Na construção de edificações de unidades autônomas, tais como prédios comerciais e prédios de apartamentos, aquele responsável pela incorporação tem de observar rigorosas regras para comercializar estas unidades. Grande parte destas regras estão previstas na Lei de Incorporação Imobiliária, a Lei nº 4.591/64.
Assim, diante do rigor do procedimento e diante do considerável aumento da concorrência de construtoras no país, é interessante trazer um importante instrumento jurídico, dentro da mais estrita legalidade, que, se bem utilizado, permite fazer com que o construtor/incorporador aumente significativamente suas vendas.
Afinal, o consumidor deste tipo de produto (compra de imóveis na planta, por exemplo), num passado próximo, se deparou com situações extremamente inseguras. O exemplo mais conhecido foi o fatídico caso da ENCOL, que já foi considerada uma das maiores construtoras do país.
E para que o leitor compreenda, a ENCOL foi uma grande construtora (na década de 90) que acabou por decretar falência, o que prejudicou milhares de consumidores. Para situar o leitor, segue trecho da revista IstoÉ Dinheiro sobre o caso da construtora:
“Ao pedir concordata em 1998, (a ENCOL) possuía 720 empreendimentos inacabados e deixou 42 mil famílias às portas do desespero. Outros 10 mil clientes já moravam em seus apartamentos, mas não tinham a escritura definitiva do imóvel”.
Pois bem, a construtora era líder do mercado e sua falência prejudicou milhares de consumidores. Em alguns casos, os consumidores conseguiram continuar as construções com outras empresas, embora o custo para o comprador tenha aumentado cerca de 25% do custo inicial da construção. Em outros casos, os consumidores perderam todo o dinheiro investido e estes imóveis continuam até hoje inacabados, jogados às traças.
Portanto, acontecimentos como este toraram o consumidor deste tipo de produto cético quanto à segurança do negócio, o que de certa forma pode prejudicar a venda de imóveis, sobretudo das pequenas construtoras que estão recém inseridas no mercado imobiliário.
É diante de fatos como este que o leitor deve atentar para este instrumento jurídico que, se bem utilizado, pode fazer com que as vendas do construtor/incorporador aumentem significativamente. E é sobre este instrumento que abordarei a seguir.
Existe uma forma de o incorporador de imóveis trazer mais segurança ao seu empreendimento, de forma que o dinheiro utilizado em determinado empreendimento não se misture com o capital de giro da construtora. Aliás, a utilização deste instrumento é uma forma eficaz de o incorporador garantir segurança ao empreendimento e fomentar suas vendas.
A legislação trata deste instrumento em seu art. 31-A, senão vejamos:
Art. 31-A. A critério do incorporador, a incorporação poderá ser submetida ao regime da afetação, pelo qual o terreno e as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes.
§ 1º O patrimônio de afetação não se comunica com os demais bens, direitos e obrigações do patrimônio geral do incorporador ou de outros patrimônios de afetação por ele constituídos e só responde por dívidas e obrigações vinculadas à incorporação respectiva.
O dispositivo acima trata do chamado Patrimônio de Afetação, instrumento que surgiu em 2004, através da Lei nº 10.931. E embora o instrumento seja de conhecimento de muitas incorporadoras, ele é pouquíssimo utilizado, pois não é obrigatório (a lei menciona “a critério do incorporador”).
Através deste instrumento, o patrimônio da incorporação imobiliária será apartado (separado) do patrimônio do incorporador. O parágrafo estabelece que este patrimônio não se comunica com os demais bens do incorporador e só responderá por dívidas e obrigações vinculadas à incorporação.
Na prática significa dizer que caso a incorporadora “quebre”, aquele empreendimento em que se estabeleceu o patrimônio de afetação não será afetado pelas dívidas da construtora. Em outras palavras, isso trará uma enorme segurança para o consumidor, adquirente da unidade autônoma.
E para que o incorporador se utilize do patrimônio de afetação, é exigido que haja uma conta bancária exclusiva para aquele empreendimento e que a incorporadora convoque, logo no início das obras, a assembleia dos adquirentes para que seja eleita a comissão de representantes, que fiscalizará e acompanhará o patrimônio de afetação.
E como isto pode aumentar as vendas do incorporador?
Ora, as construtoras/incorporadoras se utilizam de um importante profissional para a venda de suas unidades, o corretor de imóveis. A proposta é que a construtora organize um material para a venda de suas unidades e treine o corretor responsável para passar ao cliente a informação que mudará seu comportamento diante daquela construtora: a de que aquele empreendimento foi submetido ao regime do patrimônio de afetação.
Para isto, basta passar a informação correta ao corretor de imóveis e ao cliente, explicando de maneira clara o que é o patrimônio de afetação e como ele pode trazer maior segurança ao consumidor.
Assim, caso a incorporadora quebre, a unidade imobiliária adquirida pelo consumidor não sofrerá nenhum tipo de constrição judicial (como penhora, por exemplo). O que permitirá que os adquirentes das unidades daquele empreendimento se unam e deem continuidade em sua construção, de maneira independente da situação financeira do incorporador originário. Ou seja, o consumidor não perderá dinheiro nem o imóvel.
Este instrumento pode, ainda, ser uma poderosa forma de o pequeno incorporador se destacar e concorrer com grandes empresas do mercado imobiliário. Isto porque a legislação não obriga o incorporador a se utilizar do patrimônio de afetação. Ele é facultativo. Razão pela qual, pela experiência prática, ouso dizer que menos de 5% das incorporadoras se utilizam dele.
Portanto, está aí uma grande oportunidade para o construtor/incorporador se destacar em seu mercado e aumentar a credibilidade com seu cliente e, consequentemente, suas vendas.
BIBLIOGRAFIA:
Lei 4.591/64: http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/leis/L4591.htm
Matéria IstoÉ Dinheiro: https://www.istoedinheiro.com.br/noticias/negocios/20060607/herdeiros-encol/15446
Fellipe Duarte - Advocacia e Consultoria Jurídica.
Fonte: Blog do autor.
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