A alienação fiduciária de bem imóvel representou um avanço sem precedentes para o sistema econômico brasileiro e também para a sociedade, uma vez que reduziu a inadimplência a índices mínimos, se comparados aos existentes no início da década de 1990, trazendo segurança jurídica a todas as partes envolvidas. Entretanto, para que esse instituto continue a trazer benefícios ao país, afigura-se imprescindível que cidadãos, empresas e a Justiça sigam respeitando a simplicidade do procedimento, em conformidade com a legislação.
Regulamentada pela Lei nº 9.514/1997, a alienação fiduciária se dá quando o adquirente de um imóvel na planta, com pagamento em prestações, oferece o próprio bem como garantia de que quitará sua dívida, fazendo isso constar de escritura pública e de registro perante o cartório. Se o adquirente pagar a dívida em dia, a propriedade, ao final, se consolidará em seu nome. Do contrário, poderá haver a retomada do imóvel mediante simples procedimento extrajudicial.
O procedimento para a realização do contrato de alienação fiduciária normalmente ocorre depois de uma avaliação prévia de crédito dos interessados. Após a aprovação, firma-se um instrumento de compra e venda, com garantia de alienação fiduciária, cujas cláusulas preveem o modo, o tempo e os encargos financeiros relativos às parcelas financiadas. Para o recebimento do imóvel, esta garantia será registrada em um cartório de imóveis, passando a constar da matrícula do bem, o que impede, por exemplo, que a propriedade seja transferida antes da quitação junto à entidade credora.
A garantia imobiliária oferecida pela alienação fiduciária proporciona ao comprador comodidade, por não obrigá-lo a pedir para ninguém que, por exemplo, afiance seu contrato. Para as incorporadoras, que fazem financiamento direto, e para os bancos, a alienação traz segurança, uma vez que, se houver débito não solucionado a tempo, é possível retomar o imóvel sem a necessidade de um caro e demorado processo judicial. Ademais, diferentemente da hipoteca, não há o risco de haver dois credores de negócios distintos executando a garantia sobre o mesmo bem.
Entretanto, é fundamental que incorporadoras, bancos e, principalmente, compradores compreendam a importância de se cumprir à risca a legislação específica. Isso porque, a partir do momento em que uma pessoa faz uma escritura de alienação fiduciária – que é o contrato lavrado em cartório -, ela não pode mais desistir do negócio ou rescindir o contrato da forma que bem entende.
A Lei de Alienação Fiduciária tem um rito muito específico no que tange à devolução do imóvel, no caso de não pagamento das mensalidades, inclusive detalhando os procedimentos para retomada da propriedade pela incorporadora. Contudo, por desinformação ou por malícia, muitos advogados dos consumidores estão querendo forçar a rescisão de contrato na forma convencional, como se fosse uma singela promessa de compra e venda.
De outro lado, como todo o procedimento de alienação fiduciária é disposto na própria Lei nº 9.514/97 e visa aumentar a segurança dos adquirentes, não há espaço para cláusulas abusivas, de modo que a única possibilidade aceitável de descumprimento por parte dos credores – bastante remota na prática – seria o posterior descortinamento de relevantes vícios construtivos não passíveis de conserto, impossibilitando a própria moradia e a fruição do bem.
Nesse sentido, a intenção de rescindir judicialmente uma alienação fiduciária de bem imóvel desborda do espírito da lei e, na grande maioria das vezes, se equivale a uma aventura jurídica. A devolução amigável, alinhada com os credores, é o caminho prudente para o comprador que perde sua capacidade econômica. E o entendimento da Justiça tem sido o de respeitar a contratação da alienação judiciária e os procedimentos extrajudiciais dela decorrentes em caso de inadimplemento dos compradores.
Usufruir das facilidades proporcionadas pela Lei de Alienação Fiduciária sem cair em armadilhas e, consequentemente, ficar em débito com os credores, é perfeitamente possível: o adquirente deve se esforçar para manter em dia suas prestações, não as assumindo se detectar que são superiores à sua efetiva capacidade financeira; por sua vez, incorporadoras ou instituições financeiras têm de observar os detalhes do procedimento cartorial, previsto em lei e reforçado nas escrituras, zelando para que transcorra com correção, agilidade e transparência.
Cláudio Sampaio – Sócio e fundador da Sampaio Pinto Advogados, especialista em Direito Imobiliário, Empresarial e Trabalhista. Presidente da Associação Brasiliense dos Advogados do Mercado Imobiliário (Abrami-DF)
Fonte: JOTA
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