A Lei 13.105, de 16 de março de 2015 instituiu o novo Código de Processo Civil [1], e dentre seus diversos regramentos, interessa-nos aqui tratar da citação. Trata-se de ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual trazida ao corpo de uma lide personificada (art. 238, CPC/15 [2]).
A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor (art. 240 [3]), ressalvados os casos expressos previstos em lei, como o inadimplemento de obrigação positiva e líquida (art. 397 do Código Civil [4]) ou a mora de obrigações provenientes de ato ilícito (art. 398 CC [5]).
Sob uma ótica ainda mais particular, o interesse está centrado em casos que devem merecer a atenção e certa reflexão tanto por parte de pessoas naturais (físicas) quanto de pessoas jurídicas em geral, em função da importância deste instituto processual.
Como indicado, a citação é ato convocatório para o réu, o executado ou o interessado integrar a relação processual, e o evento marca o início da contagem dos prazos processuais, para as partes, incluindo procurador, advocacia pública, Defensoria Pública e Ministério Público (art. 230, CPC/15 [6]).
Logo, para todos os envolvidos, é vital que por um lado se tenha a maior regularidade no ato citatório, e por outro, sejam evitados quaisquer inconvenientes, que possam levar a nulidades de citação, ou até mesmo ao desconhecimento da demanda e posterior revelia, como veremos.
O art. 231 [7] do código especifica quais as situações que são consideradas como o “dia do começo do prazo”, sendo que havendo mais de um intimado, o prazo para cada um é contado individualmente e quando houver mais de um réu, o dia do começo do prazo para contestar, para a maior parte das hipóteses, corresponderá à última das datas fixadas na norma.
Esses eventos podem envolver, por exemplo, a data de juntada aos autos do aviso de recebimento, quando a citação ou a intimação for pelo correio, ou a data de juntada aos autos do mandado cumprido, quando a citação ou a intimação for por oficial de justiça, ou ainda, o dia útil seguinte ao fim da dilação assinada pelo juiz, quando a citação ou a intimação for por edital.
Como regra geral, a citação deve ser pessoal, podendo, no entanto, ser feita na pessoa do representante legal ou do procurador do réu, do executado ou do interessado (art. 242, CPC/15 [8]). Mas existem diversas situações que merecem considerável atenção, conforme já indicado.
Caso seja verificada a ausência do citando, a regra geral é flexibilizada admitindo-se que a citação seja feita na pessoa de seu mandatário, administrador, preposto ou gerente, quando a ação se originar de atos por eles praticados (art. 242, § 1º, CPC/15 [9]). Essa ressalva é importantíssima especialmente para pessoas jurídicas de qualquer natureza, que tenham atuação em território brasileiro.
O art. 248, § 2º determina que, para os casos de citação de pessoa jurídica, é considerada válida a entrega do mandado de citação para pessoa com poderes de gerência geral ou de administração ou, ainda, a funcionário responsável pelo recebimento de correspondências (esta parte final necessária para harmonizar como o § 4º do art. 248 que trataremos adiante).
Mas, ainda, merece destaque a regra inscrita no § 3º do art. 75 do CPC/15 [10], pois a mesma determina que o gerente de filial ou agência presume-se autorizado pela pessoa jurídica estrangeira a receber citação para qualquer processo. E aqui a regra é generalista e abrangente – o que traz boa reflexão aos gestores de tais tipos de entidades legais.
Outra importante pontuação se insere na esfera imobiliária / de locações e pode atingir até mesmo empresas imobiliárias e gestoras de administração de imóveis. Para pessoas (locadores) que sejam titulares de imóveis locados e que se ausentem do país sem cientificar o locatário que na localidade onde estiver situado o imóvel, existirá um procurador com poderes para receber citação, poderá ser citado e considerado habilitado para representar o locador em juízo a pessoa que estiver na condição de administrador do imóvel encarregado do recebimento dos aluguéis (art. 242, § 1o, CPC/15 [11]).
Por fim, registramos especial destaque para o § 4º do art. 248 — sobre o qual entendemos que mais oportuno, por lógica sistêmica, teria sido se o legislador houvesse alocado a disposição também como parágrafo do art. 242. O dispositivo trata da citação em caso de condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso – ou seja, um problema mais que recorrente em grandes cidades e capitais, tanto para pessoas naturais quanto para pessoas jurídicas.
A regra fixa que, em tais localidades, será considerada válida a entrega do mandado citatório a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, ou seja, contrariando expressamente o disposto no caput do art. 242, CPC/15.
A especificação da norma pode, em diversas hipóteses, causar constrangimento, problemas e até mesmo levar uma parte a ser condenada à revelia, caso esse sistema de recebimento de correspondência de condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso não funcione a contento ou em seus tramites permita que a citação seja extraviada.
Isso sem contar os casos de “descontrole”, quando o mandado é entregue mas não existem registros fidedignos ou efetivamente rastreáveis do documento. Nessas hipóteses, o próprio § 4º do art. 248 oferece uma solução para a questão, ao determinar, na parte final de sua redação, que o funcionário da portaria poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, sob as penas da lei, que o destinatário da correspondência está ausente (art. 248, § 4º, CPC/15 [12]).
Em conclusão, avaliamos que pessoas jurídicas devem, por um lado, rever procedimentos de recebimento de correspondências em suas sedes, visando uma maior e efetiva rastreabilidade das mesmas e, em paralelo, avaliar corretamente procurações outorgadas, redação de contratos e estatutos sociais, e demais práticas perante terceiros (o que inclui o disclosure de informações relacionadas aos partícipes da gestão e administração e suas competências e responsabilidades).
