O advento da lei 13.467/17, amplamente divulgada como reforma trabalhista, acendeu a polêmica em dois pontos importantes, o contrato autônomo de corretor de imóvel ou de parceria comercial com colaborador pessoa jurídica (contratação PJ) de corretor de imóvel, os quais, vez por outra, são questionados na Justiça do Trabalho por meio de ações com pedido de reconhecimento de vínculo empregatício.
Esses pontos ficam evidenciados pela nova redação dos artigos 442 –B, da CLT, já que, no primeiro momento, levaram a várias conclusões prematuras sobre a ampla e irrestrita legalização desses modelos contratuais, o que pode gerar passivo trabalhista se for levado nos exatos termos legais.
Tal situação ocorre, haja vista que, em que pese à alteração do dispositivo citado, as relações jurídicas dentro do cenário trabalhista exigem a análise conjunta do aspecto do principio lógico e do sistema jurídico em que se formam os contratos de trabalho, dentre eles o de parceria comercial entre imobiliária e corretores de imóveis por meio de contrato autônomo ou de Pessoa Jurídica.
De início, o regime da contratação autônoma é bem difundido e tem suas bases questionadas pela doutrina e jurisprudência. Porém, o novo texto de lei buscou negar a existência do vínculo empregatício, ao estabelecer que "A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3º desta consolidação" (art. 442 –B, incluído pela lei 13.467/17).
No que tange aos corretores de imóveis, profissão regida por lei especifica (Lei 6.530/78) é imperioso mencionar que ela sofreu recente alteração dada pela lei 13.097/15, que acresceu os parágrafos 2º, 3º, e 4º ao seu artigo 6º da lei.
Cabe esclarecer, nesse sentir, que desde a sua promulgação, a lei 6.530 privilegia a prestação de serviços autônomos do corretor de imóveis, ao admitir, no parágrafo único do seu artigo 3º, que as atribuições de competência do corretor de imóveis podem ser exercidas por pessoa jurídica, desde que devidamente inscrita no Conselho Regional de Corretores de Imóveis. Além disso, o artigo 6º contempla a sujeição destas pessoas jurídicas aos mesmos deveres e direitos das pessoas físicas também inscritas no CRECI.
Levando em consideração a atividade profissional eminentemente autônoma do corretor de imóveis, a lei 6.530 recepcionou muito bem, ao artigo 6º, os novos parágrafos 2º e 3º, a seguir em destaque, que respectivamente autoriza e regula a associação entre o corretor de imóveis e uma ou mais imobiliárias. Verbis:
§ 2º O corretor de imóveis pode associar-se a uma ou mais imobiliárias, mantendo sua autonomia profissional, sem qualquer outro vínculo, inclusive empregatício e previdenciário, mediante contrato de associação específico, registrado no Sindicato dos Corretores de Imóveis ou, onde não houver sindicato instalado, registrado nas delegacias da Federação Nacional de Corretores de Imóveis. (Incluído pela lei 13.097/15)
§ 3º Pelo contrato de que trata o § 2º deste artigo, o corretor de imóveis associado e a imobiliária coordenam, entre si, o desempenho de funções correlatas à intermediação imobiliária e ajustam critérios para a partilha dos resultados da atividade de corretagem, mediante obrigatória assistência da entidade sindical. (Incluído pela lei 13.097/15)
Trata-se, portanto, da típica relação entre os corretores de imóveis e as imobiliárias, ou seja, da pessoa física inscrita no CRECI com a empresa que, por sua vez, concede o espaço e disponibiliza seus serviços, tais como secretaria, e-mail, corpo jurídico, propaganda, etc, para a melhor execução da prestação de serviços, de forma que ambos cooperam para o atendimento ao cliente, inclusive assumindo os riscos do negócio.
Seguindo nessa linha de raciocínio, é o ensinamento da ilustre professora Maria Helena Diniz, para quem:
“Os corretores de seguros são os intermediários, pessoas físicas ou jurídicas. legalmente autorizadas a angariar e a promover contratos de seguros, admitidos pela legislação vigente, entre as sociedades de seguros e as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado. Os corretores são considerados auxiliares do comércio, ante a acessoriedade de sua atividade de intermediação, que procura estimular o interesse das partes, levando-as a um acordo útil. Os corretores emprestariam uma colaboração técnica à empresa, aproximando comerciantes. O corretor terá a função de aproximar pessoas que pretendam contratar, aconselhando a conclusão do negócio, informando as condições de sua celebração, procurando conciliar os seus interesses. Realizará, portanto, uma intermediação, colocando o contratante em contato com pessoas interessadas em celebrar algum ato negocial, obtendo informações ou conseguindo o que aquele necessita. O contrato de corretagem ou mediação é a convenção pela qual uma pessoa, sem qualquer relação de dependência, se obriga, mediante remuneração, a obter para outrem um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas, ou a fornecer lhe as informações necessárias para a celebração do contrato. O objetivo do contrato de corretagem ou de mediação não é propriamente o serviço prestado pelo corretor, mas o resultado desse serviço. Daí ser uma obrigação de resultado e não de meio.” (g.n.)
Dessa forma, configurado esse panorama é plenamente válido e legal o contrato de prestação de serviços autônomo firmado entre o corretor de imóveis e a imobiliária.
