Os fundos imobiliários viveram o melhor ano de sua história em 2018. E por várias métricas: patrimônio líquido, valor de mercado, número de investidores e volume anual negociado, média mensal e diária atingiram os maiores níveis em todos os tempos - 2019 também promete. Na opinião de especialistas, o bom momento do mercado tende a continuar em meio à consolidação de um novo ciclo de crescimento do setor de imóveis.
Em termos de liquidez, o mercado atingiu um patamar jamais visto. Conforme levantamento da B3, o volume média diário de negociação dos fundos com cotas negociadas em bolsa atingiu R$ 46 milhões em 2018, melhor marca histórica e 43,75% superior ao recorde anterior, registrado em 2013, quando o giro por sessão alcançou R$ 32 milhões.
A tendência de aumento da liquidez tem se mantido nos primeiros pregões do ano. No último mês do ano passado, segundo levantamento do Valor Data, a média diária já havia subido para R$ 52 milhões. Em janeiro até dia 9, o giro médio por sessão alcançava R$ 57,4 milhões.
Em 2018, o segmento movimentou mais de R$ 1 bilhão por mês em cinco ocasiões: fevereiro, março, maio, outubro e dezembro, de acordo com a B3. Nos demais meses, só movimentou menos de R$ 800 milhões em junho. Ainda assim, os R$ 776 milhões vistos no período ficaram acima da média mensal de 2017, quando o mercado girou R$ 606 milhões, conforme dados da B3. No ano passado, o volume financeiro por mês cresceu 52,3% em relação ao período anterior.
O número de investidores também atingiu o maior nível de todos os tempos em 2018. O crescimento foi de 76% na comparação com a quantidade vista no fim de 2017. Hoje, já são mais de 205 mil aplicadores em cotas de fundos imobiliários na bolsa.
De acordo com o gestor de fundos imobiliário da Rio Bravo, Guilherme Politi, o aumento de liquidez e da quantidade de investidores ocorre como efeito direto da queda da taxa básica de juros para a mínima histórica, hoje em 6,5% ao ano, e pelo fato de a taxa Selic ter permanecido nesse nível desde então. "Com juros baixos, os investidores saíram em busca de rendimentos e os fundos imobiliários têm surfado essa onda", afirma.
Para se ter ideia, a taxa de retorno apenas com aluguéis pagos pelos fundos imobiliários, conhecida como "dividend yield", segundo levantamento da Economatica, foi superior inclusive aos dividendos pagos no mercado de ações em 2018, que teve um ano positivo (o Ibovespa subiu pouco mais de 15%).
Conforme a consultoria, a mediana dos dividendos das carteiras imobiliárias listadas na bolsa em 12 meses até outubro de 2018 alcançou 7,13% - acima do juro básico e bem superior ao provento de 1,8% na mediana das ações. Vale lembrar que o rendimento distribuído pelos fundos imobiliários conta com isenção tributária, tornando o segmento ainda mais vantajoso na comparação com a renda fixa. Para o cálculo foram considerados apenas os papéis com presença em todos os pregões do período em ambas as categorias.
Politi, da Rio Bravo, explica ainda que a percepção de início do ciclo de expansão imobiliária tornou o efeito da queda dos juros ainda mais atrativo. "Os fundamentos vêm se fortalecendo e a tendência de queda de vacância e aumento de preços se consolida desde o ano passado."
Como consequência do avanço do segmento observado no ano passado, o valor de mercado dos fundos listados em bolsa atingiu a maior cifra da história - R$ 45,6 bilhões em outubro, marca que recuou para R$ 41,6 bilhões no último mês do ano.
Conforme os dados da B3, o patrimônio líquido dos 405 fundos imobiliários registrados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em dezembro do ano passado, de R$ 90,4 bilhões, também é o maior valor já registrado. O crescimento em 2018 foi de 24,6% na comparação com o ano anterior.
Em outra métrica, a carteira do Índice de Fundos Imobiliários (IFix) da B3 alcançou em dezembro do ano passado o maior valor de mercado em reais, aos R$ 32,8 bilhões. Trata-se de um crescimento de 14,5% em relação às cifras vistas no fim de 2017.
Alguns números ficaram no quase, caso do valor das ofertas que alcançou a segunda melhor marca histórica, aos R$ 12,8 bilhões, somente atrás dos R$ 15,7 bilhões de 2012, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). O volume de emissões cresceu 36,8% na comparação com o ano anterior. Mas em quantidade, as 80 ofertas do ano passado se tornaram novo recorde, ao superar as 79 de 2017 e as 74 emissões de 2012.
Mas o ano estelar dos fundos imobiliários em 2018 levanta dúvidas sobre o desempenho do segmento nos próximos meses. Especialistas, no entanto, ainda enxergam potencial de ganhos para os investidores, devido ao momento de retomada do setor.
"Há uma convergência benigna entre o cenário macroeconômico e o ciclo imobiliário favorável", aponta o sócio-fundador da Hedge Investments, André Freitas. Segundo o especialista, "o mercado imobiliário vai crescer mais do que o PIB neste ano e a recuperação de preços, em especial no segmento de lajes corporativas premium, será superior à inflação". Para Freitas, em um período de três a cinco anos, "o ganho real de preços pode alcançar entre 30% e 50%".
