A cadeia da Construção Civil é reconhecida como uma das maiores geradoras de empregos, renda, bens e serviços, representando hoje em torno de 8% do PIB brasileiro. O recente período de crescimento, notadamente nos últimos três anos (descontando 2014 que foi um ano perdido para o setor) foi gerado preponderantemente por medidas anticíclicas governamentais, catalisado pela ampla oferta de credito imobiliário e pela mobilidade social das classes econômicas C, D e E.
Outras faixas de renda também tiveram incentivos com abundante oferta de crédito, tanto para a produção quanto para o financiamento a pessoas físicas.
A crise financeira mundial de 2008, iniciada nos Estados Unidos, coincidentemente originada no mercado imobiliário daquele país teve como resposta imediata um Programa de Governo aqui no Brasil que tinha o objetivo principal de gerar emprego e renda na cadeia da Construção Civil e que funcionou eficazmente como medida que evitaria os reflexos da crise.
Entretanto, da literatura econômica sempre vimos que as medidas anticíclicas são estratégias governamentais que funcionam como “alopatia” e que, portanto devem ser prescritas por prazo determinado, devido ao alto custo para a sociedade. Desta forma o Governo injeta recursos em determinado setor ou Indústria com o intuito de alterar o ciclo natural da “doença”.
Quando foi lançado, em 2009, o Programa Minha Casa Minha Vida tinha o objetivo de atingir um milhão de unidades e direcionar esta oferta com a prioridade para famílias que residiam em áreas de risco. Trabalhava o gestor com uma meta inicial de 14% do déficit habitacional de cada região. A segunda fase do programa buscou 30% como diretriz para a diminuição do déficit municipal, levando como base o senso de 2010 do IBGE.
Quando em 2015 o Governo anuncia a terceira fase do PMCMV, com a oferta de mais três milhões de moradia até 2018 ele informa que continuará “prescrevendo remédio alopático” para o mercado, especificamente na Habitação Popular, principalmente se não alterar a “dosagem” ou o subsidio oferecido principalmente na primeira faixa de renda (até R$ 1.600,00).
Imaginava-se então que estas medidas alopáticas e caríssimas para a sociedade, com subsídios chegando a 95% da unidade pudessem resolver várias situações. O fim da crise financeira era o principal objetivo, a melhoria das “doenças crônicas” das cidades e regiões metropolitanas que são a proliferação das favelas e instalação de moradias provisórias às margens dos rios. O terceiro fator seria a sustentabilidade ambiental e outra consequência importante seria a melhoria da qualidade de vida das famílias beneficiadas.
Apesar de não termos visto nenhum balanço sério, sem o condão político por um lado e sem o crivo da crítica vazia pelo outro, nenhuma das quatro situações aconteceu depois de cinco anos de Programa. Com as áreas de risco, “enxugou-se gelo”, pois as margens dos rios continuam com seus barracos ocupados, com raras exceções de prefeituras que deram bons exemplos. Quanto ao fator de sustentabilidade econômica, o programa tem inadimplência acima de 20% na Faixa 1 (renda até R$ 1.600,00) e dificilmente o retorno das prestações poderá beneficiar outras famílias.
Um Programa que está tendo um custo elevado, da ordem de R$ 230 bilhões de investimento até o final de 2014, sendo R$ 80 bilhões, praticamente a fundo perdido precisa de ajustes para que saia da condição de Programa Habitacional, de governo e temporal para uma Política Habitacional Popular permanente e atemporal, podendo ser aperfeiçoada no tempo. Que tenha a corresponsabilidade e contrapartidas devidas dos diversos setores governamentais e do segundo e terceiro setor e que aceite contribuições de investidores, transformando-o num bom negócio, sem a tutela única ou preponderante do Estado. Não pode uma estratégia desta envergadura e importância como política urbana ficar sob responsabilidade de Bancos públicos.
Com menor subsídio individual, na ordem do dia do ministro da Fazenda, melhoria do controle do retorno e comprometimento de todos os responsáveis no processo pode-se fazer muito mais do que o governo está estabelecendo como meta.
Portanto, que este Programa seja alçado à condição de Política Habitacional, como medida “homeopática”, e que a dosagem de subsídios tenha equilíbrio financeiro e sendo justa, que tenha retorno ao sistema. Que os governos federal, estadual e municipal, a sociedade e o terceiro setor abracem esta política pela abrangência e sua eficácia para a melhoria das condições de vida da sociedade. Desta forma, a cadeia da construção civil agradece, vai continuar a gerar empregos e renda e a conta vai fechar sem interferência elevada do governo, “alopática” e política.
Marcos Fontes - professor de Economia da IBE-FGV especialista nas áreas de Finanças e Imóveis com ênfase em crédito imobiliário e construção civil.
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