Ocorre, todavia, que o Direito do Trabalho também se rege pelos princípios que norteiam as relações do trabalho, tendo como basilar o princípio da primazia da realidade, o qual pressupõe que a verdade dos fatos prevalece sobre o contrato formal.
E neste ponto, é que reside a problemática que envolve as demandas de vínculo de emprego de corretor de imóvel, pois não são poucos os casos em que verificada a subordinação jurídica do corretor à imobiliária parceira, que, não obstante a contratação do corretor autônomo, determina a forma de como deverão ser executados os serviços prestados, determinam horários e os locais de atendimento, escalas em plantões, que por sua vez, indica o controle sua jornada de trabalho.
É comum em algumas imobiliárias, até por absoluto desconhecimento, se constatar na relação de trabalho (parceria) a estipulação de metas, eventuais punições, obrigatoriedade de estar na empresa em horário comercial e até em plantões.
De modo que, se constatadas estas imposições por parte da empresa imobiliária, poderá ser configurada a relação de emprego e, consequentemente, afastada a prestação de serviços autônomos por parte do corretor de imóveis, ainda que haja contrato de prestação/associação de corretor autônomo.
Por tal motivo, é que a lei 13.097/15 também introduziu o parágrafo 4º ao artigo 6º da lei 6.530, a seguir:
§ 4º O contrato de associação não implica troca de serviços, pagamentos ou remunerações entre a imobiliária e o corretor de imóveis associado, desde que não configurados os elementos caracterizadores do vínculo empregatício previstos no art. 3o da CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1o de maio de 1943. (Incluído pela lei 13.097/15)
Nessa linha de raciocínio é assente a jurisprudência do TRT da 10ª Região:
EMENTA CORRETOR DE IMÓVEIS. CONTRATO DE PARCERIA. AUSÊNCIA DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO. A ausência de um dos requisitos previstos nos arts. 2º e 3º da CLT já é suficiente para descaracterizar a relação de emprego. (TRT-10 -0000040-48.2018.5.10.0001 RO, Relator: Desembargador Elke Doris Just, 2ª Turma, Data de Publicação: 10/7/19 no DEJT)
EMENTA CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS. NATUREZA DA RELAÇÃO HAVIDA ENTRE AS PARTES. A relação de emprego, consoante dispõe o artigo 3º, da CLT, somente se aperfeiçoa se presentes os pressupostos da pessoalidade, da subordinação, da contraprestação direta e da não eventualidade dos serviços. É necessária a reunião de todos esses requisitos para caracterizar a figura do empregado, bastando que falte um deles para que a relação jurídica não configure relação de empregatícia. Hipótese em que demonstrada a inexistência de subordinação entre as partes.
(TRT-10 0001831-14.2016.5.10.0004 RO - ACÓRDÃO 1ªTURMA, Relator: Desembargador André Rodrigues Pereira da Veiga Damasceno, 1ª turma, data de publicação: 26/2/19 no DEJT)
VÍNCULO DE EMPREGO. CORRETOR DE IMÓVEIS. Negada a relação de emprego, mas noticiando a Reclamada a prestação de serviços sem vínculo subordinado, sem os elementos do art. 3º da CLT, é seu o ônus de provar que a relação existente entre as partes era outra que não a prevista no mencionado art. 3º da CLT, posto que tal alegação é fato impeditivo do direito do Autor (CLT, art. 818, c/c CPC, art. 373, II), encargo do qual se desincumbiu. Recurso do Reclamante conhecido e desprovido. (TRT-10 - 00108-2015-009-10-00-0- RO, Relator: Desembargador Jose Leone Cordeiro Leite, 3ª turma, data de publicação: 19/7/17 no DEJT)
VÍNCULO EMPREGATÍCIO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS EXIGIDOS NO ARTIGO 3º DA CLT - INEXISTÊNCIA. Patente nos autos a ausência dos requisitos exigidos nos arts. 2º e 3º da CLT para reconhecimento do vínculo empregatício pretendido, impõe-se a reforma da decisão que reconheceu o vínculo empregatício. (TRT-10 -01195-2015-011-10-00-9 RO, Relator: Juíz Convocado Paulo Henrique Blair, Data de Julgamento: 16/11/16, 1ª Turma)
Dessa forma, a fim de evitar o reconhecimento de vínculo de emprego de Corretor, é de suma importância existir, na relação de trabalho pactuada, a efetiva parceria entre empresa e corretor autônomo, qual seja, a intermediação da compra e venda de imóveis e, por essa venda, recebe corretagem proporcional ao preço do produto pago, seja pelo vendedor, seja pelo comprador do imóvel diretamente ao corretor, nos termos do art. 722 e SS do CC.
É de se concluir, portanto, que o contrato de prestação de serviços autônomos, inclusive com exclusividade, é absolutamente válido, todavia, para se resguardar de qualquer configuração da relação de emprego, são necessários observar os seguintes requisitos, mínimos, quais sejam: autonomia na prestação dos serviços e ausência de subordinação.
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Tomaz Nina é advogado especialista em direito do trabalho e sócio da Advocacia Maciel.
Fonte: Migalhas
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