Para imobiliárias e gestoras de administração de imóveis, torna-se vital revisar os contratos de prestação de serviços e de gestão de bens de terceiros, assim como atentar-se para as regras ora expostas.
Por fim, para o caso de condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso – tanto para pessoas naturais quanto para pessoas jurídicas –, é necessária a devida revisão de regras, procedimentos, normas de condutas, políticas de acesso a documentos, regras gerais de condomínio, práticas a serem revistas por síndicos e gestores de propriedades, visando evitar problemas com o recebimento de mandados de citação, em todos os termos que avaliamos do Novo Código de Processo Civil.
Referências
[1] Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm Acesso em 05.jun.2017
[2] Lei 13.105, de 16 de março de 2015. “CAPÍTULO II - DA CITAÇÃO - Art. 238. Citação é o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual.”.
[3] Lei 13.105, de 16 de março de 2015. “Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor, ressalvado o disposto nos arts. 397 e 398 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). § 1o A interrupção da prescrição, operada pelo despacho que ordena a citação, ainda que proferido por juízo incompetente, retroagirá à data de propositura da ação. § 2o Incumbe ao autor adotar, no prazo de 10 (dez) dias, as providências necessárias para viabilizar a citação, sob pena de não se aplicar o disposto no § 1o. § 3o A parte não será prejudicada pela demora imputável exclusivamente ao serviço judiciário. § 4o O efeito retroativo a que se refere o § 1o aplica-se à decadência e aos demais prazos extintivos previstos em lei.”.
[4] Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil. “Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor. Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial.”. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm#art397 Acesso em 05.jun.2017
[5] Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil. “Art. 398. Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou.”. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm#art398 Acesso em 05.jun.2017
[6] Lei 13.105, de 16 de março de 2015. “Art. 230. O prazo para a parte, o procurador, a Advocacia Pública, a Defensoria Pública e o Ministério Público será contado da citação, da intimação ou da notificação.”
[7] Lei 13.105, de 16 de março de 2015. “Art. 231. Salvo disposição em sentido diverso, considera-se dia do começo do prazo: I - a data de juntada aos autos do aviso de recebimento, quando a citação ou a intimação for pelo correio; II - a data de juntada aos autos do mandado cumprido, quando a citação ou a intimação for por oficial de justiça; III - a data de ocorrência da citação ou da intimação, quando ela se der por ato do escrivão ou do chefe de secretaria; IV - o dia útil seguinte ao fim da dilação assinada pelo juiz, quando a citação ou a intimação for por edital; V - o dia útil seguinte à consulta ao teor da citação ou da intimação ou ao término do prazo para que a consulta se dê, quando a citação ou a intimação for eletrônica; VI - a data de juntada do comunicado de que trata o art. 232 ou, não havendo esse, a data de juntada da carta aos autos de origem devidamente cumprida, quando a citação ou a intimação se realizar em cumprimento de carta; VII - a data de publicação, quando a intimação se der pelo Diário da Justiça impresso ou eletrônico; VIII - o dia da carga, quando a intimação se der por meio da retirada dos autos, em carga, do cartório ou da secretaria. § 1o Quando houver mais de um réu, o dia do começo do prazo para contestar corresponderá à última das datas a que se referem os incisos I a VI do caput. § 2o Havendo mais de um intimado, o prazo para cada um é contado individualmente. § 3o Quando o ato tiver de ser praticado diretamente pela parte ou por quem, de qualquer forma, participe do processo, sem a intermediação de representante judicial, o dia do começo do prazo para cumprimento da determinação judicial corresponderá à data em que se der a comunicação. § 4o Aplica-se o disposto no inciso II do caput à citação com hora certa.”.
[8] Lei 13.105, de 16 de março de 2015. “Art. 242. A citação será pessoal, podendo, no entanto, ser feita na pessoa do representante legal ou do procurador do réu, do executado ou do interessado. § 1o Na ausência do citando, a citação será feita na pessoa de seu mandatário, administrador, preposto ou gerente, quando a ação se originar de atos por eles praticados. § 2o O locador que se ausentar do Brasil sem cientificar o locatário de que deixou, na localidade onde estiver situado o imóvel, procurador com poderes para receber citação será citado na pessoa do administrador do imóvel encarregado do recebimento dos aluguéis, que será considerado habilitado para representar o locador em juízo. § 3o A citação da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas respectivas autarquias e fundações de direito público será realizada perante o órgão de Advocacia Pública responsável por sua representação judicial.”.
[9] Vide nota anterior nº 9
[10] Lei 13.105, de 16 de março de 2015. “Art. 75. Serão representados em juízo, ativa e passivamente: (...) § 3o O gerente de filial ou agência presume-se autorizado pela pessoa jurídica estrangeira a receber citação para qualquer processo.”.
[11] Vide nota anterior nº 9
[12] Lei 13.105, de 16 de março de 2015. “Art. 248. Deferida a citação pelo correio, o escrivão ou o chefe de secretaria remeterá ao citando cópias da petição inicial e do despacho do juiz e comunicará o prazo para resposta, o endereço do juízo e o respectivo cartório. (...) § 4o Nos condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso, será válida a entrega do mandado a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, que, entretanto, poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, sob as penas da lei, que o destinatário da correspondência está ausente.”.
Luís Rodolfo Cruz e Creuz - Advogado e consultor, Sócio do Cruz & Creuz Advogados.
Fonte: Revista Consultor Jurídico
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