quarta-feira, 28 de agosto de 2019

CAUÇÃO NAS AÇÕES DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO


A Lei nº 8.245/91, conhecida como Lei de Locações ou Lei do Inquilinato, determina em seu artigo 59, § 1º que será concedida liminar para desocupação em 15 (quinze) dias nas ações de despejo desde que seja prestada caução no valor equivalente a três meses de aluguel:

Art. 59. Com as modificações constantes deste capítulo, as ações de despejo terão o rito ordinário.

§ 1º Conceder-se-á liminar para desocupação em quinze dias,      independentemente da audiência da parte contrária e desde que      prestada a caução no valor equivalente a três meses de aluguel, nas ações que tiverem por fundamento exclusivo: (...)

IX – a falta de pagamento de aluguel e acessórios da locação no vencimento, estando o contrato desprovido de qualquer das garantias previstas no art. 37, por não ter sido contratada ou em caso de extinção ou pedido de exoneração dela, independente de motivo.        
A exigência legal em questão é uma das principais irresignações dos locadores que precisam despejar seus inquilinos por falta de pagamento.

Mas qual seria o objetivo do legislador ao instituir este requisito?

Seria possível dispensá-lo?

A exigência de caução visa assegurar que o locatário não seja despejado de forma injusta ou, caso seja, possa ser compensado por tamanho transtorno. Ou seja, o legislador pretendeu proteger aquele locatário que após ser surpreendido com a liminar de desocupação, prova que foi despejado indevidamente, amenizando desta forma os transtornos que lhe foram causados, mediante ressarcimento.

Mas há outra problemática nesta situação. Ao olhar sob a ótica do locador é possível verificar que tal exigência só vem a onerá-lo ainda mais. Exigir uma caução equivalente a três meses de aluguel daquele que já não vem recebendo os valores que lhe eram devidos – e talvez necessários até mesmo para sua subsistência - pode implicar em uma exigência impossível de ser atendida.

Considerando a situação por este viés, alguns Tribunais vêm relativizando a exigência da caução, conforme os exemplos abaixo colacionados:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. LOCAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. ANÁLISE DO PEDIDO LIMINAR CONDICIONADA À PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO. CASO CONCRETO. Restou demonstrado nos autos que a ação de despejo por falta de pagamento se funda em contrato de locação desprovido de garantias, uma vez que a dívida superou a caução de três meses de aluguel dada em garantia, sendo, assim, dispensável a exigência para fins de análise do pedido de despejo liminar (art. 59, § 1º, IX, e § 3º, da Lei n. 8.245/1991). AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. (Agravo de Instrumento, Nº 70082097528, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Beatriz Iser, Julgado em: 31-07-2019)

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE DESPEJO - LIMINAR - DISPENSA DA CAUÇÃO - LOCAÇÃO RESIDENCIAL - SITUAÇÃO EXCEPCIONAL - POSSIBILIDADE. Conquanto a prestação de caução seja requisito para o deferimento da liminar de despejo, na forma do art. 59, § 1º, da Lei 8.245/91, inserido pela Lei 12.112/09, em situações excepcionais, comprovando o locador que não possui recursos financeiros para fazê-lo, a garantia pode ser dispensada. A exigência de prestação de caução pelo locador, nos termos do art. 59, § 1º, da Lei8.245/90, importaria, em verdade, maior ônus, vez qu e este já se encontra privada dos valores que lhe são devidos, fundamento não refutado pelo locatário, não se apresentando tal exigência razoável no caso concreto. (TJ/MG - AI 0108435- 41.2017.8.13.0000 MG. Relator: José Augusto Lourenço dos Santos. Data de Julgamento: 30 de Agosto de 2017)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. LOCAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO CUMULADA COM COBRANÇA DE ALUGUÉIS. DISPENSA CAUÇÃO NO CASO. Considerando que os valores inadimplidos pela locatária ultrapassam o equivalente a 03 meses de aluguel, não há necessidade de prestar caução legal. Precedentes do STJ e desta Câmara. Recurso provido.(Agravo de Instrumento, Nº 70081365959, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jucelana Lurdes Pereira dos Santos, Julgado em: 27-06-2019)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. LOCAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO C/C COBRANÇA DE ALUGUERES E DEMAIS ENCARGOS. LIMINAR INDEFERIDA. REQUISITOS AUTORIZADORES. ARTIGO 59, § 1º, INCISO IX, DA LEI 8.245/91. DISPENSA DE CAUÇÃO. POSSIBILIDADE. DÍVIDA QUE ULTRAPASSA O EQUIVALENTE A TRÊS MESES DE ALUGUEL. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. PRESCINDIBILIDADE. HIPÓTESE DE FALTA DE PAGAMENTO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70081462277, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vivian Cristina Angonese Spengler, Julgado em: 11-07-2019)

POSSÍVEIS FUNDAMENTOS

Importante notar que o despejo liminar está previsto para aqueles contratos em que não haja qualquer modalidade de garantia contratual nos moldes do artigo 37 da Lei.

Ao fundamentar as ações de despejo por falta de pagamento, a medida liminar tem natureza de tutela de evidência (art. 311 CPC), isto porque uma vez atendidos os requisitos que são a ausência de garantia contratual e o depósito da caução, consiste em direito líquido e certo do locador. Mas também é possível fundamentar as referidas ações com a tutela de urgência (art. 300 CPC) quando demonstrados os riscos de dano ao locador ou quando houver perigo na demora do provimento judicial ou risco de irreversibilidade da não concessão da medida.

Além de fundamentar a dispensabilidade da referida caução nos casos em que a dívida ultrapassar o equivalente a três meses de aluguel, existem algumas alternativas possíveis de serem propostas e defendidas nas ações de despejo por falta de pagamento, como por exemplo, (1) a dação de imóvel como caução, desta forma substituindo a caução em dinheiro por uma caução real e (2) a dispensa dos alugueis vencidos como caução, desta forma compensando a caução com os alugueis vencidos objeto de discussão no próprio processo.

Desta forma, embora subsista a exigência legal de caução nas ações de despejo por falta de pagamento, é possível pleitear judicialmente sua dispensa e é neste sentido que já existem diversas decisões dos Tribunais.

Janine Bertuol Schmitt - Advogada especialista em Direito Imobiliário.
Fonte: Artigos JusBrasil

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