À medida que o processo de estabilização monetária se consolidou no Brasil e os juros caíram, aliado a um reforço da regulação, os bancos aumentaram o prazo do financiamento imobiliário e hoje é possível encontrar opções no mercado que duram até 35 anos. Só que esticar muito o tempo do contrato para comprar a casa própria pode custar caro para o consumidor, e com uma diferença pouco expressiva nas prestações mensais.
Levantamento feito pela consultoria Akamines Negócios Imobiliários para o Valor mostra que a diferença de um financiamento de R$ 250 mil por 15 anos para um de 25 anos nas parcelas é de pouco mais de R$ 550. Só que a conta do financiamento por uma década adicional terá um acréscimo de R$ 120 mil. Se considerar o prazo mais alto disponível no mercado, de 35 anos, o total a pagar será de quase R$ 680 mil, em comparação aos R$ 435 mil do financiamento feito pelo prazo menor.
"O que a gente percebe é que o consumidor geralmente faz a opção pelo maior prazo e não é uma coisa muito inteligente porque a diferença nas prestações é muito pequena", diz Daniela Akamine, sócia da consultoria. "Só quem coloca os números na ponta do lápis vai entender o tamanho do prejuízo ao escolher a opção mais demorada de crédito."
Ela cita que um contrato fechado por 35 anos tem um decréscimo de menos de R$ 100 em cada parcela em relação ao financiamento feito por 30, mas em cinco anos o total a pagar aumenta em mais de R$ 60 mil. Pelos cálculos da consultoria, a cada cinco anos, a dívida engorda em cerca de R$ 60 mil. Nas suas simulações, ela usou uma taxa de 8,99% ao ano.
No Brasil, há cerca de duas décadas praticamente só a Caixa atuava no financiamento imobiliário, e o prazo não passava de 15 anos. Conforme a regulação do setor foi fortalecida - com o advento da alienação fiduciária, por exemplo -, os bancos privados passaram a participar desse jogo e hoje é possível encontrar opções na rede bancária por até 35 anos. Do lado macro, ajudou o recente corte da Selic, que caiu de 14,25% ao ano no fim de 2016 para 6,5% em março do ano passado.
"A vantagem de o número de prestações ter aumentado é que mais pessoas podem comprar imóvel", diz Luiz França, presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc). Para o executivo, consolidando-se um ambiente de estabilidade macroeconômica no Brasil, condicionado à aprovação de reformas, pode haver espaço para novos cortes de juros no financiamento imobiliário, tornando mais famílias elegíveis ao crédito para a compra da casa própria. Atualmente, a taxa mínima é de 8,5% ao ano.
Nos últimos anos, o prazo médio das concessões vem aumentando progressivamente. Segundo a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), em 2012 estava em 24 anos, subiu para 27 em 2014 e, em 2018, chegou a 29 anos. Na prática, porém, o prazo médio da carteira de crédito imobiliário dos agentes financeiros está em 11 anos desde 2017. Isso significa que o brasileiro tem se esforçado para quitar os financiamentos antes do originalmente contratado.
José Raymundo de Faria Júnior, planejador financeiro certificado pela Planejar, diz ser contra contratos de crédito muito longos. "Quando o banco oferece o financiamento é importante ver se você consegue se apertar um pouco mais no início porque a economia é grande no número de anos pela frente."
Ele lembra que, pelo sistema de amortização constante (SAC), previsto na maioria dos contratos de financiamento imobiliário, as parcelas são decrescentes, com impactos sensíveis a partir de dois anos. Num crédito de R$ 250 mil, em quatro anos já há uma redução de cerca de R$ 300 na prestação, calcula. Isso ocorre porque nessa modalidade o consumidor amortiza não só o principal mas também os juros desde o começo.
Outros custos contribuem para deixar a conta do longo prazo mais salgada, acrescenta Faria Júnior. O seguro, que varia em razão da idade do mutuário, e a taxa de administração de cerca de R$ 25, incorporada a cada prestação, pelo serviço de cobrança. Em dez anos, só essa tarifa encarece o financiamento em R$ 3 mil.
Um conselho que o planejador dá é fazer amortizações sempre que possível, com o objetivo de também encurtar o tempo do contrato. A cada dois anos é possível usar os recursos do FGTS para isso. "Vale a pena reduzir o saldo devedor, manter a prestação, diminuindo o número de anos", afirma. "É claro que o valor da prestação depende do orçamento de cada um, do momento de vida, mas se há condições é melhor diminuir o prazo."
A cada incremento de renda, Faria Júnior sugere ainda fazer a revisão do contrato e até, eventualmente, aumentar o valor das parcelas, também com o intuito de encurtar o financiamento. "A consequência é que se amortiza mais rápido."
França, da Abrainc, diz que no Brasil o apego à propriedade faz com que muitos mutuários se esforcem para pagar antecipadamente seus contratos de crédito imobiliário. Só que, muitas vezes, o consumidor acaba assumindo outras dívidas no lugar, como o financiamento de um veículo ou um consignado. "É um contrassenso, porque o financiamento imobiliário é mais barato do que os outros. Ele troca uma dívida menor por uma taxa maior", diz. "Só se deve antecipar se não tiver intenção de fazer outro financiamento. Mas as pessoas têm o raciocínio patrimonialista de pagar [antes] para ter o imóvel."
Fonte: VALOR ECONôMICO
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