Não raro, toma-se conhecimento, por meio das estatísticas, do aumento no número de ações judiciais envolvendo o atraso de entrega de obras no Brasil. Tal acréscimo pode ser verificado principalmente entre os anos de 2015 e 2017, talvez como reflexo da crise que atingiu o país neste período.
Ocorre que tal atraso, encarado como descumprimento contratual, incorre em sanção aos incorporadores, acarretando no pagamento da multa constante em contrato como penalidade principal prevista em percentual que pode variar entre 0,5% a 1% sobre o valor do imóvel por mês de atraso que supere os 180 dias de tolerância.
Há no entanto uma discussão sobre a natureza desta multa, pois para alguns doutrinadores além desta penalidade ainda é possível aplicar a sanção ao incorporador por lucros cessantes, com vistas a ressarcir ao adquirente por aquilo que ele deixou de usufruir do imóvel .
Nesse sentido, existe um recurso repetitivo afetado no STJ prestes a decidir sobre este tema. A questão principal é: Quando o contrato prevê essa multa pelo atraso na entrega da obra, ela tem o caráter compensatório (já contemplando a indenização devida ao promitente comprador) ou é sancionatória (permitindo entrar com uma indenização a ser concedida pelo judiciário) ?
Várias decisões recentes do STJ caminham no sentido de conferir a possibilidade de cumulação da multa contratual com lucros cessantes. No entanto, alguns doutrinadores afirmam ser mais sensata a adoção do caráter compensatório, vez que pela forma que é calculada gera um aumento da penalidade a cada mês de atraso devido a aplicação de 0,5% mensal sobre o valor do imóvel, equilibrando assim com os valores que seriam recebidos com a possível locação do mesmo.
Percebe-se então uma peculiaridade do caso em si: Caso o promitente comprador pretenda morar no imóvel adquirido e estiver pagando aluguel em outro imóvel devido ao atraso da obra, faz jus então ao dano emergente, recompondo o dano que teve. Por outro lado, se o imóvel se destinaria à locação, faz juz ao lucro cessante, devido ao que deixou de receber.
Eventualmente, além do pagamento da multa contratual cumulada com os lucros cessantes ou dano emergentes ainda é possível o pagamento de dano moral decorrente deste atraso, dependendo da análise do caso concreto, já que não há dano moral in re ipsa. Tomemos como exemplo um casal que teve que remarcar o seu casamento por várias vezes devido ao atraso da entrega da obra de sua futura moradia.
Até aqui tratamos sobre o caso de a multa por atraso da entrega da obra já estar prevista no contrato. Caso o incorporador não tenha adotado tal cautela há ainda a possibilidade da inversão da multa prevista contra a mora do consumidor para ser aplicada contra o incorporador que inadimplir o prazo de entrega, devido ao princípio da bilateralidade do contrato.
Assim, se o contrato prever que o atraso no pagamento das parcelas pelo promitente comprador incorre em multa e for omisso acerca de possível sanção aplicada ao incorporador por atraso na entrega da obra, aplica-se então ao construtor a mesma penalidade que fora imposta ao consumidor.
Enfim, espera-se que o STJ aproveite da oportunidade de julgamento dos recursos repetitivos que lhe foram afetados para pacificar tais questões fornecendo maior segurança jurídica tanto aos consumidores quanto aos incorporadores.
Fausto Freire de Mesquita - OAB/GO: 53.299; Pós-graduando em Direito Imobiliário e Urbanístico; Pós-graduando em Direito Médico e Hospitalar.
Fonte: Artigos JusBrasil
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