protocolo (art. 4 do Provimento 65/2017 do CNJ).
O oficial registrador será o juiz do procedimento, deverá ser o facilitador do processamento, buscar seu pleno convencimento do direito alegado e evitar o excesso de dúvidas registrais.
Com o recebimento do requerimento, junto com os documentos necessários, o registrador o prenotará no livro protocolo, manterá os efeitos da prenotação até o deslinde final do procedimento, seja para declaração da usucapião pleiteada ou para negativa do pedido. Após, autuará os documentos e os analisará em procedimento de qualificação registral preliminar. Nesta fase, identificará se todos os requisitos para aquisição por usucapião foram preenchidos pelo requerente, porém, existindo pendências expedirá nota de devolução elencando-as (art. 198 LRP) para que sejam sanadas pelo apresentante do título.
Se na análise preambular todos os requisitos estiverem cumpridos para espécie de usucapião estabelecida, o oficial encaminhará os documentos pertinentes como notificação às pessoas titulares de direitos registrados e averbados na matrícula do bem e dos imóveis confinantes, bem como, expedirá ciência à União, ao Estado, ao Distrito Federal ou ao Município, entendendo o silêncio dos primeiros como concordância, e dos últimos como ausência de interesse. Contudo, os entes públicos podem impugnar o procedimento até o último momento antes do registro.
Não havendo impugnação, expedirá o oficial edital de notificação aos terceiros eventualmente interessados para manifestação no prazo estabelecido que, em regra, é de quinze dias, mas pode o Oficial ampliar este prazo para garantir aperfeiçoamento (art. 257, III do CPC).
Finalmente, passado o prazo do edital e não havendo o que ser impugnado e estando os documentos em conformidade com a lei, o Oficial Registrador de Imóveis expedirá termo de reconhecimento da usucapião pleiteada pelo requerente e registrará a aquisição do direito.
Todo este procedimento pode ocorrer em menos de seis meses, portanto, inferior a uma gestação normal, garantindo assim que a criança ande mais rápido, no caso, o direito real, seja reconhecido e utilizado o mais rápido possível. Com isso, o imóvel entrará para o mundo jurídico e possibilitará o exercício de todos os direitos inerentes à propriedade ou ao outro direito real declarado aquisição, bem como, possibilitará ao entes fiscais recolherem os tributos competentes, em razão da propriedade, transmissões e sucessões.
Portanto, este instrumento extrajudicial de titulação e de efetivo reconhecimento de direito real deve ser utilizado pelos atores e garantir uma efetiva desjudicialização da regularização fundiária.
Pedro Teobaldo - Advogado.
Fonte: Artigos JusBrasil
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