sábado, 15 de dezembro de 2018

DA AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO


1 - PRINCIPAIS ASPECTOS

A desapropriação, em linhas gerais, nada mais é do que um mecanismo utilizado pelo Estado sobre a propriedade privada na medida de sua necessidade, utilidade ou interesse social.

As desapropriações, não obstante o Decreto-Lei 3.365, de 21 de junho de 1941, são tratadas, ainda, pela Constituição Federal e Código Civil, conforme segue:

Art. 5º (...)

XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;

No mesmo sentido, o Código Civil:

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

(...)

§ 3º O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.

Na verdade, o Direito revela uma antinomia acerca do instituto, pois de um lado garante o direito de propriedade, porém, abrindo uma exceção a tal garantia em casos em que o Estado necessita do imóvel para atingir algum objetivo imperioso de interesse e utilidade pública.

Assim, de um lado a lei protege o proprietário, porém, de outro, diz que o mesmo deverá ceder seu direito mediante prévia e justa indenização.

2 – DA LEGISLAÇÃO

2.1 – NECESSIDADE E UTILIDADE PÚBLICA

O art. do Decreto-Lei 3.365/1941, relaciona quais são os casos de necessidade e utilidade pública:

Art. 5o (...)

a) a segurança nacional;

b) a defesa do Estado;

c) o socorro público em caso de calamidade;

d) a salubridade pública;

e) a criação e melhoramento de centros de população, seu abastecimento regular de meios de subsistência;

f) o aproveitamento industrial das minas e das jazidas minerais, das águas e da energia hidráulica;

g) a assistência pública, as obras de higiene e decoração, casas de saúde, clínicas, estações de clima e fontes medicinais;

h) a exploração ou a conservação dos serviços públicos;

i) a abertura, conservação e melhoramento de vias ou logradouros públicos; a execução de planos de urbanização; o parcelamento do solo, com ou sem edificação, para sua melhor utilização econômica, higiênica ou estética; a construção ou ampliação de distritos industriais; (Redação dada pela Lei nº 9.785, de 1999)

j) o funcionamento dos meios de transporte coletivo;

k) a preservação e conservação dos monumentos históricos e artísticos, isolados ou integrados em conjuntos urbanos ou rurais, bem como as medidas necessárias a manter-lhes e realçar-lhes os aspectos mais valiosos ou característicos e, ainda, a proteção de paisagens e locais particularmente dotados pela natureza;

l) a preservação e a conservação adequada de arquivos, documentos e outros bens móveis de valor histórico ou artístico;

m) a construção de edifícios públicos, monumentos comemorativos e cemitérios;

n) a criação de estádios, aeródromos ou campos de pouso para aeronaves;

o) a reedição ou divulgação de obra ou invento de natureza científica, artística ou literária;

p) os demais casos previstos por leis especiais.

§ 1º - A construção ou ampliação de distritos industriais, de que trata a alínea i do caput deste artigo, inclui o loteamento das áreas necessárias à instalação de indústrias e atividades correlatas, bem como a revenda ou locação dos respectivos lotes a empresas previamente qualificadas (Incluído pela Lei nº 6.602, de 1978).

§ 2º - A efetivação da desapropriação para fins de criação ou ampliação de distritos industriais depende de aprovação, prévia e expressa, pelo Poder Público competente, do respectivo projeto de implantação. (Incluído pela Lei nº 6.602, de 1978).

§ 3º - Ao imóvel desapropriado para implantação de parcelamento popular, destinado às classes de menor renda, não se dará outra utilização nem haverá retrocessão.

Embora a lei traga elementos e indique as hipóteses de cabimento, estas não são taxativas, ou seja, possui cunho exemplificativo. A Administração, pode expropriar por causas diversas às declinadas acima, pressupondo apenas e tão somente a utilidade pública.

2.2 – DO INTERESSE SOCIAL

O interesse social, nesse contexto, está ligado à qualidade de vida, social e coletiva. Por tal razão, os bens desapropriados, quando justificados pelo interesse social, não serão destinados à Administração, e sim à coletividade.