Segundo Daniel Malheiros, sócio da RBR Capital, "já vemos queda forte de vacância e aumento do preço do aluguel, mas esses movimentos ainda não foram totalmente captados pelo mercado. O investidor que olha para frente vê que tem espaço para ganhos. Os preços estavam há três anos congelados, o que ainda favorece a compra agora".
Essa onda já se consolida, por exemplo, em São Paulo entre os imóveis comerciais "triplo A" das áreas mais nobres da capital paulista, como as avenidas Faria Lima e Paulista. Esse tipo de propriedade, que ocupa o topo da cadeia, em geral é o primeiro a capturar a volta do interesse de grandes investidores.
O otimismo dos gestores em relação a este ano também ganha reforço diante da perspectiva de um caminho mais previsível comparado a 2018. Isso porque, embora tenha fechado com vários recordes, o mercado passou muito longe da tranquilidade ao longo do ano passado.
Para se ter ideia da volatilidade, entre janeiro e a máxima do ano passado, em 6 de abril, o Ifix acumulou alta de 6%. Mas, espremido entre as incertezas da greve dos caminhoneiros, em maio, e as eleições de outubro, o índice chegou a recuar 6,2% na mínima de fechamento do ano em junho. Na véspera do primeiro turno ainda exibia queda de 4,2%. Depois do segundo turno, o indicador se recuperou e fechou 2018 com ganho de 5,6%.
Nas primeiras semanas do ano, o segmento continua a mostrar fôlego. Na sexta-feira, o Ifix bateu o recorde nominal, aos 2.398 pontos, com alta de 1,98% no acumulado do ano. E a tendência é de manter o ritmo com menor volatilidade, pelo menos, no curto prazo.
O momento atual se mantém positivo para aquisição de ativos imobiliários, pondera Matheus Oliveira, também gestor de fundos imobiliários da Rio Bravo. "Esse cenário vai perdurar por algum tempo, provavelmente, até a metade do ano." Para o especialista, os preços já começam a subir tanto na locação quanto na venda e, daqui para frente, o potencial de ganhos vai diminuir conforme os aumentos se acelerem e se disseminem.
O gestor ressalta ainda que, apesar de os preços estarem mais elevados em relação aqueles vistos há dois anos, "o momento para compra está mais favorável, pois tem uma menor relação de risco-retorno". Isso porque a recuperação do mercado está no rumo, enquanto em 2017 havia menos clareza sobre o início do novo ciclo.
O sócio da RBR enxerga ainda um cenário favorável ao crescimento da participação de investidores estrangeiros e institucionais. Para Malheiros, um dos fatores de impulso para esse crescimento vem da resolução 4661, da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), que determinou no ano passado às entidades de previdência fechada que façam investimentos em ativos imobiliários apenas por meio de instrumentos financeiros, como títulos e fundos. Na visão do gestor, em cinco anos, o número de investidores em fundos imobiliários pode chegar a 1 milhão.
Para Freitas, da Hedge, a maior participação de investidores institucionais tem sido um dos fatores do forte crescimento recente da indústria de fundos imobiliários. "Fundos de pensão, family offices, fundos de fundos e até fundos de ações que aproveitam oportunidades no segmento têm sido negociadores cada vez mais frequentes no mercado", pondera o gestor.
Apesar do cenário de crescimento da atividade, com retomada da expansão de emprego e renda, e do momento de queda de vacância e subida de preços no mercado imobiliário, algumas incertezas surgem no horizonte. Um risco vem da possibilidade de uma eventual subida de juros pelo Banco Central, que tem mantido a Selic na mínima histórica desde março de 2018.
Para Oliveira, da Rio Bravo, a perspectiva de a autoridade monetária voltar a elevar a Selic neste ano fica cada vez mais distante. "Pelo menos até a metade do ano, nós enxergamos como maior possibilidade a manutenção do patamar atual", afirma.
O gestor acrescenta que, se as reformas prometidas pelo novo governo, em especial a da Previdência, forem aprovadas, a Selic pode permanecer na mínima histórica ao longo de 2019 inteiro. Além da expectativa de uma política monetária ainda frouxa neste ano, o momento positivo do segmento pode compensar um eventual aperto nas condições financeiras. "De qualquer modo, o aumento de juros, quando vier, será pequeno e a indústria está madura o suficiente para absorver esse movimento."
Outro risco para o segmento, que tem sido sinalizado pelo novo governo, é o de uma eventual taxação de dividendos, o que incluiria os rendimentos dos fundos imobiliários isentos de imposto de renda. Mas essa possibilidade também é minimizada pelos especialistas. "Primeiro seria uma medida que não viria no curto prazo, mas, de qualquer modo, o mercado mudou, está maior, com gestão mais eficiente e pode compensar tranquilamente essa diferença de rendimento", diz Politi, da Rio Bravo.
O sócio da Hedge reforça a visão de amadurecimento do mercado. "Os novos investidores têm sido atraídos por um momento de maior qualidade de gestão, administração e transparência na comunicação dos fundos, assim como o lançamento de produtos com portfólios maiores e mais diversificados, que servem tanto para mitigar o risco quanto maximizar os ganhos para aos investidores."
Fonte: VALOR ECONôMICO
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