A Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91) determina que o imóvel alugado deve ser restituído pelo locatário, finda a locação, no seu estado originário, com exceção apenas das deteriorações decorrentes do seu uso normal (art. 23, III).
Assim, evidente que não existe a obrigatoriedade de entregar o bem totalmente isento de deteriorações, pois a lei expressamente exclui o desgaste natural pelo uso, decurso do tempo e ação de elementos naturais, situações inerentes ao uso normal do imóvel.
Nesse sentido são os ensinamentos de Sylvio Capanema de Souza ao apontar que a locação “se projeta no futuro, através de atos reiterados de execução, não seria possível a restituição da coisa rigorosamente no mesmo estado”, e, continua, “o decurso do tempo deixa marcas indeléveis e inevitáveis, tanto nas pessoas, quanto nos materiais, e por mais cuidadoso que fosse o locatário, após um certo tempo, o imóvel apresentaria danos, que lhe não são imputáveis.”[i]
Assim, a fim de garantir o devolução do bem dentro dos parâmetros determinados pela lei e bom senso, é comum e recomendável a elaboração de um laudo de vistoria inicial e final, ou seja, uma averiguação minuciosa do estado do imóvel no momento que antecede a locação e outra ao seu término para garantir que o locatário devolveu o bem nas condições que o recebeu, com atenção às exceções já apontadas.
Todavia, não é incomum que os referidos laudos sejam elaborados sem a presença dos contratantes, daí fica o questionamento, será que esses instrumentos obrigam os locatários a repararem os danos ali apontados?
É entendimento majoritário dos tribunais brasileiros que a presença das partes é essencial para atribuir validade ao laudo e, consequentemente, provar possíveis danos provocados ao imóvel, devendo o locatário, e por vezes os fiadores, serem notificados da data e horário a ser realizada a vistoria, seja ela inicial ou final.
Portanto, não restam dúvidas que o laudo de vistoria unilateral é prova insuficiente frente à possíveis danos levantados pelo locador ou imobiliária.
Assim, muitos juízos entendem que em casos de elaboração de laudo unilateral, sem a presença dos locatários, inexiste comprovação de que os danos apontados superaram aqueles esperados com a deterioração normal do uso do bem durante a vigência do contrato, uma vez que é primordial para a responsabilização um laudo contendo a descrição minuciosa dos reparos que resultaram do uso anormal do bem.
Importante destacar que, mesmo diante dessa situação, é possível que o interessado prove de outras formas a culpa ou até mesmo o dolo do locatário, viabilizando a obrigatoriedade de reparação dos danos, independentemente da existência de laudo de vistoria elaborado com todos os envolvidos na locação.
Todavia, é imprescindível que os danos sejam excepcionalmente delineados e demonstrados, evitando o enriquecimento sem causa do demandante.
Assim, concluímos que o laudo de vistoria unilateral, sem a participação do locatário e fiadores, não possui o condão de provar a existência de danos, nem que os mesmos foram causados por condutas praticadas pelo locatário, pois trata-se de declaração unilateral formulada sem o esmero esperado, dando margem a abusos e exageros daquele que visa o ganho injustificado.
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[i] A Lei do Inquilinato Comentada, 9ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2014, pág. 128
Lana Alberta da Silva Custódio - Advogada e sócia do Custódio & Goes Advogados.
Fonte: Artigos JusBrasil
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