Segundo Hely Lopes "o interesse social ocorre quando as circunstâncias impõem a distribuição ou o condicionamento da propriedade para seu melhor aproveitamento, utilização ou produtividade em benefício da coletividade ou de categorias sociais merecedoras de amparo específico do Poder Público. Esse interesse social justificativo de desapropriação está indicado na norma própria (Lei 4.132 /62) e em dispositivos esparsos de outros diplomas legais. O que convém assinalar, desde logo, é que os bens desapropriados por interesse social não se destinam à Administração ou a seus delegados, mas sim à coletividade ou, mesmo, a certos beneficiários que a lei credencia para recebe-los e utiliza-los convenientemente". MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33ª edição atualizada. São Paulo: Editora Malheiros, 2007.

A Lei 4.132, de 10 de setembro de 1962, assim dispõe:

Art. 1º A desapropriação por interesse social será decretada para promover a justa distribuição da propriedade ou condicionar o seu uso ao bem estar social, na forma do art. 147 da Constituição Federal.

Art. 2º Considera-se de interesse social:

I - o aproveitamento de todo bem improdutivo ou explorado sem correspondência com as necessidades de habitação, trabalho e consumo dos centros de população a que deve ou possa suprir por seu destino econômico;

II - a instalação ou a intensificação das culturas nas áreas em cuja exploração não se obedeça a plano de zoneamento agrícola, VETADO;

III - o estabelecimento e a manutenção de colônias ou cooperativas de povoamento e trabalho agrícola:

IV - a manutenção de posseiros em terrenos urbanos onde, com a tolerância expressa ou tácita do proprietário, tenham construído sua habilitação, formando núcleos residenciais de mais de 10 (dez) famílias;

V - a construção de casa populares;

VI - as terras e águas suscetíveis de valorização extraordinária, pela conclusão de obras e serviços públicos, notadamente de saneamento, portos, transporte, eletrificação armazenamento de água e irrigação, no caso em que não sejam ditas áreas socialmente aproveitadas;

VII - a proteção do solo e a preservação de cursos e mananciais de água e de reservas florestais.

VIII - a utilização de áreas, locais ou bens que, por suas características, sejam apropriados ao desenvolvimento de atividades turísticas. (Incluído pela Lei nº 6.513, de 20.12.77)

§ 1º O disposto no item I deste artigo só se aplicará nos casos de bens retirados de produção ou tratando-se de imóveis rurais cuja produção, por ineficientemente explorados, seja inferior à média da região, atendidas as condições naturais do seu solo e sua situação em relação aos mercados.

§ 2º As necessidades de habitação, trabalho e consumo serão apuradas anualmente segundo a conjuntura e condições econômicas locais, cabendo o seu estudo e verificação às autoridades encarregadas de velar pelo bem estar e pelo abastecimento das respectivas populações.

Art. 3º O expropriante tem o prazo de 2 (dois) anos, a partir da decretação da desapropriação por interesse social, para efetivar a aludida desapropriação e iniciar as providências de aproveitamento do bem expropriado.

Parágrafo único. VETADO.

Art. 4º Os bens desapropriados serão objeto de venda ou locação, a quem estiver em condições de dar-lhes a destinação social prevista.

Art. 5º No que esta lei for omissa aplicam-se as normas legais que regulam a desapropriação por unidade pública, inclusive no tocante ao processo e à justa indenização devida ao proprietário.

Art. 6º Revogam-se as disposições em contrário.

Resta assinalar, ainda, que o interesse social busca uma melhor distribuição da propriedade em benefício da coletividade e que sua transferência procura a redução das desigualdades.

3 – DA INDENIZAÇÃO

Quanto a sua indenização, a lei exige que seja prévia, justa e em dinheiro, ou seja, após a avaliação do imóvel expropriado por um perito nomeado pelo juiz, o expropriante deverá depositar o montante devido antes de ingressar na posse do imóvel.

O seu pagamento ocorrerá na forma acordada ou, em caso de execução, nos termos do julgado. Vale ressaltar que o expropriado poderá se insurgir contra o valor depositado, podendo, inclusive, contestar a ação.

