quarta-feira, 30 de maio de 2018

DECISÕES JUDICIAIS REVEEM OS EFEITOS DA RELAÇÃO ENTRE CONSTRUTORA E ADQUIRENTE


A explosão do mercado imobiliário que se iniciou na metade da década passada trouxe a reboque, anos depois, igual proporção de ações judiciais concentradas em um principal motivo: arrependimento. O bom momento econômico daqueles tempos e a consequente crise que se seguiu foram conjuntamente às molas propulsoras dessa movimentação nos corredores do nosso Judiciário.

Em outras palavras, muitos adquirentes passaram a buscar em juízo a formalização do desfazimento do negócio, insatisfeitos com a aplicação de penalidades contratuais para o distrato administrativo.

Tal insatisfação, não raro, passou a se traduzir em pedidos por prestação jurisdicional no sentido de determinar, sobretudo, que tais contratos fossem analisados à luz do Código de Defesa do Consumidor, com o consequente reconhecimento de nulidade de cláusulas, principalmente aquelas que tratavam de penalidades contratuais.

O fato é que passamos a ter constantes decisões tomadas aos borbotões, muitas vezes sem a análise casuística do enredo de cada processo, reconhecendo a relação de consumo e, consequentemente, anulando cláusulas contratuais. Não se considerava, portanto, o contexto da relação entre o agente construtor e o adquirente.

A boa notícia é que mais recentemente o Judiciário tem se debruçado com maior afinco na análise de tais questões, diferenciando o consumidor comum do investidor e realçando a importância do pactuado contratualmente.

No mesmo diapasão, alguns magistrados começam também a dedicar maior atenção ao caso dos adquirentes que não são investidores, tendo em vista o caráter, em regra, irrevogável e irretratável dos contratos, bem como a programação que o empreendedor faz ao conceber um empreendimento que demanda alto investimento e risco.

Em recente decisão do TJ/SP nos autos da apelação 1116739-74.2016.8.26.0100, o desembargador Teixeira Leite pondera, em seu voto, que a compra de um imóvel não pode ser uma opção gratuita ao adquirente no sentido de permanecer com a unidade, no caso de valorização, ou de desistir do negócio e receber todo o seu dinheiro de volta, em caso de desvalorização do imóvel. E vai mais além.

Segundo o magistrado, se o ilícito contratual foi praticado pelos adquirentes, que desistiram do negócio, "não haveria lógica jurídica na aplicação de correção monetária desde os desembolsos, porque, afinal, existe risco de valorização ou não do imóvel, o que é natural do investimento."

No TJ/RJ, nos autos da apelação 0066013-17.2016.8.19.0001, o desembargador relator Luiz Fernando de Andrade Pinto reforça a importância do que fora pactuado em contrato entre as partes, conclamando que não se pode dizer que "a crise econômica que se abateu sobre o País poderia mitigar a força de tais cláusulas. O raciocínio, mais uma vez, passa pela isonomia e pelo equilíbrio contratual."

É salutar que tenhamos operadores do Direito dando ao tema a devida importância, a fim de que haja sempre o necessário equilíbrio na relação contratual que tem sob pano de fundo o direito à moradia esculpido no rol de direitos sociais da Constituição Federal.

Rafael Collachio - Coordenador no escritório Coelho & Dalle Advogados.
Fonte: Migalhas de Peso

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