sexta-feira, 8 de agosto de 2014

LOTEAMENTO: RESTRIÇÕES CONVENCIONAIS


Nos loteamentos urbanos temos dois tipos de restrições: as legais, que são impostas pelas leis municipais urbanísticas válidas para todas as edificações do Município e que poderão variar conforme a região da cidade; e as convencionais, que são aquelas estabelecidas pelo próprio loteador no momento da aprovação do loteamento e que tem fundamento contratual.

É desta segunda que trataremos aqui.

A restrição urbanística contratual ou convencional tem como fundamento jurídico o art. 26, inc. VII, da Lei nº 6.766/79 e é imposta pelo loteador no momento de implantação do loteamento. No ato da aprovação do loteamento pelo Município as restrições já devem estar descritas, devem obrigatoriamente estar arquivadas no registro de imóveis competente e constar expressamente nos contratos de compra e venda dos lotes e nas respectivas escrituras.

Neste sentido, Hely Lopes Meirelles ensina:

“Restrições convencionais são as que o loteador estabelece no plano de loteamento, arquiva no Registro Imobiliário e transcreve nas escrituras de alienação dos lotes como cláusulas urbanísticas a serem observadas por todos em defesa do bairro, inclusive a Prefeitura que as aprovou. Por isso, quem adquire lote diretamente do loteador ou de seus sucessores deve observância a todas as restrições convencionais do loteamento, para preservação de suas características originárias, ainda que omitidas nas escrituras subseqüentes, porque o que prevalece são as cláusulas iniciais do plano de urbanização” (destaques no original) (Direito de construir. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 137).

Contudo, essas restrições impostas pelo loteador não são ilimitadas. O dispositivo em tela (art. 26, inc. VII) é claro em determinar que as declarações de restrições urbanísticas convencionais do loteamento devem ser supletivas à legislação vigente.

Desta forma, as limitações contratuais devem suplementar a lei municipal, e não contrariá-la. Assim, num primeiro momento, parece-nos que, caso haja conflito, a lei municipal deve prevalecer sobre as limitações convencionais. E aqui novamente nos socorremos de Hely Lopes Meirelles:

“As restrições legais são as impostas pelas normas edilícias para todas as urbanizações ou especificamente para determinados loteamentos ou certos bairros. Tais restrições, como imposições urbanísticas de ordem pública, têm supremacia sobre as convencionais e as derrogam quando o interesse público exigir, alterando as condições iniciais do loteamento, quer para aumentar as limitações originárias, quer para liberalizar as construções e usos até então proibidos. Registre-se, contudo, que restrições convencionais impostas pelo loteador, mais limitativas do que as restrições legais em vigor, devem prevalecer sobre estas porque se entende que o empreendedor imobiliário desejou efetuar uma urbanização superior àquela permitida na área” (destaques no original) (op. cit., p.138).

Cumpre-nos, entretanto, relatar que o tema gera alguma polêmica na jurisprudência. A polêmica maior reside na situação de uma lei municipal posterior à implantação do loteamento ser menos restritiva do que as restrições convencionais contratuais. Neste caso de lei posterior, o que prevalece?

Ressalte-se que não haverá maiores problemas no caso de lei anterior à implantação do loteamento, posto que as convenções não poderão contrariá-la, embora possam ser mais restritivas.

Verifica-se, nesse sentido, uma tendência jurisprudencial adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, que considera as restrições convencionais supletivas às normas legais, razão pela qual não podem aquelas se sobreporem às leis urbanísticas, as quais são normas de ordem pública. Ademais, o Plano Urbanístico é de interesse geral e visa ao desenvolvimento urbano, sendo, pois, dinâmico. Sob este enfoque, não pode uma limitação de ordem particular impedir o avanço e a adequação urbanística à realidade local. Nesse sentido, vide REsp. nº 289.093/SP.

Há, todavia, acórdão exarado também por essa eg. Corte sustentando que as restrições urbanístico-ambientais convencionais que se apresentarem mais rígidas do que as legalmente impostas deverão prevalecer, sob pena de descumprimento dos preceitos contidos no art. 26, inc. VII, da lei em estudo.

Segundo essa decisão, eventual afrouxamento ou flexibilização das restrições convencionais pela via legislativa deverá estar lastreado no inte-resse público, a ser amplamente motivado e demonstrado pelo Poder Público, respeitado o ato jurídico perfeito e o licenciamento do empreendimento. Vide, a esse respeito, o REsp. nº 302.906/SP.

Em razão da polêmica existente em torno dessa questão, alguns Municípios, a exemplo do Município de São Paulo (Lei Municipal nº 8.001/73, com as alterações empreendidas pela Lei nº 13.885/04), inseriram dispositivo legal na legislação urbanística estabelecendo a prevalência, em caso de conflito entre a disciplina legal e a convencional, daquela que se apresente mais restritiva, de modo a preservar os interesses públicos e privados envolvidos e afastar futuras e eventuais lides a esse respeito.

Márcio André de Oliveira – Advogado
Fonte:http://www.meuadvogado.com

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