O objetivo primacial da desapropriação, conforme já narrado, é a finalidade pública, solidado na necessidade ou utilidade do bem ao interesse social e benefício comum. Logo, por obviedade, interesse privado de pessoa física ou mesmo de entidade particular, estão suprimidos.

A indenização deverá respeitar a correção monetária a partir do laudo pericial, honorários advocatícios, juros moratórios a partir do 1º de janeiro do ano seguinte em que o pagamento deveria ser feito e compensatórios a contar do esbulho à taxa de 12% ao ano, consoante Súmulas 114 e 408 do Superior Tribunal de Justiça e 618 do Supremo Tribunal Federal.

4 – DO DESVIO DE FINALIDADE

Conforme exposto, a finalidade pública (necessidade ou utilidade do bem ou interesse social) é o fundamento medular da desapropriação.

Não há que sequer cogitar em interesse privado de pessoa física ou de qualquer entidade particular, sob pena de nulidade da desapropriação.

5 – DA RETROCESSÃO

A Retrocessão nada mais é do que o retorno do bem ao expropriado em caso de desvio de finalidade, ou seja, trata-se de um meio de proteção ao direito à propriedade particular sempre que não for dada a finalidade pública para a qual foi desapropriada.

O art. 519 do Código Civil:

Art. 519. Se a coisa expropriada para fins de necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, não tiver o destino para que se desapropriou, ou não for utilizada em obras ou serviços públicos, caberá ao expropriado direito de preferência, pelo preço atual da coisa.

Sobre o tema Hely Lopes Meirelles ensina que "Retrocessão é a obrigação que se impõe ao expropriante de oferecer o bem ao expropriado, mediante a devolução do valor da indenização, quando não lhe der o destino declarado no ato expropriatório (...) A retrocessão é, pois, uma obrigação pessoal de devolver o bem ao expropriado, e não um instituto invalidatório da desapropriação, nem um direito real inerente ao bem. Daí o conseqüente entendimento de que a retrocessão só é devida ao antigo proprietário, mas não aos seus herdeiros, sucessores e cessionários". MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33ª edição atualizada. São Paulo: Editora Malheiros, 2007.

6 – DA COMPETÊNCIA

Acerca da competência para desapropriar, a desapropriação pode ser levada a efeito por quem?

De acordo com o art. do Decreto-Lei 3.365/1941, possui tal competência a União, Estados e Municípios.

Os bens dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios podem ser desapropriados pela União.

Os bens dos Município, de acordo com o § 2º do art. 2º, podem ser desapropriados pelos Estados.

Concessionárias de serviço público, encarregadas pela manutenção de estradas, bem como empresas de telefonia, gás e eletricidade, também poderão, mediante autorização expressa, lei ou contrato.

Por fim, a desapropriação, segundo Hely Lopes Meirelles, é um procedimento administrativo que se realiza em duas fases.

A primeira é declaratória e se instrumentaliza através de um decreto do Poder Executivo.

Já a segunda fase, se processa mediante ação competente, valor da indenização e a respectiva transferência do bem expropriado ao Poder Público.

Finalizo agradecendo pela leitura e fazendo uma deferência ao Professor Luiz Antônio Scavone Junior, que trata do assunto com tamanha maestria, na obra indicada abaixo.

Bibliografia

Acquaviva, Marcus Cláudio. Dicionário básico de direito Acquaviva. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1994.

Scavone Junior, Luiz Antonio, Direito imobiliário – Teoria e prática, 12ª ed. – ver., atual., e ampl. - Rio de Janeiro: Forense, 2017.

Daniel Mazzeo - Advogado, Delegado do CRECI-SP, palestrante membro do CEAP, escritor, perito judicial avaliador, especializado em Direito Imobiliário pela FGV, pós-graduado pela EPD, membro efetivo da comissão da jovem advocacia OAB/SP, advogado e consultor jurídico de empresas do segmento imobiliário.
Fonte: Artigos JusBrasil

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