quarta-feira, 29 de maio de 2019

COMPLIANCE NO SETOR IMOBILIÁRIO E NA CONSTRUÇÃO CIVIL


Diante do cenário político, econômico e social brasileiro, é importante aproveitar o momento para fazermos algumas reflexões sobre como as nossas condutas enquanto cidadãos, entes públicos e privados, afetam diretamente as nossas vidas.

Dentre as reflexões, destacamos a necessidade de um novo posicionamento cultural, sobretudo, quando tratamos da ética, da integridade, do bom caráter, do zelo ao próximo e às gerações futuras. As iniciativas neste processo de transformação cultural englobam, por exemplo, as práticas derivadas dos programas de compliance. A propósito, o que vem a ser essa ferramenta?

Enquanto conceito, o termo compliance tem origem no verbo em inglês to comply e significa agir de acordo com regras, instruções internas, comandos legais ou regulamentatórios. Na verdade, a amplitude da conformidade deste sistema depende daquele que o adota.

Por força da Lei nº 12.846/13, popularmente conhecida como Lei Anticorrupcao, as empresas tornaram-se responsáveis objetivamente pelos atos de corrupção que eventualmente lhes favoreçam, sejam eles praticados por seus membros, funcionários ou terceiros que ajam em seus nomes. Além de responsabilizar as corporações, a normativa ainda aderiu à tendência mundial de valorização dos programas de compliance ao minimizar sanções às organizações que comprovem tê-los de modo efetivo.

Assim, o tão falado agir correto relacionou-se, sobretudo, com as práticas anticorrupção. Porém, como exposto no conceito acima, as condutas não se restringem aos termos subscritos na citada lei, englobando, em essencialidade, todos os atos que colaborem para a construção de um ambiente íntegro, sustentável e ético.

Diante desta tendência, as empresas do setor imobiliário e da construção civil deverão embarcar neste novo modelo para garantir a perenidade e a sustentabilidade de seus negócios, eis que necessitam manter suas imagens e reputações distantes de escândalos derivados de práticas ilegais ou imorais.

Portanto, empresas que até então estavam acostumadas a resolver as questões comerciais e operacionais de qualquer modo e por qualquer preço, deixando de avaliar e contabilizar as possíveis consequências, hoje estão se estabelecendo de uma maneira mais consciente e coerente, mesmo que ainda timidamente.

Este processo, aparentemente moroso, requer, primordialmente, a transformação de mindset naqueles que se propõem a fazer parte dele. Deste modo, abaixo colecionamos gatilhos aptos a provocar reflexões de mudança na sua organização. São eles:

Direcionado aos sócios, gestores e colaboradores de imobiliárias:

Quais os riscos de vender um empreendimento construído a partir de trabalho análogo à escravidão ou de que os materiais nele utilizados, como madeiras, britas e areia, serem extraídos com trabalhadores nestas condições? Quanto o seu negócio seria impactado por, indiretamente, contribuir com a perpetuação destas práticas?
Falando em madeiras, britas e areia, por exemplo, já imaginou o estande de vendas com o seu nome na frente de um empreendimento que recebe materiais de origem ilegal e sendo noticiado na TV? Quanto isto impactaria na sua imagem?

Alguns lembretes importantes:

As imobiliárias precisam se atentar quanto a importância da sua formação desde o seu planejamento até após a execução da atividade fim. Deve supervisionar a contratação dos seus colaboradores, como exemplo os corretores de imóveis, sempre atentos quanto a necessária regularidade da habilitação profissional dos mesmos, para dar validade ao exercício da intermediação nas transações imobiliárias. Verificar as condições do negócio certificando-se quanto aos riscos, antes de oferecê-lo aos clientes, e zelar de todas as etapas da venda, sobretudo após a conclusão.

Direcionado aos sócios, gestores e colaboradores de construtoras e incorporadoras:

Você verifica a capacidade financeira de todos os envolvidos no empreendimento com o intuito de verificar a origem lícita dos valores investidos?
Sua empresa se preocupa em averiguar as condutas dos terceiros com os quais mantém relações comerciais através das contratadas para intermediar a venda do seu empreendimento ou contratadas para o fornecimento de materiais, como madeiras, britas, areias, mármores etc.?
Já parou para pensar nos riscos pertinentes à negociação da compra ou permuta de terreno para construção de um empreendimento ou loteamento?
A falta de atenção quanto às possíveis situações apresentadas acima, já levaram e ainda levam empresas tradicionais desse seguimento à falência. Mas acreditem, a solução em que tudo pode ser evitado, à princípio tende a ser mais árduo e aparentemente mais oneroso, todavia, em breve perceberão um resultado, incomparavelmente, muito mais satisfatório e incrivelmente mais rentável.

Alguns lembretes importantes:

Também não custa nada lembrar, quanto às devidas atenções, as incorporadoras precisam manter sobre a elaboração e condução dos projetos de incorporação, sobre os riscos inerentes à contratação de uma empreiteira para a execução da obra, ou sobre a criação de uma SPE (Sociedade de Propósito Específico) para isolar o risco financeiro da atividade desenvolvida.
A revisão contratual, seja em qualquer espécie, deve ser realizada de forma sistemática, caso a caso e periodicamente. E, falando nisso, podemos também citar aqui, um assunto ainda polêmico, mas que precisa ser enquadrado em destaque, sobre as alterações contratuais sob a égide da lei nº 13.786/2018, conhecida como “Lei do Distrato”, momento este no qual todas as empresas deste seguimento devem estar atentas quanto à readequação às novas práticas e ao novo modelo contratual de compra e venda de imóveis em construção.
E, ainda diante das construtoras, é seguro que o bom planejamento da obra, se torna necessário para o cumprimento das obrigações e garantias contratuais que versam sobre as condições de prazo para a entrega da obra.

Como é possível notar, são inúmeras as precauções que devem ser tomadas.

Dentre esses e tantos outros exemplos, e lista de “à fazeres” que todo mundo sabe mas não pratica, em um universo sazonal e sensível, cabe lembrar que está implícito à todas essas questões a tal chamada “cultura mercadológica” em processo de mudança rumo à evolução, a qual hoje denotamos a uma nova abordagem.

Em suma, a implementação de um programa de compliance nesses seguimentos minimizam a ocorrência e os impactos de eventuais condutas ilícitas ou imorais praticadas por membros da sua empresa ou terceiros relacionados diretamente à sua atuação. Assim, as ferramentas disponíveis deverão ser utilizadas para prevenção, pois quem optar por aplicá-las certamente não experimentará o amargo sabor de ter que remediar depois.

Emília Maria Amin de Carvalho é advogada, atuante no Direito Imobiliário. Associada ao Instituto de Estudos Avançados em Direito e membro do Núcleo de Direito Imobiliário, Urbanístico e Condominial.
Fonte: Artigos JusBrasil

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