segunda-feira, 24 de julho de 2017

CONTRATO DE LOCAÇÃO PREDIAL URBANA: DA RENÚNCIA TÁCITA DE CLÁUSULA CONTRATUAL


Mesmo que o locatário seja escolhido de forma criteriosa, é muito comum que este deixe de adimplir com as prestações pactuadas no contrato, o que pode trazer complicações para o locador caso não sejam tomadas providências acerca desse descumprimento.

1. Definição de contrato de locação predial urbana

O contrato de locação predial urbana pode ser definido como um contrato onde uma das partes, o locador, cede à outra, o locatário, o direito de uso o gozo de um imóvel a ser retribuído mediante pagamento de parcelas periódicas durante um período de tempo. Trata-se de contrato bilateral oneroso e sinalagmático, ou seja, celebrado entre duas ou mais pessoas, com previsão de retribuição pelo uso do imóvel, bem como com obrigações recíprocas para ambas as partes, respectivamente.

A previsão legal consta essencialmente da lei do inquilinato – Lei nº 8.245/91, a qual regula todas as peculiaridades da locação predial urbana, sem prejuízo das disposições do Código Civil, bem como de leis especiais, que tratam de outras espécies de locação urbana.

2. Do pagamento a menor e da conduta omissiva do locador

Em algumas situações, não obstante o locatário tenha sido escolhido mediante criteriosa análise de cadastro, este pode vir a passar por processo de insolvência e deixar de adimplir com o contrato na forma como pactuado.

Uma vez que o locatário deixe de pagar o aluguel ou o pague em valores menores do que o acordado, caso o locador não se oponha ao reiterado descumprimento contratual, este comportamento pode ser interpretado como uma concordância tácita, caracterizando, assim, uma renúncia à disposição contratual que trata acerca do valor locatício, o que impossibilitaria futura execução das quantias inadimplidas. Essa é a aplicação da chamada Teoria da supressio. 

3. Definição de supressio

A aplicação do instituto da supressio implica na redução ou no total desaparecimento de um conteúdo obrigacional, em decorrência da conduta omissiva de quem tinha por direito exigi-lo, de modo a gerar naquele que se encontra no outro polo da relação jurídica a expectativa de que não seja mais exercido.

Pode-se dizer que aquele que perdeu o direito teria abusado do direito de se omitir, mantendo comportamento reiteradamente omissivo, seguido de um surpreendente ato comissivo, com que já legitimamente não contava a outra parte.

Apenas para contextualizar, utiliza-se como exemplo um contrato de locação que prevê o pagamento mensal no valor de R$ 2.000.00,00. Em determinado momento, o locatário, passando por dificuldades financeiras, passa a pagar mensalmente apenas R$ 1.200,00. O locador, por sua vez, se omite e aceita o recebimento do valor a menor, achando que seria melhor cobrá-lo apenas ao final do contrato. Transcorrido todo o curso do contrato com os pagamentos a menor, o locatário devolve o imóvel ao locador, o qual, aproveitando a oportunidade, resolve cobrá-lo pela diferença apurada. De acordo com a teoria da supressio, essa cobrança seria um ato surpreendente comissivo, com o qual já não contava mais o locatário, de forma que não seria mais possível ser realizado.

4. Aplicabilidade da renúncia tácita aos contratos de locação predial urbana 

A doutrina e os tribunais pátrios vêm adotando sistematicamente a teoria da supressio aos contratos de locação imobiliária, seja para os casos de alugueis pagos de forma insuficiente, seja para os casos de reajustes periódicos nos valores, os quais, apesar de previstos contratualmente, se não forem oportunamente realizados pelo locador, impossibilitam cobrança posterior.

5. Como deve proceder o locador?

A prática jurídica vem demonstrando algumas maneiras para o locador se prevenir de futura alegação de renúncia tácita em caso de reiteração de descumprimento contratual, sem que haja necessidade de interrompê-lo antes do fim. Entre elas, pode-se destacar a própria previsão contratual de não aplicação da teoria da supressio ou renúncia tácita, bem como realização de notificação judicial ou extrajudicial de pagamento insuficiente, caso o fato efetivamente ocorra.

5.1 Da previsão contratual

Acerca da previsão contratual de cláusula de não aplicação da teoria da supressio, é válido destacar que este apenas teria validade em contratos onde não há situação de vulnerabilidade em relação a qualquer das partes. Por outro lado, nos contratos regidos pelo direito do consumidor, a exemplo dos realizados entre pessoas físicas e imobiliárias, tal cláusula pode ser declarada nula, de ofício, caso o juiz entenda que ela viola qualquer dos direitos básicos da parte vulnerável.

5.2 Da realização de notificação

Por sua vez, a notificação realizada pelo locador acerca do descumprimento da prestação periódica, ou pelo cumprimento de forma insuficiente, parece ser a forma mais segura para aquele resguardar seu direito de realizar futura cobrança de dívida que lhe é devida. Dessa maneira, uma vez notificado o locatário, fica cabalmente demonstrado, por ato explícito, a intenção do locador em receber as prestações na forma como pactuada.

É válido ressaltar que a preservação dos direitos aqui analisados depende de uma atuação preventiva do locador, sob pena de incorrer em irremediável prejuízo futuro. Dessa forma, para se resguardar dessas e de outras armadilhas, é importante consultar um advogado de confiança.

Marcus Vinícius Vasconcelos Abreu - Advogado, sócio do escritório Raimundo da Cunha Abreu Advocacia
Fonte: meuadvogado.com.br

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