O debate sobre a criação de regras para os cancelamentos dos contratos de compra e venda de imóvel na planta tem uma nova proposta na mesa, arbitrada por representantes do governo federal, e pode chegar a uma conclusão ainda neste mês. O tema é discutido desde o ano passado, mas não houve acordo entre empresários e consumidores sobre a base de cálculo para aplicação das multas nas rescisões, levando o governo a dar a palavra final sobre o tema. Agora, o plano já estaria quase fechado dentro do próprio governo e também conta com uma avaliação positiva por uma parte do setor privado.
Segundo fontes, a nova proposta prevê que a construtora poderá reter 100% do sinal pago pelo comprador na assinatura do contrato mais 20% das parcelas desembolsadas até o momento do distrato. O montante total da multa não poderá superar 10% do valor do imóvel.
Por exemplo: na comercialização de um imóvel de R$ 500 mil, o comprador costuma pagar R$ 100 mil ao longo da construção. Logo na assinatura do contrato, é desembolsado um sinal de cerca de R$ 25 mil, enquanto os R$ 75 mil restantes são parcelados nos meses seguintes, até a entrega da obra. Pela nova regra, esse comprador teria retido o mínimo de R$ 25 mil e o máximo de R$ 50 mil, ainda que tenha pago R$ 100 mil no momento do distrato. A corretagem, paga a terceiros, fica de fora da base de cálculo e não será devolvida ao consumidor.
A nova regra é mais branda para os compradores do que o defendido até aqui por empresários. A Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) pedia a aplicação de multa de 12% do valor do contrato ou 25% do valor pago pelo adquirente - o que fosse maior -, conforme antecipou reportagem do Broadcast de 15 de fevereiro. No entanto, essa proposta encontrou resistência na Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão ligado ao Ministério da Justiça.
Acordo bem próximo - A nova proposta partiu de representantes do próprio governo federal e já tem consenso nos ministérios da Fazenda e do Planejamento. Dessa forma, faltaria apenas a confirmação da Justiça, pasta que passou por troca de ministro recentemente, o que atrasou a tomada de decisão por lá. "Eu diria que está bem próximo de se fechar um acordo entre os três ministérios", afirmou uma fonte do alto escalão do governo federal, que preferiu não se identificar, já que o acordo ainda não foi firmado.
Do lado dos empresários, uma ala é mais favorável ao fechamento de um acordo o mais rápido possível, sob o entendimento de que é preciso criar regras com urgência para evitar novas ocorrências de distratos, que impactam fortemente o caixa das construtoras. "Essa não é a solução ideal, mas é uma solução digerível", afirma um líder de associação nacional de empresários.
Já outra ala aponta problemas na nova proposta. Como muitas construtoras parcelam o valor do sinal exigido dos consumidores, há receio de que isso poderia gerar novas ações judiciais questionando o cálculo da multa. "Não gostamos dessa iniciativa. Não é boa do ponto de vista estratégico setorial, porque ainda pode gerar judicialização", diz outro dirigente.
O governo, porém, rebate essa crítica dizendo que muitas construtoras facilitaram a venda além do que deveriam. "A nova proposta incentiva que o valor da entrada na compra seja maior, de fato. Está embutido aí um incentivo para aprimoramento econômico do setor, buscando evitar mais distratos", diz a fonte do governo.
Devolução e contrato - A proposta do governo também define três regras para as empresas devolverem o valor pago pelos consumidores. Se o empreendimento imobiliário contar com patrimônio de afetação, a restituição só ocorrerá após a conclusão da obra. Caso contrário, o pagamento deve ocorrer em 90 dias após o distrato. O patrimônio de afetação é o instrumento jurídico que blinda os recursos de cada empreendimento, evitando que tenha problemas em seu fluxo de caixa. A terceira regra prevê a devolução em até 30 dias quando o imóvel fruto de distrato é revendido pela construtora.
A regulamentação dos distratos também terá uma nova regra que visa dar transparência para a negociação. As construtoras concordaram que a primeira página dos contratos deverá listar cerca de dez itens considerados essenciais na transação, como o valor da entrada, a forma de correção monetária do contrato e as multas em caso de rescisão, entre outros itens. "Queremos que todas aquelas informações que vêm pequenininhas no meio do texto agora apareçam em letras garrafais, logo de cara", diz fonte do governo.
Assim que o teor da regulamentação for fechado dentro dos ministérios, ele será encaminhado na forma de um projeto de lei ou medida provisória, decisão que será tomada pelo próprio presidente, Michel Temer. Embora a medida provisória seja mais rápida, com efeitos imediatos, a tramitação do projeto dentro do Congresso traz mais legitimidade e segurança jurídica.
Fonte: O Estado de S. Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário