Loteamento fechado é a subdivisão de uma gleba original em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, a qual tem seu perímetro murado, para a realização de controle de acesso a área.
Por sua natureza, os Loteamentos Fechados são dotados de personalidade jurídica própria, estabelecidos sob a forma de associações civis sem fins lucrativos, sendo que cada um dos proprietários dos lotes exerce privativamente as prerrogativas de domínio sobre o seu imóvel.
Pois bem, numa associação civil cada interessado se associa por sua própria vontade, por meio de declaração expressa, ou seja, cada proprietário possui o direito e não a obrigação de participar do quadro social da entidade criada.
Ocorre que muitos destes Loteamentos incluem em seus Estatutos a cobrança de contribuição mensal para o custeio de despesas com segurança, manutenção das vias públicas, lazer etc., impondo aos proprietários dos lotes o pagamento de taxas, sem, contudo, formalizarem a associação destes ao Loteamento ou mesmo dar a oportunidade para que os mesmos se manifestem no sentido de aderir formalmente ao ato que instituiu os encargos, de modo que a cobrança acaba ocorrendo de forma automática àqueles que vierem a adquirir os lotes oferecidos.
Na maioria dos casos, os proprietários dos lotes acabam por pagar as referidas contribuições sem saberem, de fato, qual a destinação de tais valores ou se os mesmos estão sendo empregados na manutenção do Loteamento, abrindo margem à recorrente má utilização e, até mesmo, ao desvio dos valores arrecadados.
Porém, por motivos diversos, alguns dos proprietários de lotes nos loteamentos fechados acabam se tornando inadimplentes, levando à interposição de Ação de Cobrança pela administração do Loteamento em face daqueles, situação esta que, de tão recorrente, motivou a elaboração do presente artigo.
Como se sabe, a liberdade de associação é garantia fundamental prevista na lista do artigo 5º, incisos II e XX da Constituição Federal. Vejamos:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(…)
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
(…)
XX – ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; (g.n.)
Deste modo, a adesão não pode ser compulsória, muito menos automática, como normalmente inserido nos estatutos dos Loteamentos Fechados. Pelo contrário, deve ser expressamente formalizada pelo titular do lote, ressalvada apenas a eventual existência de cláusula contratual expressa no sentido de obrigar os promitentes compradores a participarem da divisão de despesas de manutenção do empreendimento.
Nesse sentido, cumpre ressaltar que o entendimento jurisprudencial atual é no sentido de que as despesas comuns de associações somente obrigam àqueles que estiverem a ela associados ou àqueles que a ela anuírem, sendo irrelevante o debate acerca da existência ou não da associação quando da aquisição do imóvel.
“ASSOCIAÇÃO DE MORADORES – “LOTEAMENTO FECHADO” -RECURSO REPETITIVO – ARTIGO 543-C – REEXAME – COBRANÇA DE TAXA DE MANUTENÇÃO E CONSERVAÇÃO – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA INCONFORMISMO – SENTENÇA CONFIRMADA POR VENERANDO ACÓRDÃO DESTA COLENDA 8ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO – INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO DE CONTRIBUIR COM DESPESAS COBRADAS POR ASSOCIAÇÃO DE MORADORES SEM PRÉVIA FORMAÇÃO DO VÍNCULO ASSOCIATIVO OU SEM ANUÊNCIA A TAIS DESPESAS – PREVALENCIA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA LIVRE ASSOCIAÇÃO, CONFORME TESE UNIFORMIZADA PELO COLENDO STJ, SOB O RITO DO ARTIGO 543-C, DO CPC, INDEPENDENTEMENTE DO FATO DE O MORADOR TER ADQUIRIDO O LOTE DEPOIS DA CRIAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO – MODIFICAÇÃO DO ACÓRDÃO, PARA SE DAR PROVIMENTO Á APELAÇÃO. Entendimento firmado pelo STJ em sede de recurso repetitivo (Art. 543-C, CPC) no sentido de que: “as taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram”. Ressalva feita, contudo, em relação aos casos em que a fonte criadora da obrigação é a própria lei ou o compromisso de compra e venda, que contém cláusula expressa na qual o adquirente se compromete a participar do rateio das despesas do empreendimento, o que não é o caso dos autos. Recurso provido para julgar improcedente a ação, conforme precedentes recentes deste Egrégio Tribunal de Justiça. RESULTADO: apelação provida.”
(Apelação nº0015032-10.2008.8.26.0020 8ª Câmara de Direito Privado – Relator(a): ALEXANDRE COELHO – data do julgamento: 13/04/2016).
Além disso, convém destacar que a conservação e reparação das áreas públicas, por serem de uso comum, é dever do Poder Público e não dos residentes da localidade.
Assim sendo, se os proprietários de lotes não associados se beneficiam dos serviços prestados pelo Loteamento Fechado, tal fato não tem o condão de criar obrigação jurídica a ser exigível através de Ação Judicial, não havendo que se falar em enriquecimento sem causa, ante o risco de violação aos princípios constitucionais da legalidade e da livre associação.
Portanto, se o imóvel integra Loteamento Fechado, se o proprietário não está associado a este e se não fora estipulado em contrato a sua obrigação quanto ao rateio das despesas da associação, indevida a cobrança de taxas, ante a ausência de obrigação legal.
Susen Kelly Bezerra Souza - Advogada.
Fonte: Artigos Jus Navigandi
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